Por Elias Jabbour
No chamado “ocidente” existe uma falsa verdade sobre a última região do mundo a abolir a escravidão. Em tese, o Brasil foi o último país a permitir em suas fronteiras o trabalho escravo. Foram cerca de 400 anos de escravidão até sua abolição em 1889. Mas pouco, ou quase nada, se discute abertamente sobre o regime de produção e trabalho que existiu no Tibet até o ano de 1959. O dia 28 de março é o “Dia da Emancipação Servil”, um dia que celebra a emancipação de cerca de três milhões de pessoas de todos os grupos étnicos na Região Autônoma do Tibete da China. Neste dia de 1959, foi realizada uma reforma democrática, sob a liderança do Partido Comunista da China.
Se formos observar os fatos, concluiremos com muita tranquilidade que no final do mês de março deverá ser lembrado que o Tibet foi o último lugar do mundo a abolir a escravidão. Era o ano de 1951 e não deve restar dúvidas sobre a natureza cruel e desumana das condições de vida de cerca de 95% dos tibetanos que viviam sob uma verdadeira teocracia escravista onde a vida dos escravos era tão infernal quanto nas colônias inglesas na África e na Índia. Seu sistema penal era tão rigoroso que previa amputação de membros do corpo como forma de punição ante qualquer ato de desobediência.
Por exemplo, Robert W. Ford, passou cinco anos no Tibete, de 1945 a 1950, em seu livro “Wind Between the Worlds: Captured in Tibet”, ele escreve:
“Por todo o Tibete eu tinha visto homens que haviam sido privados de um braço ou uma perna por roubo (…) Amputações penais eram feitas sem antissépticos ou curativos estéreis”.
O regime político que imperou até 1951 não tolerava nenhuma forma de democracia, liberdade ou direitos humanos. Não resta dúvidas de que a escravidão no Tibet foi um dos sistemas mais sombrios da história da humanidade, e que durou muitos séculos a mais do que os mais de 400 anos de escravidão negra nos EUA e no Brasil. As condições tibetanas também eram mais degradantes e desumanizadoras do que a Europa medieval em suas piores épocas. Não são poucas as imagens disponíveis demonstrando homens e mulheres com pernas ou braços amputados.
Não são poucas as semelhanças com, por exemplo, a Europa medieval. No Tibet, aristocratas e monges que totalizavam menos de 5% dos tibetanos, possuía mais de 95% dos meios de produção da região desde terras agrícolas até as pastagens e florestas. Praticamente inexistia o comércio: todas as colheitas de alimentos pertenciam aos aristocratas e monges. Aos escravos permitia-se somente uma quantidade mínima, voltada à subsistência.
Concordamos com Karl Marx. A ele a servidão foi um dos principais sistemas de escravidão da história humana e a representação essencial do sistema de exploração sob a égide da aristoracia. Karl Marx apontou ainda que “liberdade em qualquer forma é trazer de volta às pessoas a relação entre seu mundo e elas mesmas”. Quem trouxe essa liberdade ao povo tibetano foi o socialismo. Eis um fato incontestável.
São também incontestáveis os dados positivos da fim da servidão no Tibet: Em 1959 o PIB da Região Autônoma do Tibet era de 189 milhões de yuanes, alcançando em 2020 190 bilhões de yuans. Desde 2013 é uma das três províncias com maior desempenho econômico. Em 2020 seu crescimento econômico foi de 7,3% (3). Este desempenho econômico é traduzido em ampla melhoria das condições de vida do povo tibetano. Em 1951 95% da população tibetana era analfabeta. Em 2015, 99% da população entre 15 e 60 anos de idade estava alfabetizada (3). Impulsionada pela construção de linhas de transporte como a ferrovia Qinghai-Lhasa e uma ampla estrutura de estradas, a estrutura econômica da região tem sido transformada rapidamente. Em 1959, a agricultura respondia por cerca de 70% da atividade econômica caindo para apenas 7% em 2020 (1).
A expectativa de vida de um cidadão tibetano em 1951 era de 35,5 anos. Em 2019 alcançou 71,1 anos (5). A taxa de mortalidade materna no Tibet diminuiu de de 5.000 por cada 100.000 nascimentos em 1951 para 108,86 por cada 100.000 nascimentos, e a taxa de mortalidade infantil diminuiu de 43 por cento para 1,68 por cento (2).
O dia 28 de março é uma data para se comemorar. Mas não somente isso. Que os países que fomentam a discórdia na China e que buscam tirar o Tibet do controle chinês tenham coragem de vir à público e dizerem não sobre “direitos humanos” e sim sobre o que eles realmente querem: a volta de uma teocracia escravista no mundo em pleno século XXI.
(1) CGTN. Tibet’s 70 years of achievements in numbers. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Kj1EuEWzyXs
(2) Idem.
Elias Jabbour, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Artigo produzido em colaboração com o Grupo de Mídia da China
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