Nova ata do Banco Central ameniza o tom: “redução das pressões inflacionárias”

Brasília, 01/10/2020. Presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto. Foto: Raphael Ribeiro/BCB

A nova ata do Banco Central traz esperanças de que a instituiação possa reduzir os juros na próxima reunião. Nos últimos dias, o presidente da República tem lançado críticas duras à decisão do BC de manter os juros em níveis tão elevados, prejudicando o orçamento público e dificultando a retomada do desenvolvimento.

Leia abaixo a íntegra da ata.

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Atas do Comitê de Política Monetária – Copom

252ª Reunião – 31 janeiro – 1 fevereiro, 2023
Data de publicação: 07/02/2023

A) Atualização da conjuntura econômica e do cenário do Copom (1)
1. O ambiente externo segue marcado pela perspectiva de crescimento global abaixo do potencial no próximo ano. A flexibilização da política de combate à Covid na China, um inverno mais ameno na Europa e a possibilidade de uma redução gradual no crescimento nos Estados Unidos suavizam a desaceleração econômica global esperada para os próximos trimestres em função do aperto das condições financeiras nas principais economias.

2. O ambiente inflacionário ainda segue desafiador, mas dados recentes sugerem alguma moderação na margem em diversos países. No período recente, observa-se uma normalização nas cadeias de suprimento e uma acomodação nos preços das principais commodities, levando a uma redução nas pressões inflacionárias ligadas a bens. Por outro lado, o baixo grau de ociosidade do mercado de trabalho em algumas economias, aliado a uma inflação corrente elevada e com alto grau de difusão, sugere que pressões inflacionárias no setor de serviços devem demorar a se dissipar.

3. O processo de normalização da política monetária nos países avançados prossegue na direção de taxas restritivas de forma sincronizada entre países, apertando as condições financeiras e impactando as expectativas de crescimento econômico. Após o processo de alta de juros, se delineia um período prolongado de juros elevados, o que requer maior cautela na condução das políticas econômicas também por parte de países emergentes.

4. No âmbito doméstico, o conjunto de indicadores divulgados desde a última reunião do Copom segue corroborando o cenário de desaceleração do crescimento esperado pelo Comitê. Observa-se queda nos indicadores de confiança e arrefecimento nos indicadores de produção industrial, de comércio e de serviços. O mercado de trabalho, que surpreendeu positivamente ao longo de 2022, continua mostrando sinais de desaceleração, com queda nas admissões líquidas do Novo Caged e relativa estabilidade na taxa de desemprego, proveniente de recuos na população ocupada e na força de trabalho.

5. Não obstante a desaceleração na margem, a inflação ao consumidor continua elevada. Os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária, que apresentam maior inércia inflacionária, mantêm-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação, ainda que tenham apresentado alguma moderação na margem. As expectativas de inflação para 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 5,7% e 3,9%, respectivamente.

B) Cenários e análise de riscos
6. No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de USD/BRL 5,152, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “amarela” em dezembro de 2023 e de 2024. Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 5,6% para 2023 e 3,4% para 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 10,6% para 2023 e 5,0% para 2024. O Comitê optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente. Nesse horizonte, referente ao terceiro trimestre de 2024, a projeção de inflação acumulada em doze meses situa-se em 3,6%. O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual.

7. O Comitê analisou um cenário alternativo com juros estáveis ao longo de todo o horizonte relevante. Em tal cenário, as projeções de inflação situam-se em 5,5% para 2023, 3,1% para o terceiro trimestre de 2024 e 2,8% para 2024.

8. O Comitê avaliou diferentes hipóteses, parâmetros e cenários em sua discussão sobre as projeções de inflação. Nessa discussão, alguns membros levantaram a hipótese de incorporar alguma elevação da taxa neutra de juros, em direção ao movimento observado nas expectativas para prazos mais longos extraídas da pesquisa Focus. O Comitê optou, neste momento, por manter a taxa neutra de juros em 4%, mas avaliou cenários alternativos e identificou que os impactos de uma elevação da taxa neutra sobre suas projeções crescem no tempo e passam a ser mais relevantes a partir do segundo semestre de 2024.

9. O Comitê avalia que o cenário para o crescimento global prospectivo se mostra um pouco menos desafiador como reflexo da mudança na política de combate à Covid na China e do inverno mais ameno na Europa. Alguns membros enfatizaram também que os dados de atividade e mercado de trabalho seguem relativamente resilientes nos EUA. Na China, os ajustes nas restrições sanitárias deverão suscitar recuperação cíclica da demanda e diminuir os riscos de disrupções de oferta. No entanto, o Comitê avalia que o crescimento de longo prazo da China deve seguir inferior ao observado no período pré-pandemia, refletindo tanto os ajustes no setor imobiliário quanto a piora da demografia esperada para os próximos anos. Na Europa, o inverno mais ameno também reduziu a probabilidade de cenários extremos no fornecimento energético. Nos EUA, dados de atividade têm apontado desaceleração, mas ainda em ambiente de mercado de trabalho bastante pressionado. Apesar desses desenvolvimentos de curto prazo, o Comitê segue avaliando que o compromisso e a determinação dos bancos centrais em reduzir as pressões inflacionárias e ancorar as expectativas consolidam um cenário global de aperto de condições financeiras mais prolongado, com taxas de juros ao final do ciclo de aperto mantidas por um período suficientemente longo em patamares contracionistas, mantendo elevado o risco de uma desaceleração global mais pronunciada.

