Por Deutsche Welle
Além dos deputados federais Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF), também o presidente Jair Bolsonaro encontrou-se na semana passada com a deputada alemã Beatrix von Storch, vice-líder do partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD). Nesta segunda-feira (26/07), a deputada alemã divulgou a foto para a imprensa do país europeu.
Em uma mensagem divulgada com a foto, ela afirmou que seu partido quer “fortalecer suas conexões e defender nossos valores cristãos e conservadores em nível internacional”. A foto mostra Bolsonaro abraçado a ela e ao marido dela, Sven von Storch. O encontro não consta na agenda de Bolsonaro.
Mais tarde, a deputada também reproduziu a foto em sua conta no Instagram, com uma mensagem de agradecimento a Bolsonaro e afirmando que “conservadores” devem “formar uma rede” para defender seus valores “em nível internacional”.
“Gostaria de agradecer ao presidente brasileiro pela amistosa recepção. Estou impressionada com sua clara compreensão dos problemas da Europa e dos desafios políticos do nosso tempo. Em um momento em que a esquerda está promovendo sua ideologia por meio de suas redes e organizações internacionais em nível global, nós, conservadores, devemos formar uma rede mais estreita e defender nossos valores conservadores em nível internacional. Além dos EUA e da Rússia, o Brasil é um parceiro estratégico global para nós, com o qual queremos construir um futuro juntos.”
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Boletim de Notícias (26/07)
Beatrix Von Storch é uma representante da ala ultraconservadora da AfD e em 2014 ajudou a levar o partido, inicialmente uma agremiação eurocética, a adotar posições de extrema direita. Hoje, a AfD é conhecida pelo discurso radical anti-imigração e adotou recentemente um programa eleitoral com aspectos negacionistas da pandemia.
Nos últimos anos, o partido também se tornou um guarda-chuva para diferentes grupos de ultradireita da Alemanha, como arquiconservadores, fundamentalistas cristãos e ultranacionalistas. Muitos membros também são acusados regularmente de nutrir simpatias pelo nazismoe de minimizar os crimes cometidos pelo Terceiro Reich.
Normalmente, governos estrangeiros evitam receber deputados da AfD. Dessa forma, parlamentares da sigla costumam viajar para países que têm governos tão isolados no cenário internacional quanto o partido.
Deputados da AfD já causaram controvérsia ao serem recebidos pelo regime do ditador sírio Bashar al-Assad, e pelos governos do líder de Belarus, Alexander Lukashenko, e do presidente russo Vladimir Putin. Uma delegação da AfD também visitou em 2020 a Crimeia, região da Ucrânia anexada pela Rússia.
Na semana passada, os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF) divulgaram fotografias ao lado de Von Storch. Na ocasião, Kicis escreveu: “Conservadores do mundo se unindo para defender valores cristãos e a família”. “Somos unidos por ideais de defesa da família, proteção das fronteiras e cultura nacional”, escreveu, por sua vez, Eduardo Bolsonaro em suas redes sociais.
O Museu do Holocausto, em Curitiba, criticou os encontros da deputada alemã com autoridades brasileiras e afirmou que a AfD é “um partido de extrema direita com tendências racistas, sexistas, islamofóbicas, antissemitas, xenófobas e com um forte discurso anti-imigração”.
Quem é Von Storch
Membro de uma família antiga de origem nobre, Beatrix von Storch, de 50 anos, é, pelo lado materno, neta de Johann Ludwig Schwerin von Krosigk, que serviu como ministro das Finanças da ditadura de Adolf Hitler por mais de 12 anos.
Ele seria mais tarde julgado e condenado pelo Tribunal de Nurembergue, na etapa conhecida como o “julgamento dos ministros”. Schwerin von Krosigk foi sentenciado a dez anos de prisão por crimes de guerra.
Pelo lado paterno, o outro avô de Beatrix von Storch também não foi menos controverso. Filho de um duque, Nikolaus von Oldenburg era membro tanto do Partido Nazista quanto da SA, a força paramilitar da legenda.
O passado nazista da família de Beatrix von Storch foi destacado pela imprensa alemã a partir de 2014, quando ela foi eleita deputada europeia pela AfD.
