A mídia liberal vem fazendo pose de horrorizada com as críticas de Lula à manutenção dos juros estratosféricos definida na última reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central.
Até o fato de Lula ter se referido ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, como “esse cidadão” é citado com ares de escândalo – talvez estejam com saudade das boas maneiras do presidente anterior…
Mas vamos ao ponto: a “independência” do Banco Central.
Independência é, segundo o Michaelis, o “estado, condição ou característica daquele que goza de autonomia ou de liberdade completa em relação a alguém ou algo”. É um estado relacional, portanto. Você não pode ser simplesmente “independente”; você só pode ser independente em relação a alguém ou algo.
Esse é um ponto importante, porque a independência do Banco Central é apresentada assim, nua e crua, como se o Banco Central agora fosse independente de tudo e todos, a plenitude da liberdade e autonomia personificada em uma entidade reguladora da economia.
Seria mais honesto se a independência do Banco Central fosse descrita assim: o Banco Central é independente em relação ao governo eleito democraticamente.
Agora, em relação a outros atores, o quão independente é o BC?
Será que Roberto Campos Neto, que fez carreira no setor bancário/financeiro, que foi nomeado por Jair Bolsonaro para o Banco Central, que foi votar no primeiro e no segundo turno das últimas eleições com a camisa da seleção brasileira de futebol, que foi flagrado pela fotógrafa Gabriela Biló, agorinha em janeiro, em um grupo de Whatsapp chamado “Ministros Bolsonaro“, será que esse cara é independente em relação ao mercado financeiro, aos bancos, ao bolsonarismo?
A resposta é óbvia, mas a mídia liberal se finge de desentendida e vem com aquele papinho de que o BC independente é “técnico”, enquanto as críticas de Lula são “políticas”. É realmente muito “técnico” manter os juros nas alturas (e a festa danada de quem ganha com isso) enquanto a economia patina.
Tem também a conversa mole de que o mercado reage mal à interferência do governo no Banco Central, o que prejudicaria a economia. Como se o mercado não usasse seu poder de manipular o câmbio e outros indicadores para pressionar o governo de acordo com seus interesses. E como se fosse um absurdo, um disparate, uma loucura total o governo eleito implementar sua política econômica.
Pois é, talvez os liberais já tenham se esquecido, mas a população elegeu o o Lula. Não é razoável que o presidente que foi, repito, eleito pela população, possa intervir sobre algo tão crucial quanto a taxa de juros do país?
A resposta é, de novo, óbvia.
Roberto Campos Neto é representante orgânico das forças políticas que foram derrotadas em outubro de 2022. É uma aberração antidemocrática que esse cidadão decida os rumos da política monetária do Brasil, entrando em choque direto com os interesses do governo que, repito mais uma vez porque parece que um pessoal ainda não entendeu, foi o escolhido pela população para dirigir o país.
Por isso, corretíssimas as críticas de Lula à autonomia do Banco Central. Retirar Roberto Campos Neto do cargo agora não será uma tarefa muito simples, já que sua exoneração precisa ser aprovada pela maioria absoluta do Senado.
Se não der agora, que se acabe com a “independência” do BC ao final do mandato desse cidadão. A política econômica não pode ser independente da vontade popular expressa nas urnas.
P.S.: Uma curiosidade. O presidente do BC é neto de Roberto Campos, que foi ministro do planejamento do ditador Castelo Branco e um dos expoentes da direita brasileira no século XX na área econômica. Haja independência.