10. O Comitê segue avaliando que o processo de desinflação global, especialmente no que se refere aos indicadores de inflação subjacente, é desafiador e possivelmente ocorrerá de forma mais lenta do que usualmente observado, na medida em que a inflação está disseminada no segmento de serviços. Entretanto, alguns membros enfatizaram a desaceleração nos núcleos de inflação em diversos países.

11. Os dados de atividade no Brasil seguem indicando um ritmo de crescimento mais moderado na margem e os dados de emprego sugerem uma perda de dinamismo. Alguns membros observaram que há um movimento de recomposição parcial das perdas recentes nos salários reais, mas esse movimento é esperado e vem acompanhado de desaceleração nos ganhos nominais que deve se acentuar à frente. O Comitê seguirá acompanhando as divulgações do mercado de trabalho, avaliando continuamente qual o papel da inflação defasada e das pressões no mercado de trabalho sobre os reajustes salariais. O conjunto de dados divulgados, incluindo a queda dos indicadores de confiança e a desaceleração observada nas concessões de crédito, junto com os efeitos defasados da política monetária, reforçam a expectativa do Comitê de desaceleração do ritmo da atividade econômica, que deve se acentuar nos próximos trimestres.

12. O Comitê notou com especial preocupação a deterioração das expectativas de inflação de prazos mais longos. Tal deterioração pode ter ocorrido por diversas razões, destacando-se, dentre esses fatores, uma possível percepção de leniência do Banco Central com as metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional, uma política fiscal expansionista, que pressione a demanda agregada ao longo do horizonte de projeções, ou a possibilidade de alteração das metas de inflação ora definidas.

13. No primeiro caso, o Banco Central reafirma seu compromisso em conduzir a política monetária para atingir as metas estabelecidas e avalia que, uma vez observada a desancoragem, é necessário se manter ainda mais atento na condução da política monetária para reancorar as expectativas e assim reduzir o custo futuro da desinflação.

14. No segundo caso, o Comitê pondera que estímulos de demanda devem ser avaliados considerando o estágio do ciclo econômico e o grau de ociosidade na economia, sendo a política monetária a variável de ajuste macroeconômico utilizada para mitigar os efeitos porventura inflacionários da política fiscal.

15. Por fim, com relação ao terceiro caso, o Banco Central conduz a política monetária com base nas metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional. Em resumo, mais importante do que a análise das motivações para a elevação das expectativas, o Comitê enfatiza que irá atuar para garantir que a inflação convirja para as metas.

16. O Comitê discutiu também os impactos do cenário fiscal sobre a inflação. Nessa discussão, foi novamente enfatizado que o efeito líquido da condução da política fiscal sobre a inflação é muito dependente das condições macroeconômicas e financeiras vigentes. Assim, ao analisar os múltiplos canais, incluindo o movimento nas condições financeiras advindos de juros futuros, e atualizar as hipóteses de trajetória fiscal para incorporar o orçamento sancionado para 2023, o Comitê avalia que as perspectivas para a atividade não tiveram alteração relevante. Alguns membros notaram que as medianas das projeções de déficit primário do Questionário Pré-Copom (QPC) e da pesquisa Focus para o ano de 2023 são sensivelmente menores do que o previsto no orçamento federal, possivelmente incorporando o pacote fiscal anunciado pelo Ministério da Fazenda. O Comitê manteve sua governança usual de incorporar as políticas já aprovadas em lei, mas reconhece que a execução de tal pacote atenuaria os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação.

17. O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; (ii) a ainda elevada incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais que implicam sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos; e (iii) um hiato do produto mais estreito que o utilizado atualmente pelo Comitê em seu cenário de referência, em particular no mercado de trabalho. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma queda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local; (ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (iii) a manutenção dos cortes de impostos projetados para serem revertidos em 2023.

18. A conjuntura, particularmente incerta no âmbito fiscal e com expectativas de inflação se distanciando da meta em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária. O Comitê avalia que tal conjuntura eleva o custo da desinflação necessária para atingir as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. Nesse cenário, o Copom reafirma que conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas.

C) Discussão sobre a condução da política monetária
19. O Copom passou então à discussão da condução da política monetária, considerando o conjunto de projeções analisado, assim como o balanço de riscos para a inflação prospectiva.

20. O Comitê optou por novamente dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente em suas projeções, mas antecipa que, para o próximo trimestre, o Comitê voltará a utilizar o horizonte usual, referente aos anos-calendário, uma vez que o horizonte de seis trimestres à frente coincidirá com o ano-calendário de 2024, não havendo assim mais efeito direto decorrente das mudanças tributárias no horizonte usual.

