A expectativa para a pesquisa desta quinta-feira era grande. Os viciados em política passaram o dia tentando, inutilmente, pensar em outras coisas. A tensão tinha várias razões, boas e más.
O Datafolha é o instituto de pesquisa mais prestigiado do país. Essa pesquisa, em particular, tem mais qualidade do que outras, por ser maior, com 5.926 entrevistas realizadas entre os dias 13 a 15 de setembro. A pesquisa custou R$ 473.780,00, pagos pelos contratantes, os grupos de mídia Folha e Globo.
Essa era uma das razões boas para a ansiedade: o desejo pela verdade, independente de qual fosse.
Uma das razões más era que os bolsonaristas, após identificar o poder de influência das pesquisas sérias, começaram a fazer a única coisa em que eles são competentes: mentir.
Os bolsonaristas identificaram que pesquisas sérias, com credibilidade, ajudam a desmanchar a aura de invencível (ou imbrochável) do governo.
Exatamente por isso, eles passaram a odiar mortalmente as pesquisas. A Folha reportou que houve casos de bolsonaristas mais radicais que passaram a perseguir e agredir pesquisadores do instituto. São casos isolados, que não afetam a precisão do trabalho, mas emblemáticos.
Um dos ataques mais enfáticos no discurso de Bolsonaro, no 7 de setembro, foi direcionado exatamente contra o… Datafolha. As próprias manifestações em Brasília e Rio de Janeiro visaram produzir imagens que servissem de contraponto às pesquisas.
Outra razão da ansiedade é que o bolsonarismo e seus veículos, numa estratégia de ataque psicológico, começaram a veicular pesquisas de qualidade extremamente duvidosa, com números inteiramente diferentes daqueles apresentados nas pesquisas mais tradicionais, especialmente as que realizam entrevistas presenciais.
Outro foco de tensão foi a última pesquisa Quaest, com entrevistas realizadas entre os dias 10 a 13 de setembro, na qual Lula perde dois pontos. Apesar do petista ainda se manter na liderança, com 42%, viu sua vantagem sobre Bolsonaro diminuir para 8 pontos, a menor da série histórica.
Pra estragar de vez o humor da oposição a Bolsonaro, foram publicadas duas pesquisas entre eleitores de Rio de Janeiro, que mostraram avanço da direita tanto na disputa pela presidência da república quanto para o Palácio Guanabara.
Haveria uma onda bolsonarista se levantando?
Aqui no Cafezinho, a gente procurou explicar aos leitores que não. Nenhuma pesquisa mostrava onda bolsonarista. Mas é difícil combater a ansiedade do eleitor quando ele se depara com alguma pesquisa eleitoral com dados negativos para seus candidatos.
Alguns ciristas se aproveitaram também do clima de ansiedade para pescar em águas turvas, e alimentaram teses delirantes de que as pesquisas mais favoráveis a Lula estavam erradas, e que já se podia identificar uma recuperação de Bolsonaro. Com isso, eles tentavam dissolver qualquer esperança de vitória em primeiro turno, esperança essa que alimenta o que eles mais temem: o voto útil. A campanha de Ciro Gomes passou a usar o seu escasso tempo de TV para divulgar vídeos que atacam violentamente a ideia do voto útil. O próprio Ciro, bem a seu estilo, passou a qualificar a campanha pelo voto útil como “fascismo de esquerda” do PT. Um dos gurus do cirismo foi mais longe e cunhou um novo termo: nazipetismo. Pedir voto útil, para a ala mais raivosa do cirismo, virou sinônimo de nazismo. Ciro Gomes cansou de pedir voto útil para ele mesmo em 2018, mas beleza. Cada um usa as armas que tem.
Por fim, os números foram divulgados, e vieram melhores do que muita gente esperava. Foi uma chuva de notícia boa.
A música que veio imediatamente ao meu espírito foi Anunciação, de Alceu Valença, cujos versos falam numa “bruma leve das paixões que vem de dentro”, e tem um refrão sugestivo para o momento: “Tu vens, tu vens, Eu já escuto os teus sinais”.
Lula havia mantido seus 45% na estimulada, e crescido dois pontos na espontânea e um ponto no segundo turno!
Bolsonaro, por sua vez, caiu em toda parte.
Até mesmo no Centro-Oeste, que todos imaginavam como uma terra de malboro, inteiramente dominada por reacionários do agronegócio!
