Talvez exista algum amor em SP (análise da pesquisa Ipespe em SP)

Foto: Bruno Thethe (Unsplash)

Primeiramente, uma breve introdução sobre o estado. 

São Paulo tem uma população de 47 milhões de pessoas.

Para efeito de comparação, as populações somadas de Suécia, Noruega, Finlândia, Dinamarca e Holanda totalizam 44 milhões.

O estado é o maior colégio eleitoral do país, com 31,77 milhões de eleitores, que correspondem a 22% do eleitorado nacional. 

Nos últimos 20 anos, houve mudanças profundas no grau de escolaridade do eleitorado paulista, o que influencia, naturalmente, o processo de formação do voto.

Fizemos um comparativo do grau de instrução do eleitorado paulista entre 2002 e 2021. 

Em 2002, o estado de São Paulo tinha apenas 8% de seus eleitores com ensino superior completo ou incompleto, ou 1,94 milhão. Hoje tem 6,6 milhões de eleitores nessa faixa de escolaridade, um aumento de 241% em 10 anos.

Analfabetos e cidadão com até o ensino fundamental respondiam por 65% dos eleitores de São Paulo em 2002, número que caiu para 32% em 2021. 

Os cidadãos paulistas com ensino médio (completo ou incompleto) correspondem hoje a 47% do eleitorado, contra 27% em 2002.

Em suma, o eleitorado paulista hoje tem um nível de escolaridade muito mais elevado do que há 20 anos. Os partidos e militantes do campo progressista precisam levar isso em conta quando planejarem suas estratégias para 2022. 

Agora, passemos à análise da pesquisa Valor/Ipespe, que realizou 1.000 entrevistas por telefone entre os dias 30 de agosto e 1 de setembro. 

São apresentados três cenários, A, B e C, com variações na chamada “quarta via”, que são os candidatos de centro-direita que tentam deslocar Ciro Gomes (PDT) de sua terceira posição. 

Em todos os cenários, o ex-presidente Lula (PT) ocupa a liderança, com 32% a 35%. 

No cenário A, com Doria (PSDB), Datena (PSL) e Mandetta (DEM) disputando a quarta via, Lula tem 32%, Bolsonaro 28% e Ciro 9%. 

Para efeito de comparação, uma pesquisa Ibope de junho de 2018, feita igualmente com cerca de mil entrevistas apenas no estado de São Paulo, mostrava Lula com 24%, Bolsonaro com 17%, Alckmin (PSDB) com 13% e Ciro com 4%. 

O cenário em junho de 2018 era mais obscuro: a poucos meses das eleições, 21%  dos paulistas diziam que votariam branco ou nulo, e 5% estavam indecisos. 

Hoje, apesar de faltar ainda um ano e meio para as eleições, apenas 8% marcaram branco ou nulo e 3% disseram estar indecisos, na pesquisa do Valor/Ipespe. 

O quadro para 2022 parece bem mais claro na cabeça do paulista, por razões simples: Lula não está mais preso, e recuperou seus direitos políticos, todos conhecem muito bem Jair Bolsonaro, Ciro também não é mais um ilustre desconhecido, e João Doria, bem, é governador do estado.  

 

O cenário B, com Eduardo Leite no lugar de Doria mostra o desempenho ainda muito fraco do governador do Rio Grande do Sul, com apenas 2%. Os votos de Doria parecem se diluir entre vários candidatos: Lula, Bolsonaro, Ciro, Datena e Mandetta, todos oscilam um ponto para cima. 

 

 

O cenário C, mais enxuto, com apenas Moro e Doria disputando a quarta via, traz Lula em sua melhor posição, com 35%, abrindo 8 pontos de vantagem sobre Bolsonaro.

Os decepcionantes 9% de Ciro neste cenário parecem constituir  – ao menos na fotografia dessa pesquisa – o seu teto eleitoral no estado de São Paulo. O eleitorado mais à direita prefere Bolsonaro, Moro, Dória ou Datena. O eleitorado mais à esquerda vai de Lula. Ciro fica num limbo de centro pouco promissor, e com uma desvantagem a mais: que é sua rejeição crescente junto a boa parte do eleitorado lulista, um fator que dificulta a entrada de sua campanha em alguns setores onde sua mensagem poderia ter mais apelo, como movimentos sociais e grupos de orientação progressista. 

A pesquisa do Valor/Ipespe também traz um cenário para o governo do estado, e aí identificamos um dado curioso. O número de brancos/nulos é imenso, 27%, mais 5% de indecisos, o que indica a possibilidade de mudanças expressivas no desempenho dos principais candidatos. 

Geraldo Alckmin segue na liderança, com 23% dos votos, seguido de Fernando Haddad e Guilherme Boulos, com 19% e 14%, respectivamente. 

A boa posição de Haddad e Boulos  é mais uma boa notícia para o ex-presidente, porque ambos são apoiadores de Lula, que terá, portanto, um palco duplo. É boa notícia tanto para Hadad quanto para Boulos, porque os números indicam que aquele que chegar ao segundo turno tenderá  a herdar a maioria dos votos dos outros, com chances reais, portanto, de vitória. 

 

 

A pesquisa também trouxe simulações de segundo turno para as eleições presidenciais. 

Os números reforçam o favoritismo do ex-presidente Lula, que ganha de todos os seus adversários por larga margem. Num eventual embate com Bolsonaro, o petista ponturia 47% X 34%. Lula venceria de Ciro, num eventual segundo turno, por 40X 30%. E, por fim, Lula ganha de Doria por 45% a 28%.

Ciro Gomes ganharia de Bolsonaro com 11 pontos de diferença, em São Paulo, o que mostra que o pedetista herdaria quase todos os votos do ex-presidente Lula.  

A avaliação do governo Bolsonaro em São Paulo é ruim para o presidente. Segundo a pesquisa Valor/Ipespe, 55% dos paulistas consideram seu governo ruim ou péssimo, contra apenas 25% que o consideram ótimo e bom. 

 

 

É importante destacar que a avaliação do governo Doria, embora não seja lá muito boa (o que se reflete no desempenho medíocre do governador nas pesquisas de intenção de voto), é menos pior que a de Bolsonaro: 37% dos paulistas acha sua administração ruim ou péssima, contra 28% que a consideram ótima ou boa. 

Conclusão: com o Nordeste pendendo para Lula, o Sul para Bolsonaro, o jogo das eleições será decidido no Sudeste, e São Paulo tem metade dos votos da região. 

Além disso, uma vitória eleitoral contra Jair Bolsonaro em São Paulo, estado mais rico e mais industrializado do país, significará também uma vitória política importante para a implementação de um projeto mais audacioso para os próximos anos. 

Talvez, por fim, exista algum amor em SP.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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