O amor, em política, tem suas regras próprias.
Uma delas é a necessidade. Quando dois políticos precisam, desesperadamente, um do outro, cria-se um ambiente favorável para um romance.
É o caso de Alexandre Kalil, prefeito de Belo Horizonte, pré-candidato ao governo de Minas, e Lula.
A conclusão mais explícita que se pode tirar da pesquisa Quaest divulgada na sexta-feira passada, entre eleitores de Minas Gerais, é que Kalil precisará de Lula para derrotar o atual governador Romeu Zema.
Vamos ao gráfico mais emblemático da pesquisa: sem apoio de Lula, o atual prefeito de BH, quadro do PSD, tem 33% das intenções de voto, contra 49% de Romeu Zema.
Entretanto, quando o apoio de Lula é explicitado para o entrevistado, dá-se uma reviravolta sensacional nos números: Kalil salta para 49% e Zema desaba para 35%.
Um outro gráfico reforça a percepção de que Kalil precisará, e muito, do apoio de Lula em sua campanha: o prefeito lidera na capital e na região metropolitana, mas toma uma surra no interior.
Minas Gerais é um estado que mistura várias regiões distintas: ao norte, na região do cerrado, perto da fronteira com Goiás, tem uma área mais ligada ao centro-oeste, com uma economia hegemonizada por um agronegócio empresarial, baseado na grande propriedade; no sul, temos uma região mais próxima do Sul, com predomínio de pequenas propriedades, turismo e indústrias; no norte e no leste, Minas Gerais é mais parecida com as áreas mais pobres do Nordeste; no centro, ao redor de Belo Horizonte, temos uma grande região metropolitana, com uma cultura altamente cosmopolita.
A pesquisa deixa claro que o problema de Kalil é no interior, onde estão as cidades com renda per capita mais baixa, menos desenvolvidas, onde há maioria de um eleitor cujo perfil de renda, segundo observado em inúmeras diversas pesquisas, tende a votar em Lula.
A pesquisa traz diversas perguntas sobre a influência da eleição presidencial na campanha para o governo. Todas elas apontam uma forte influência positiva de Lula. Um dos gráficos diz que 40% dos entrevistados responderam que preferem que vença um candidato “mais ligado a Lula”, ao passo que apenas 21% afirmaram que preferem um candidato “mais ligado a Bolsonaro”.
Mesmo sem considerar nenhum apoio, a situação de Kalil não é ruim. Ele tem um lugar garantido no segundo turno, por exemplo, visto que, além dele, nenhum outro candidato tem números que possam fazer cócegas em Romeu Zema.
No cenário expandido, com mais candidatos, Zema tem 34%, contra 21% de Kalil. Num terceiro lugar distante, temos André Janones, com 7%, Cleitinho Azevedo, com 6%, e Carlos Viana, com 5%.
Na segmentação por renda, confirma-se nossa análise, de que o ponto mais vulnerável de Kalil é o eleitorado de baixa renda, que aparentemente ainda não se ligou na campanha para o governo do estado.
A análise por grau de instrução repete a mesma dinâmica da renda: Kalil vai melhor entre eleitores mais instruídos, entre os quais chega a 26%, mas tem apenas 18% entre aqueles com até o ensino fundamental.
A pesquisa Quaest junto aos eleitores de Minas Gerais também apurou a sua identificação partidária, e nota-se situação parecida com a que se viu em São Paulo: o Partido dos Trabalhadores (PT) emerge como única força política organizada com penetração expressiva, no caso de 19%. Nenhum outro partido pontua individualemnte mais de 1%. Somando todos, não temos 5%. A rejeição ao PT em Minas Gerais, por sua vez, é de 19%, menor que os 25% de rejeição que vimos em São Paulo.
A pesquisa traz alguns cruzamentos interessantes. Por exemplo, entre eleitores que votam em Bolsonaro, 49% indicaram preferência por Zema, 13% por Kalil e 14% por Cleitinho Azevedo. Já entre eleitores do Lula, 30% indicaram voto em Zema e 27% em Kalil.
O grupo majoritário entre eleitores do Ciro, ou 39%, votam em Zema, contra 27% que preferem Kalil, o que é um complicador para o pedetista, pois se ele demonstrar apoio explícito a Kalil, pode perder os poucos eleitores que tem em Minas Gerais. Na presidencial que analisaremos em detalhe mais abaixo, Ciro tem apenas 5% no estado.
Vamos à pesquisa presidencial em Minas Gerais. Nela, vemos a liderança isolada do ex-presidente Lula, com 46% no cenário 1, com Sergio Moro, e 49%, no cenário 2, sem Moro. Esse crescimento na ausência de Moro indica que Lula recebe naturalmente eleitores de todos os espectros, à esquerda e a direita.
Bolsonaro, por sua vez, tem menos do que a metade dos eleitores mineiros de Bolsonaro, 21% num cenário e 23% em outro.
Na espontânea, Lula tem 27% das intenções de votos em Minas Gerais, contra 16% de Bolsonaro e 1% de Ciro Gomes.
Esses 1% de Ciro Gomes em Minas Gerais prejudica muito a articulação de uma aliança mais robusta entre Kalil e o candidato do PDT, sobretudo a partir do momento em que Ciro se afirma como uma espécie de “anti-Lula” de esquerda. Isso faz com que Ciro – por ser de esquerda – não agregue votos do eleitorado conservador, e – por ser anti-Lula – tenha dificuldade em construir uma campanha à esquerda.
Ainda segundo a mesma pesquisa, 68% dos eleitores mineiros acham que Bolsonaro “não merece ser reeleito”.
Conclusão
A pesquisa Quaest entre eleitores de Minas Gerais, de um lado uma fortíssima rejeição a Bolsonaro, de outro uma liderança impressionante de Lula, mostra um cenário propício à nacionalização da campanha ao governo do estado. Deveremos ver, nas próximas semanas, a intensificação das conversas entre Lula e Kalil, para ajustar uma estratégia comum. O alinhamento de Zema a Bolsonaro, e a identificação do campo progressista mineiro com Kalil, já pavimentaram o caminho de um acordo entre os dois. Se o problema da indicação ao Senado, aparentemente o maior entrave aqui para uma aliança imediata entre Lula e Alckmin, for solucionado sem traumas, teremos a formação de um palanque extremamente forte em Minas Gerais, com chances reais de ganhar o governo do estado e dar uma boa votação a Lula na disputa presidencial.
A íntegra da pesquisa pode ser baixada aqui.