Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) é o tipo de mudança legislativa mais difícil de se levar adiante, por exigir quase dois terços dos 513 parlamentares da Casa. Ou seja, precisa de um mínimo de 308 votos para ser aprovada.
Ontem, a PEC dos Precatórios recebeu 312 votos. Foi aprovada. Se repetir a performance na votação em segundo turno, na semana que vem, irá ao Senado, para ser votada e sancionada.
Com isso, o governo não precisará pagar dívidas bilionárias e Bolsonaro terá algumas dezenas de bilhões de reais livres para construir a sua campanha presidencial em 2022.
A PEC mostrou a força de persuasão de Arthur Lira, presidente da Câmara, e do próprio Jair Bolsonaro. É mais um indicativo de que o impeachment se esfuma cada vez mais no horizonte.
Tudo isso, naturalmente, afeta o debate político sobre as eleições de 2022 e as estratégias da oposição. As mobilizações de rua tenderão a dar foco mais no certo, ou seja, na campanha eleitoral, do que no duvidoso, que é um impeachment com remota chance de ser aprovado.
O foco na campanha eleitoral desmonta, naturalmente, a movimentação em torno de uma “frente ampla”, que passa a ser vista como fictícia, ou mesmo apenas palanque para partidos menores ou com problemas de imagem limparem a sua reputação por terem apoiado Bolsonaro em 2018.
O eleitor está agora, mais que nunca, julgando o comportamento da oposição de olho em 2022.
Essa é a explicação para o impacto profundamente negativo que a orientação do PDT, em favor da PEC, produziu na opinião pública, especialmente a progressista, que está num processo de ampliação em virtude da rejeição crescente ao governo.
Segundo o registro da Câmara, 15 deputados do PDT votaram em favor da PEC, ou 62% da bancada.
Relação dos votos dos parlamentares do PDT na PEC dos Precatórios
O impacto foi tão negativo que o candidato do PDT, Ciro Gomes, decidiu radicalizar e “suspender” sua candidatura em protesto contra seu próprio partido.
A mim só me resta um caminho: deixar a minha pré-candidatura em suspenso até que a bancada do meu partido reavalie sua posição.
— Ciro Gomes (@cirogomes) November 4, 2021
Temos um instrumento definitivo nas mãos, que é a votação em segundo turno, para reverter a decisão e voltarmos ao rumo certo.
A narrativa da militância cirista é de que Ciro Gomes demonstrou coerência e coragem ao tomar essa atitude. Mas o que se exige principalmente de um político não é apenas coerência (isso é obrigação) e sim capacidade política de articular apoios em prol de um projeto. É decepcionante, para todos, mesmo para aqueles que não apoiam Ciro, que ele demonstre tanta inépcia na condução política de seu próprio partido.
O PSB também sofreu defecções, mas foi de uma minoria (10 deputados, 31% da bancada), e, o mais importante, o partido orientou contra. O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, e a conta oficial do partido, criticaram publicamente os deputados que votaram alinhados ao governo.
Já o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, evitou fazer qualquer crítica a bancada, e veio a público anunciar que está entrando, juntamente com Ciro Gomes e o deputado Paulo Ramos, com uma representação no STF contra a PEC 23. A iniciativa é, obviamente, apenas uma tentativa desesperada de jogar para a galera, pois o serviço de casa, que era convencer os deputados a votar contra a PEC, não foi feito. Apelar para a justiça para reverter uma PEC que foi apoiada pelos parlamantares do próprio partido, é a caricatura suprema da judicialização da política.
Ciro espera que o seu ultimato faça com que os deputados trabalhistas mudem o seu voto no segundo turno da votação.
Entretanto, ultimatos não são a melhor estratégia em política, porque deixam um gosto amargo na boca da militância e geram insegurança em seus aliados. Como um partido ou movimento se aliará a Ciro Gomes se ele está disposto a renunciar a sua candidatura sempre que houver um problema?
O fato é particularmente desgastante para Ciro por acontecer dias após o candidato fazer o lançamento de uma ambiciosa pré-campanha, com slogan (“prefiro Ciro”), jingle e ações da militância em várias capitais.
Independente do resultado, ou seja, com recuo ou não dos deputados do PDT, Ciro sai menor desse processo: demonstrou baixa capacidade de articulação política, influência zero sobre a bancada, e a sua legenda se mostrou extremamente desorganizada.
Vale lembrar que, na votação da PEC 5, que ampliava discretamente a vigilância externa sobre o MPF, o PDT orientou sim e boa parte dos parlamentares votaram não, o que já sinalizava um perigoso nível de desorientação.
O PT, por outro lado, sai fortalecido. Sua bancada votou integralmente contra a PEC dos Precatórios. Os poucos ausentes estavam fora do Brasil.
Um outro ponto interessante é que alguns partidos com forte vocação governista, como Novo e MDB, orientaram contra a PEC, num sinal de descolamento que pode ser interessante à oposição, não tanto em relação ao Novo, de onde não se espera qualquer aliança contra Jair, mas sobretudo em relação ao MDB, onde Lula pode encontrar apoios úteis à sua candidatura.
Marco Vitis
04/11/2021 - 22h06
Parabéns Ciro Gomes. Dignidade e Coerência NÃO são atributos comuns entre políticos. São tão raros políticos com essa estatura moral que os acostumados com as negociatas e hipocrisias até o criticam porque acham errada sua postura. Há até os infames que dizem que Ciro está procurando uma desculpa para não ser candidato. Para os que se acostumaram com as falcatruas, mentiras e negociatas, Ciro está errado. Claro, para alguns o vício é virtude.