Em 2016, Von Storch manifestou aprovação à mensagem de um usuário do Facebook que havia perguntado se guardas de fronteira deveriam atirar em refugiados que chegassem ao país, inclusive mulheres com crianças.
À época, o comentário de Von Storch e uma declaração similar de Frauke Petry, então líder da AfD, causaram uma onda de indignação na Alemanha. Vários políticos lembraram na ocasião que os últimos episódios de refugiados baleados na Alemanha haviam envolvido fugitivos da Alemanha Oriental que tentaram escalar o Muro de Berlim.
Na sua viagem ao Brasil nesta semana, ela foi acompanhada de seu marido, Sven von Storch, de quem adotou o sobrenome em 2010.
Sven, membro de uma família alemã que se fixou no Chile após a derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, dirige junto com sua mulher vários coletivos e lobbies ultraconservadores na Alemanha, que promovem ideias antimigratórias e “valores cristãos” e se opõem ao casamento gay.
Na semana passada, publicações de Eduardo Bolsonaro e Bia Kicis sobre seus encontros com a ultradireitista alemã imediatamente geraram uma série de críticas nas redes sociais, apontando episódios controversos da carreira política de Beatrix von Storch, posições xenófobas e ultranacionalistas da deputada e de seu partido e até mesmo a sombria história familiar da parlamentar.
Em janeiro de 2018, ela voltou a causar controvérsia ao reclamar publicamente de tuítes da Polícia de Colônia que desejavam feliz ano novo em várias línguas, inclusive o árabe. “O que diabos está acontecendo neste país? Por que um site oficial da polícia da Renânia do Norte-Vestfália [estado em que fica Colônia] tuíta em árabe. Eles pretendem apaziguar as hordas de homens bárbaros, muçulmanos e estupradores em massa dessa maneira?”, escreveu na ocasião. A rede social apagou a mensagem por violação das suas regras de conduta.
Recentemente, Von Storch também passou a abordar uma tema que tem mobilizado redes de ultradireita pelo mundo: o cerco das redes sociais como o Facebook e o Twitter contra publicações incendiárias ou extremistas. Reclamações contra as redes têm unido trumpistas, bolsonaristas e outros membros da cena de ultradireita pelo mundo. Numa publicação recente, ela disse que critérios “esquerdistas” das redes “cancelam” especialmente conservadores.
Dentro da AfD, a deputada costuma ser apontada como membro da ala “cristã ultraconservadora”. Em 2014, quando os ultradireitistas tomaram o partido, ela afirmou que via a sigla como um veículo para “uma visão cristã da humanidade”. Na imprensa alemã, Von Storch costuma ser classificada como “reacionária”, “arquiconservadora” e “cristã radical”.
Outras conexões da AfD com o bolsonarismo
A visita de Beatrix von Storch ao presidente Bolsonaro e aos deputados Eduardo Bolsonaro e Bia Kicis não é a única conexão recente entre membros da AfD e a cena bolsonarista/ultraconservadora brasileira.
Em 2018, na ocasião da eleição de Jair Bolsonaro à Presidência, a conta no Twitter da bancada da AfD no Bundestag reproduziu uma mensagem do deputado Petr Bystron felicitando Bolsonaro pela vitória.
“Jair Bolsonaro é um conservador franco que vem trabalhando para combater a corrupção de esquerda e restaurar a segurança e prosperidade para o seu povo”, disse em nota o deputado. “Como ocorre com a AfD, ele foi inimizado por todos os lados por ser um outsider que desafiou o sistema”, completou Bystron.
Em março de 2021, o deputado da AfD Waldemar Herdt viajou a São Paulo para visitar o Templo de Salomão e se encontrar com pastores da Igreja Universal do Reino de Deus. Nascido no Cazaquistão, Herdt faz parte da minoria alemã-russa que foi deportada pelo regime soviético para a Ásia Central durante a ditadura de Josef Stalin. Quase todos os membros desse grupo migraram para a Alemanha nos anos 1990, após o fim do comunismo. Dentro da AfD, Herdt é um dos representantes da ala cristã ultraconservadora, a mesma de Von Storch.