Presidente em reclusão no Palácio da Alvorada. Seita golpista fechando estradas e acampando em frente a quartéis. Empresários financiando a patacoada. Leniência ou mesmo apoio da polícia aos arruaceiros.
Tudo isso para, decorridas três semanas das eleições, o PL tirar da cartola um “relatório” e pedir ao TSE que invalide uma parte das urnas utilizadas no 2º turno das eleições. A parte das urnas que seria válida, segundo o “relatório” imparcialíssimo, dá a vitória a Jair Bolsonaro.
Patético? Grotesco? Golpista? Desesperado?
Todas as anteriores.
O presidente do TSE Alexandre de Moraes despachou em questão de minutos:
Bingo. Se formos anular as urnas, que tal anularmos as que elegeram um “Congresso conservador”, como repetiu à exaustão Bolsonaro no 2º turno?
A chance de tamanha bizarrice prosperar é nula. Mas nos permite avaliar a estratégia de Bolsonaro.
A tática do ainda presidente na sua relação com as instituições é o morde e assopra. Isto ficou evidente durante o seu mandato presidencial: em um dia Bolsonaro açula a matilha, bravateia e vocifera palavrões contra o “sistema”; no outro Bolsonaro diz que foi mal compreendido, que respeita os demais poderes e que joga dentro das famigeradas quatro linhas da constituição.
(As únicas quatro linhas da Constituição que Bolsonaro considera, aliás, devem ser as do tal artigo 142. Quer dizer, nem estas, mas sim uma interpretação evidentemente picareta do artigo.)
Pois bem. Para os padrões bolsonaristas, ficar em silêncio quase total após a derrota foi quase uma deferência ao processo democrático que elegeu Lula. A autorização para que Ciro Nogueira tocasse a transição de governo foi o “assopra”.
Enquanto isso o movimento golpista, pequeno porém barulhento, continuou produzindo caos e memes. E aguardando seu líder.
Bolsonaro, o líder inconteste da extrema-direita do Brasil, não poderia se ausentar para sempre e deixar seus seguidores tomando chuva de graça. Sob risco de ver sua liderança começar a ser questionada.
Agora chegou a hora do “morde”. Mas a mordida é desdentada.
Como não há chance de o TSE “anular” algumas urnas e dar a vitória a Bolsonaro, e o entorno de Bolsonaro certamente sabe disso, o objetivo é apenas dar uma resposta para sua base radical e mantê-la mobilizada.
O maior medo de Bolsonaro neste momento é a possibilidade de ser preso – ele mesmo verbalizou esse medo algumas vezes nos últimos meses, sem ser perguntado sobre o assunto. Manter sua base de apoio atiçada faz parte da estratégia de demonstrar força para manter o Judiciário intimidado.
Por outro lado, escalar o enfrentamento com as instituições às vésperas de ficar sem cargo público pode não ser exatamente a melhor ideia.
Aguardemos as cenas dos próximos capítulos, mas o fato é que vai cehgar a hora em que a sociedade mobilizada terá que entrar nessa briga. Porque a responsabilização de Bolsonaro será crucial para decidirmos o país que queremos ser.