Por Gilberto Maringoni
Juro que não consigo entender a carga pesada que alguns ativistas de esquerda – gente de valor – fazem contra a chapa Lula-Alckmin. Os resultados desastrosos do primeiro turno francês batem na nossa cara, depois dos quatro candidatos progressistas sequer terem se sentado para traçar uma tática comum, que poderia ter levado Jean-Luc Melénchon à segunda volta.
Tenho duas impressões sobre a tentativa de torpedear a chapa progressista brasileira, que unifica vários partidos.
A PRIMEIRA é a sensação que os que a atacam são insensíveis não apenas a fascitização do governo Bolsonaro e seus apoiadores, mas à gosma social que o sustenta.
Os últimos sete anos, com três governos que investiram pesado na desconstrução de regras e parâmetros públicos de convivência, geraram monstros sociais incontroláveis.
As Forças Armadas viraram um lumpesinato fardado, as polícias estão incontroláveis, diversos bandos milicianos fortemente armadas estão prontos para botar fogo no circo nos próximos meses, entre outras coisas.
Diante disso, os detratores da chapa Lula-Alckmin atuam como se estivéssemos na Suíça, com as condições normais de temperatura e pressão garantidas até outubro;
A SEGUNDA IMPRESSÃO vem de um purismo infantilóde que descortina oportunismo cru. Alguém acha, siceramente, que Alckmin tem posições mais neoliberais do que Antonio Palocci e Henrique Meirelles – que elevaram a selic a 26,5% em 2003 e o superávit primário para 4,8% do PIB em 2005 (índice sequer tentado nos anos FHC)?
Ou que a fé mercadista do governador suplanta a de Dilma Rousseff, que dobrou o desemprego em 15 meses e chegou a dizer – ao jornal belga Le Soir, em junho de 2015 – que não havia outro caminho a não ser o alucinado ajuste fiscal que arrebentou nossa economia?
Alckmin seria mais conservador que José Eduardo Cardozo, que ofereceu ao ex-governador a Força Nacional para reprimir os protestos de 2013? Seria um direitista mais extremado que Dias Tóffoli, Luís Fux, Luís Roberto Barroso, Edson Facchin e outros juristas de confiança do PT?
Pela composição de forças, a chapa Lula-Alckmin não parece ser nem melhor e nem pior do que as administrações do período 2003-16. Assim como aqueles governos, a chapa não tem em seu horizonte qualquer perspectiva de transformação social.
Ocorre que a política gira e a Luzitana roda. Hoje, mesmo um governo mediano e tímido é preferível à barbárie em curso. As oposições de esquerda ao longo dos 13 anos petistas foram incapazes de gerar um programa de desenvolvimento factível e realista. Não adianta brigar pelas aparências agora.
Assim, repito: investir contra a chapa Lula-Alckmin não apenas atrapalha, mas objetivamente sabota a única tentativa viável de nos tirar do abismo e de recolocar o Brasil no rumo da democracia.