Paulo
04/11/2021 - 21h54
Eu lamento se ele desistir. Acho que deveria manter a candidatura mesmo sabendo o que a sorte lhe reserva na urnas. Se Moro se lançar candidato, então, aí mesmo é que seu destino estará selado. É uma pena que o candidato mais qualificado de todos não tenha penetração popular suficiente. Fosse o Brasil um país mais letrado, Ciro seria candidatíssimo a vencer as eleições. Mas, ainda assim, espero que ele prossiga, para, ao termo de sua vida, poder dizer, como São Paulo apóstolo: “combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé”…
Adevir
04/11/2021 - 21h19
O bolso é o órgão importante do ser humano. Inclusive dos políticos.
Rodrigo Silva
04/11/2021 - 20h32
Meu irmao!!!! Que fique claro sobre os tais ciristas que vcs se referem: vamos ter uma um sistema tributario progessista ou nao???? As forcas politicas giram em torno disso: quem vai se beneficiar com o rumo do poder executivo, principalmente o rentismo fica sempre atento. O restante eh balela, eh sem foco, eh manipulacao da subjetivadade alheia. Ou seja, depois de todos os contos e fabulas do progressistas contraditorios: vamos conseguir concretizar um sistema tributario progressista ou nao? Ficaremos eternamente relativizando isso?
Valeriana
04/11/2021 - 18h52
Eu queria entender o que leva um sujeito como Cirolipa a se candidatar as eleiçoes sabendo que nao tem a minimachance nem de chegar ao segundo turno mas tem todas as chances de passar mais uma vergonha.
Bandoleiro Cansado
04/11/2021 - 18h51
Nenhum impacto,nao é assunto que interessa aos brasileiros e muito menos tem a ver com as eleiçoese de 2022.
JOHN JAHNES
05/11/2021 - 01h14
ACREDITEM, CIRO GOMES E O SEU PDT SEMPRE APOIARAM BOLSONARO, MESMO TENDO ALGUNS FILIADOS DO PARTIDO QUE SÃO CONTRA O GENOCIDA QUE O CIRO AJUDOU COLOCAR NO CARGO DE PRESIDENTE AO FUGIR PARA PARIS NO SEGUNDO TURNO A CRITICAR O PT, LULA E HADDAD. A ÉTICA DE CIRO É O PODER, TUDO PELO PODER, PARA CONSEGUIR O PODER ELE PISA ATÉ NO MELHOR AMIGO E ABRAÇA ATÉ O SATANÁS.
Ciro, concorrendo ou não, vai ser sempre no máximo 6% do total de votos válidos.
ADEU CIRO. Na próxima tente ser vereador em Fortaleza e aí você pode chegar a ser Presidente da Câmara Municipal. ADEUS CIRO. Até nunca mais.
Alexandre Neres
04/11/2021 - 16h04
O PDT foi o fiel da balança para a aprovação em primeiro turno da PEC dos Precatórios.
Aliás, não é de hoje que o PDT em questões candentes vota contrariamente aos ideais progressistas.
É triste ver o papel que se presta o Partido fundado por Leonel de Moura Brizola.
Não há motivo de alegria nem para apontar dedo, tampouco tal posição chega a me surpreender, haja vista o ponto de vista conservador e udenista de alguns cirominions que se manifestam neste blogue. Cada vez mais as posições convergem com o bolsonarismo.
A falta de habilidade e articulação política é gritante. A política é ímplacável. O ataque ferino na candidatura Ciro foi desferido pelo próprio partido.
Os parlamentares demonstraram que não estão dispostos a se aventurar em uma campanha sem perspectivas de lograr êxito. Querem algo concreto, palpável, para tanto se aliaram a Lira com o escopo de obter polpudas emendas. Parece que quiseram dar o recado de que eleição se ganha com dinheiro no bolso, não com o voluntarismo do exército de um homem só. Abandonaram o capitão do navio. André Figueiredo votou a favor.
Os sinais de fadiga são evidentes. O Miguel por apontar falhas grotescas, rachaduras, erros crassos e fazer previsões consistentes, porém não muito auspiciosas, foi tachado de traidor do movimento. Atrás de morro vem morro. E agora, pofexô?
Fanta
04/11/2021 - 15h41
Que Ciro Gomes se candidate ou não é a mesma coisa, não interessa a ninguém e não faz nenhuma diferença.
Lincoln
04/11/2021 - 15h21
Sim
Ciro joga contra si
Sua palavra tá perdendo valor
E pode ser uma saída da campanha eleitoral e até mesmo da política partidária.
Sebastião
04/11/2021 - 14h57
Uma grande parte dos petistas são fanáticos. Entre ciristas e bolsonaristas, são unânimes. Os dois últimos são articulados, e precisam sempre da fala dos líderes, pra que aja estímulos e disposição. Se retroalimentam disso. A fala de Ciro, estimulou a horda. Algo que acontece sempre quando Bolsonaro faz algo ruim, e este corre pra justificar e sempre tem uma desculpa. Fanáticos sempre se deixam enganar e se convencem facilmente. Só olhar, como os ciristas voltaram a dizer, que os petistas que estão incomodados com a atitude de Ciro. Mas, lógico que tem aqueles que vão discernindo as controvérsias de Ciro e deixando de ser entusiasta.