Um exercício de livre-pensar sobre a China com Elias Jabbour, Dilma Rousseff e Sílvio Almeida

Rede Brasil Atual – Foi durante um intenso exercício de livre-pensar – tão raro e temido nos tempos atuais – que o brasileiro Elias Jabbour e o italiano Alberto Gabriele conceberam um desafio à altura de suas ambições intelectuais: analisar e compreender a complexidade da China para além dos preconceitos ideológicos.

Tarefa inglória se levarmos em consideração a exorbitância de lugares-comuns, simplificações, leviandades e mistificações tão presentes na produção nacional sobre o que vem do estrangeiro, e em especial do Oriente.

Em relação aos chineses, especificamente, os ditos especialistas revezam há décadas o bastão da previsão mais furada da geopolítica contemporânea: ‘é agora que a China quebra!’. Com o descompromisso de quem sabe que não será cobrado.

De certo modo, isso se explica em parte pela incompreensão dos estudiosos ocidentais quanto ao que Jabbour enxerga como uma revolução copernicana em andamento na China. Outra parte poderia ser explicada pela ausência de bases de comparação e referências teóricas que auxiliem na compreensão do fenômeno. Até agora.

Varando a madrugada

Imagem: Divulgação

Entre setembro e dezembro de 2019, o obstinado Jabbour e o expansivo Gabriele vararam as madrugadas romanas debruçados sobre a experiência chinesa para lançar luz sobre a nova realidade que se impõe ao mundo sem que a maioria esmagadora dos pensadores ocidentais contemporâneos – à esquerda e à direita – se disponha a observá-la a partir de qualquer perspectiva que escape aos dogmas.

O árduo trabalho dessa improvável dupla transatlântica, de gerações e origens tão distintas, resultou em China – o socialismo do século XXI, que acaba de ser lançado pela Boitempo Editorial.

Na primeira quinzena de novembro, Jabbour cedeu duas horas de uma tarde de sexta-feira para uma conversa durante a qual soltou o verbo e abriu o coração sobre o tema que domina sua produção acadêmica já há um quarto de século: a China, sua complexidade, seus desafios e suas contradições.

Capitalismo de Estado, um pleonasmo

Géografo de formação, o autor cai na risada ao abordar um falso dilema: viveria a China sob um socialismo de mercado ou um capitalismo de Estado? “Isso é um pleonasmo. Não existe capitalismo fora do Estado”, descarta Jabbour antes de se debruçar sobre o que considera ser a comprovação do surgimento de uma nova classe de formações econômico-sociais, diferente de qualquer outra experiência, derivada de uma reinvenção do socialismo chinês a partir das instituições de mercado.

Herdeiro direto da obra do economista Ignacio Rangel e um dos mais prolíficos estudiosos da China, Jabbour vê o país asiático e suas instituições rompendo as fronteiras do que se conhecia até então sobre a planificação econômica e a racionalização de um projeto de desenvolvimento para colocar em andamento o que denomina como “a nova economia do projetamento”.

“O socialismo na China ainda está em uma fase embrionária, é um grão de areia na história, mas já traz consigo a transformação da razão em instrumento de governo, elevando o domínio humano sobre a natureza e possibilitando a execução e a elaboração de milhares de projetos ao mesmo tempo, o que seria impossível sob outra formação social”, define Jabbour.

E a formação econômico-social não é o único conceito fundamental do marxismo desafiado por Jabbour e Gabriele. Eles também colocam em xeque as interpretações convencionais sobre modo de produção e lei do valor a partir de uma análise minuciosa dos acontecimentos ocorridos na China desde a Revolução Comunista liderada por Mao Tsé-tung, em 1949, passando pelas reformas implementadas por Deng Xiaoping até chegar ao salto social e tecnológico dos anos Xi Jinping.

China já está sob ataque

Seja como for, não é que o projeto chinês vá ser contestado no futuro. “Já há uma guerra em andamento contra a China”, afirma, referindo-se às sanções estadunidenses. Para Jabbour, trata-se de uma guerra colonial imposta pelo Ocidente, com os EUA à frente, com a intenção de colocar a China de joelhos.

Ainda segundo ele, tanto a direita quanto a esquerda empreendem uma guerra semiótica contra Pequim. A dúvida é se os chineses conseguirão contornar potenciais desdobramentos militares dessas investidas para dar continuidade a seu projeto de desenvolvimento.

Aos mais ortodoxos, o que pode vir a soar como “declaração de guerra” é o exercício de livre-pensamento de Jabbour e Gabriele. Seja como for, os autores de China – o socialismo do século XXI baseiam-se na ciência para propor um novo olhar para a ascensão do gigante asiático. A quem se dispuser a abandonar abordagens dogmáticas ou até mesmo místicas para explorar a nova fronteira do debate sobre a China, o convite está posto.

Assista o lançamento na íntegra!

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