Pois bem, na região Centro-Oeste, Bolsonaro perdeu 7 pontos, caindo de 47% para 40%, enquanto Lula avançou 8 pontos e chegou a 38%. Empate técnico. Ciro e Simone estão empatados em 7%, o que é quase um universo paralelo, tamanha a distância.
Os números do Datafolha dissolveram em ácido mortal, em segundos, todas as teses delirantes do bolsonarismo, do cirismo e da esquerda íbis.
Lula cresceu em São Paulo, no Rio de Janeiro, e manteve a liderança isolada em Minas Gerais.
Seus candidatos também apresentaram números excelentes. Haddad se mantém muito forte em São Paulo, liderando no primeiro e no segundo turnos.
No Rio, o Datafolha simplesmente ressuscitou a campanha de Freixo, que tinha afundado muitos militantes numa profunda depressão derrotista, após a pesquisa Ipec. O Datafolha reposiciona Freixo no jogo. Castro parou de crescer, na verdade até oscila um ponto para baixo, enquanto Freixo avança 1 ponto, chegando a 27% e encostando nos 31% de Castro. Empate técnico.
O melhor para Freixo, todavia, é seu forte crescimento de 4 pontos na simulação de segundo turno, atingindo 41% das intenções de voto e igualmente empatando com os 43% de Castro (que oscilou 1 ponto para baixo).
Jogo aberto!
Além disso, Lula subiu dois pontos no Rio e ampliou sua vantagem sobre Bolsonaro, para 8 pontos: 44% X 36%!
Essas notícias foram recebidas, naturalmente, com euforia pela campanha de Lula e Marcelo Freixo no Rio de Janeiro.
O mesmo não se pode dizer de ciristas e nevistas. Ciro emagreceu dois pontos no Rio, e muito provavelmente foram os mesmos eleitores que alimentaram o crescimento de Lula, sinalizando o início do processo de voto útil no estado. Hoje Ciro tem 6% no Rio, muito atrás dos quase 20% de votos válidos que obteve no estado no primeiro turno das eleições de 2018.
Rodrigo Neves não caiu, mas continua num terceiro lugar tão distante que está praticamente fora do jogo. Neves usa suas redes sociais para emplacar a narrativa de que a eleição está indefinida, porque ainda há um percentual grande de indecisos na espontânea. Não cola muito. Indecisão na espontânea é sempre muito alta, sobretudo em eleições para governador. A baixíssima indecisão nas eleições presidenciais deste ano é excepcional, em virtude de termos dois candidatos tão conhecidos disputando. O problema de Neves, além disso, é que ele só tem votos na Baixada, provavelmente concentrados em Niteroi e São Gonçalo, onde é mais conhecido. Ele não tem votos nem no Rio e nem no interior.
A entrada de Eduardo Paes em sua campanha não fez nenhum efeito, inclusive porque Paes talvez nunca tenha realmente se empenhado muito. Desde o início dessa aliança entre PSD e PDT no Rio, os analistas mais experientes viram uma tentativa de Paes de tumultuar a campanha de Freixo, para evitar o surgimento de uma liderança que, de fato, pode atrapalhar os planos futuros do prefeito, especialmente para 2026, quando Paes certamente tentará novamente chegar ao Palácio Guanabara.
A propósito, um fato curioso, e que mostra o isolamento constrangedor de Ciro Gomes. Apesar de apoiar o candidato do PDT no Rio, o prefeito Eduardo Paes está apoiando Lula de maneira cada vez mais ostensiva. O grupo político de Paes, inclusive, está organizando um evento para Lula na quadra da Portela, em Madureira, para o dia 25 de setembro, num domingo.
Na disputa pelo Senado, o Datafolha não traz boas notícias para o campo progressista. Molon e Ceciliano continuam muito distantes de uma pontuação que realmente ameace a liderança de Romário. Cabo Daciolo, por sua vez, que os ciristas passaram a olhar como um novo messias do trabalhismo, também parece muito longe de apresentar qualquer competitividade real nessa disputa.
Em São Paulo, Haddad se mantém na liderança isolada, mas um dado novo trouxe um pouco de apreensão à sua campanha. Enquanto ele parece vencer Tarcísio com tranquilidade num eventual segundo turno, a simulação com Rodrigo Garcia mostra um embate mais apertado, com o petista ganhando por 47% a 41%.
Marcio França, do PSB, ainda mantém uma liderança confortável, na disputa por uma vaga de senador por São Paulo, com 32%, dois pontos a mais que na pesquisa anterior. O único concorrente com números competitivos é o Astronauta Marcos Pontes, do PL, que tem 15%. Janaína Paschoal começou a derreter, e passou de 7% para 4%. Aldo Rebelo (PDT), candidato de Ciro, estagnou em 4%.
