Os feitos futebolísticos extraordinários de Edson Arantes do Nascimento serão lembrados e relembrados à exaustão hoje e nos próximos dias.
Pelé é considerado por muitos apreciadores do futebol como o melhor jogador de todos os tempos. É uma lenda.
Com surreais 17 anos ele foi o destaque do primeiro título mundial do Brasil, na Suécia, em 1958. Em 1970 comandou a Seleção no tricampeonato – o time daquele ano é considerado um dos melhores da história do futebol. A presença de Pelé em um jogo na Nigéria simplesmente parou uma guerra civil.
Pelé notabilizou-se pelo futebol altamente eficiente e criativo. Sua genialidade vem sendo contada de geração para geração há décadas. Até os gols que Pelé não fez, por um capricho da bola, viraram lenda.
A mística da camisa 10, que costuma ir para o craque do time, seja no Barcelona ou em uma pelada de várzea em algum canto remoto do Brasil, começou com Pelé, também em 1958.
A Seleção Brasileira virou uma entidade quase mítica muito por conta de Pelé. Somos o país do futebol, o maior celeiro de craques do mundo, o único time que ganhou cinco copas.
Essa supremacia gerou um fenômeno fantástico: somos o time do coração do Terceiro Mundo. O Rodrigo da Silva demonstrou este fato recentemente em um fio no Twitter. É emocionante assistir os vídeos de torcedores do Brasil espalhados por países diversos:
O Rei do Futebol é conhecido no mundo todo. É um símbolo que transcende a dimensão futebolística.
A abolição do trabalho escravo no Brasil se deu em 1888. Exatos 70 anos depois – um nada! – um menino negro que veio da pobreza conquista a Copa e sua inteligência, habilidade e criatividade chocam o mundo. Foi como um recado definitivo sobre a estupidez do racismo.
O futebol, assim como outros esportes e a arte, emula os dramas, os conflitos e as glórias da vida. Assim, só pelo que fez dentro de campo, Pelé já é um símbolo imortal da luta dos excluídos por liberdade e dignidade.
Fora de campo, Pelé tinha fama de ser alienado. Mas o Emicida, em uma fala que vale a pena ser vista, apresenta outro lado do Rei:
Pelé, enquanto Rei, disse frases como ‘Eu nunca tirei a minha cor para jogar’. Ou a poderosíssima ‘O sinônimo político hoje no Brasil é corrupto, e o negro não carrega essa marca. Então negros deveriam votar em negros’. Ninguém fala desse Pelé. Nenhum de nós viu manchete de jornal com essas frases.
Pelé é o Rei do Futebol, mas não deixa de ser humano por causa disso.
As duras críticas que recebe sobre o não reconhecimento de uma filha são justas. Mas, como coloca Emicida, a questão se insere em um problema maior, que é o fato de inúmeras crianças crescerem sem a presença dos pais no Brasil. É fruto do machismo estrutural, que responsabiliza a mulher pela criação dos filhos e dá quase um passe livre para os homens. Não se trata de passar pano para Pelé, mas de inserir o homem em seu contexto histórico.
Encerro este artigo, que é uma singela homenagem ao Rei, com mais um trecho impactante da fala de Emicida, que resume perfeitamente o tamanho de Pelé:
Se hoje eu pego um microfone e canto que é possível alcançar o topo, é porque os nossos pais contaram pra gente que era possível, depois de ver um cara preto com uma camisa 10 e um punho cerrado, lá em cima desse topo.
Viva o Rei.