21. O Comitê iniciou seu debate avaliando se a estratégia traçada anteriormente de juros estáveis seria suficiente para a convergência da inflação para suas metas. Para tanto, analisou os principais determinantes da trajetória de inflação e como eles se comportaram no período mais recente.

22. Começando pelo hiato do produto, observou-se uma desaceleração da atividade, do crédito e, mais recentemente, do mercado de trabalho, conforme esperado pelo Comitê dadas as defasagens de política monetária. Nesse sentido, alguns membros ressaltaram que a desaceleração deve prosseguir e é necessária para que os canais de política monetária atuem e ocorra a convergência da inflação para suas metas. Notou-se, ademais, que as perspectivas de crescimento econômico não mudaram significativamente no período recente.

23. A inflação de serviços tem apresentado moderação, mas segue em nível incompatível com a meta. O foco do Comitê na inflação de serviços se deve ao fato de ela responder à inércia inflacionária e à atividade econômica de forma mais direta, e espera-se que ambos os fatores provoquem menor pressão inflacionária ao longo do horizonte. De todo modo, tal dimensão continua inspirando atenção e o Comitê segue avaliando a velocidade com que se dará o processo de convergência.

24. No balanço de riscos, as pressões inflacionárias globais se atenuaram, mas ainda há bastante incerteza sobre como se dará a desaceleração da inflação e tal processo tende a ser não linear. Os riscos devem persistir enquanto observarmos um mercado de trabalho apertado em várias economias avançadas. Do ponto de vista de riscos domésticos, no tema fiscal, há dois conjuntos de riscos que se interseccionam. Em primeiro lugar, a revisão do arcabouço fiscal diminui a visibilidade sobre as contas públicas para os próximos anos e introduz prêmios nos preços de ativos e impacta as expectativas de inflação. Em segundo lugar, no que tange aos estímulos fiscais, o Copom seguirá acompanhando seus impactos sobre atividade e inflação e reforça que, em ambiente de hiato do produto reduzido, os impactos sobre a inflação tendem a se sobrepor aos impactos almejados sobre a atividade. Alguns membros notaram que a execução do pacote apresentado pelo Ministério da Fazenda deveria atenuar o risco fiscal e que será importante acompanhar os desafios na sua implementação. Por fim, o risco de um hiato do produto mais estreito do que o avaliado persiste e o Comitê seguirá avaliando os dados e os modelos para um entendimento mais minucioso.

25. Com relação aos riscos de baixa para a inflação, os preços das commodities internacionais em moeda local se reduziram, mas o Comitê avalia que o risco de desaceleração mais acentuada da atividade econômica global permanece no horizonte, apesar do processo de reabertura da China reduzir, em algum grau, esse risco. Nesse aspecto, o Comitê seguirá acompanhando de um lado o processo de retirada de estímulos fiscais e monetários nas economias avançadas e, de outro, o processo de reabertura da China.

26. Com relação às expectativas, o Comitê observa com preocupação o movimento recente nos horizontes mais longos. Além do impacto direto que a elevação das expectativas tem sobre as projeções de inflação, o aumento das expectativas de longo prazo eleva o custo da desinflação ao exigir maior participação de outros canais da política monetária e, consequentemente, uma abertura do hiato do produto maior para se obter uma mesma queda de inflação. O Comitê seguirá atento e perseverará até que a ancoragem das expectativas se consolide.

27. As projeções do Comitê se elevaram tanto em função da elevação de preços administrados quanto de preços livres. Dentre os fatores preponderantes para a elevação das projeções, destaca-se principalmente a elevação das expectativas de inflação da pesquisa Focus. As projeções condicionais às hipóteses do cenário de referência não demonstram convergência para a meta no horizonte relevante de política monetária, mas a introdução de um aperto monetário mais prolongado, tal como em seu cenário alternativo, gera impacto relevante sobre as projeções em direção à convergência às metas.

28. O Copom optou pela manutenção da taxa de juros, reforçando a necessidade de avaliação, ao longo do tempo, dos impactos acumulados a serem observados do intenso e tempestivo ciclo de política monetária já empreendido. Assim, o Comitê avaliou que, diante dos dados divulgados, projeções e expectativas de inflação, balanço de riscos e defasagens dos efeitos da política monetária já em território significativamente contracionista, era apropriado manter a taxa de juros no patamar de 13,75% a.a. O Comitê reforçou que é necessário manter a vigilância, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por um período mais prolongado do que no cenário de referência será capaz de assegurar a convergência da inflação.

29. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que têm mostrado deterioração em prazos mais longos desde a última reunião. O Comitê enfatiza que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.

D) Decisão de política monetária
30. Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos de 2023 e, em grau maior, de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

31. O Comitê segue vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período mais prolongado do que no cenário de referência será capaz de assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que têm mostrado deterioração em prazos mais longos desde a última reunião. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.

32. Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza e Renato Dias de Brito Gomes.

Notas de rodapé

1 A menos de menção explícita em contrário, esta atualização leva em conta as mudanças ocorridas desde a reunião do Copom em dezembro (251ª reunião).

2 Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio USD/BRL observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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