Lula avançou 3 pontos em São Paulo, e chegou a 43%, enquanto Bolsonaro oscilou dois pontos para baixo, e agora tem 33%. Ciro e Tebet ficaram parados em 9% e 7%, respectivamente.
Em Minas Gerais, Lula caiu quatro pontos, mas manteve uma vantagem de 10 pontos sobre Bolsonaro: 43% X 33%.
Kalil avançou três pontos, mas ainda está muito distantes dos 53% de Zema.
Voltando à pesquisa nacional, os dados estratificados trazem novidades interessantes. Lula ainda mantém hegemonia impressionante entre os eleitores de baixa renda, que ganham até 2 salários, que correspondem, segundo o Datafolha, a 51% dos cidadãos aptos a votar.
Mas Lula começou também a crescer expressivamente em setores de classe média, empatando com Bolsonaro. Entre eleitores com renda de 2 a 5 salários, que correspondem a 33% do eleitorado, Lula avançou 3 pontos, chegou a 40%, e ultrapassou Bolsonaro, que baixou 2 pontos, para 39%.
O estrato com renda familiar de 5 a 10 salários corresponde a apenas 8% do eleitorado, segundo o Datafolha, que tem pesquisas próprias. Bolsonaro também caiu nesse segmento, e muito, de 49% para 40%, ao passo que Lula oscilou um ponto para cima, e chegou a 35%.
O Datafolha traz ao menos um dado que sinaliza o início de um processo de voto útil. Entre eleitores com renda superior a 10 salários, que representam apenas 3% do eleitorado, onde Ciro Gomes tinha uma boa performance, ele caiu pesadamente, de 10% para 5% na pesquisa espontânea, ficando atrás de Simone Tebet, que avançou 7 pontos nesse estrato, para 11%. O voto útil, porém, aparece na possível transferência de votos para Lula, que cresceu os mesmos 5 pontos perdidos por Ciro, e chegou a 33%.
Outro dado que chama atenção é a consolidação de Lula entre jovens eleitores com idade entre 16 e 24 anos. O petista avançou 4 pontos sobre a última pesquisa e hoje tem 50% desses votos na estimulada, 22 pontos à frente dos 28% ede Bolsonaro, 40 pontos distante dos 10% de Ciro Gomes.
Na simulação de segundo turno do Datafolha, e ainda olhando para esses jovens até 24 anos, Lula chega em 62% dos votos totais, 30 pontos à frente dos 32% de Bolsonaro.
Lula hoje é o candidato mais forte do Sudeste, região que abriga cerca de 42% dos eleitores brasileiros. Num eventual segundo turno, o petista teria 51% dos votos totais no Sudeste, contra 39% de Bolsonaro.
O Datafolha também trouxe dados de rejeição, que igualmente foram promissores para Lula. O petista viu sua rejeição cair um ponto, para 38%, ao passo que a de Bolsonaro subiu dois pontos, para 53%. A principal estratégia de Bolsonaro, para vencer as eleições, consiste em elevar a rejeição de Lula. Não está conseguindo. O que tem acontecido é o contrário. A rejeição de Bolsonaro na classe média, que é um setor do eleitorado onde taxas altas de rejeição podem oferecer perigo para as campanhas, tem disparado brutalmente.
A rejeição de Bolsonaro entre eleitores com renda familiar acima de 10 salários, por exemplo, subiu 10 pontos e empatou com a de Lula, em 54%.
Entre os mais pobres, maioria da população, a rejeição de Lula é baixa, de apenas 29%, contra 57% para Bolsonaro!
A íntegra da pesquisa Datafolha pode ser visualizada aqui.
Nova pesquisa CNT/MDA
Nesta sexta-feira pela manhã, recebemos mais uma pesquisa, e uma boa, da CNT/MDA, presencial, com 2002 entrevistas realizadas entre os dias 12 a 14 de setembro, e custo de R$ 168.000,00, pagos pela Confederação Nacional do Transporte.
Deixo apenas os números principais e encerro por aqui, para não fazer um post interminável. Segundo a CNT/MDA, Lula e Bolsonaro subiram um ponto e hote tem 43% e 35%, respectivamente. Ciro e Tebet estão empatados, com 5,6% e 4,7%.
A íntegra da CNT/MDA pode ser baixada aqui.
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