Assembleia Cidadã avança em São Paulo; Pernambuco e Bahia também vão ouvir população em deliberações coletivas

Imagem: Divulgação

Movimento ganha força no Brasil e no mundo. População de Francisco Morato (SP), especialistas, dirigentes públicos e legisladores analisam e propõem, neste sábado (22), medidas para gestão de lixo e outros resíduos sólidos, com impactos para saúde e meio ambiente. “A deliberação cidadã trata-se, em resumo, de colocar em prática e aprimorar o que de fato é democracia”, explica cientista política

A população de Francisco Morato, município da região metropolitana de São Paulo, está dando relevantes passos em uma tendência que vem ganhando força no Brasil e em outros países pelo mundo: as assembleias cidadãs. Moradores da cidade — a maioria, mulheres e pessoas com renda familiar até dois salários mínimos — se reúnem neste sábado (22) para analisar e propor soluções a questões como destinação do lixo doméstico e de entulhos da construção civil. As deliberações coletivas serão consolidadas em sugestões que poderão resultar em projetos de lei e/ou políticas públicas para beneficiar a população não só em relação à gestão dos resíduos sólidos como também à saúde e ao meio ambiente.

“A deliberação cidadã trata-se, em resumo, de colocar em prática e aprimorar o que de fato é democracia”, destaca a cientista política Silvia Cervellini. Ex-diretora do então instituto de pesquisa Ibope, Cervellini é cofundadora e coordenadora do Delibera Brasil, coletivo de especialistas em opinião pública parceiro da Prefeitura de Francisco Morato na realização das Assembleias Cidadãs (ACs) no município.

Como explica Cervellini, as ACs são iniciativas em que governos e tomadores de decisões convidam a população, de forma ativa, a se envolverem na construção coletiva de projetos de lei e ações de interesse social. “O objetivo é legitimar e facilitar a atuação parlamentar como também o desenvolvimento de políticas públicas realmente eficazes”, ressalta a especialista.

Sábado (22), no campus da Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp) em Francisco Morato [Rua Virgílio Martins de Oliveira, nº 824], os moradores que foram sorteados e integram o grupo de deliberações na “Assembleia Cidadã pelo Clima – Delibera Morato” vão analisar os atuais problemas enfrentados pelo município relacionados à falta de regulamentação/normas para destinação do lixo e as consequências disso para a saúde da população e o clima, por exemplo. O encontro também contará com a participação de especialistas nos temas em discussão, além de representantes da Prefeitura e da Câmara de Vereadores.

“O grupo de moradores [formado aleatoriamente, por cartas-convites e sorteio público] faz uma imersão no tema colocado à deliberação cidadã, ouve e questiona especialistas e partes interessadas e, em comum acordo, chega a recomendações que são registradas em um documento apresentado e discutido com autoridades do Executivo e/ou do Legislativo, além de ser amplamente divulgado à população do município”, explica Silvia Cervellini.

Ela observa que a seleção aleatória dos moradores garante não só transparência e diversidade nas discussões como também evita conflitos de influência e pressões partidárias. “Após um período de quatro a oito encontros, o grupo delibera coletivamente sobre as questões analisadas e elabora um relatório de recomendações cidadãs para subsidiar governantes e legisladores”, detalha a cientista política.

MOVIMENTO NACIONAL E MUNDIAL — Integrante da internacional Rede Democracy R&D (DR&D) — formada por 85 organizações de 30 países em seis continentes — o Delibera Brasil é pioneiro em realização de assembleias cidadãs no país, também conhecidas como “Minipúblicos”. Iniciativas dessa natureza foram realizadas, por exemplo, em Fortaleza (CE), com a deliberação sobre gestão de resíduos sólidos; em Ilhéus (BA), com a “Assembleia Cidadã Orla Viva”; e em parceria com as subprefeituras de São Miguel Paulista e Pirituba-Jaraguá, com a deliberação cidadã relativa ao projeto “(Re)Age SP”.

Além de Francisco Morato, as próximas cidades que desenvolverão o projeto serão Toritama (PE), com a “Assembleia Cidadã RespirARPuro”; e Salvador (BA), onde a população será convidada a debater e deliberar sobre o “Plano de Mitigação e Adaptação às Mudanças do Clima”.

Também conhecidas como Júris Cidadãos, Painéis Cidadãos ou Minipúblicos, as Assembleias Cidadãs foram modeladas a partir de uma prática inventada ainda na década de 1970. Naqueles tempos, o fim da Guerra Fria permitiu a discussão e busca explícita de mecanismos de decisão política que complementassem e aprofundassem a democracia representativa. O objetivo era tornar a democracia efetivamente mais próxima e responsiva perante cidadãs e cidadãos.

Como observa Silvia Cervellini, o “boom” das assembleias cidadãs — ou “onda deliberativa”, como elas vêm sendo chamadas pela OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico] — foi alavancado pelo exemplo emblemático da “Assembleia Cidadã sobre Aborto”, na Irlanda. Realizada em 2017, a ação ajudou aquele país a resolver um impasse político que se arrastava por décadas.

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