Por Rodrigo Perez
Daqui até outubro de 2022, muita coisa pode acontecer. Mas se a eleição fosse hoje, a disputa seria marcada pelo embate entre as duas maiores lideranças populares da história recente brasileira. E não, de forma alguma estou propondo simetria entre Jair Bolsonaro e Lula.
Estou dizendo o óbvio: nos anos da “Nova República” somente Lula e Bolsonaro conseguiram acionar as ruas, mobilizar afetos, despertar paixão e ódio. O confronto entre Lula e Bolsonaro não é apenas a disputa entre duas lideranças carismáticas. É a disputa entre duas culturas políticas radicalmente distintas. De um lado, Bolsonaro com sua agenda disruptiva, tentando implodir o sistema instituído em 1988. Do outro lado, Lula, o grande representante do contrato social e político da redemocratização, tentando conservar a ordem vigente.
Cada um a seu modo, ambos fazem muito bem o que se propõem. Pra quem gosta de política, pra quem estuda política, tá aí objeto excitante, interessante de acompanhar.
Especialmente difícil é a missão de quem pretende ser terceira via na disputa eleitoral protagonizada por duas figuras tão solares. Difícil porque o receituário da terceira via não pode ser outro a não ser bater, ao mesmo tempo, em Lula e Bolsonaro, com o objetivo de se apropriar da rejeição sobreposta, daqueles eleitores que rejeitam os dois.
Nas atuais circunstâncias, a chave da porrada não pode ser outra a não ser a tal corrupção. Não é a melhor discussão. Trata-se de debate moralista que pouco ajuda na resolução dos principais problemas do país. Mas não dá pra negar que esse seja o tema que funda nossa imaginação política nacional.
Henrique Mandetta, Eduardo Leite, Ciro Gomes, João Dória. Qualquer um que pretenda desafiar o favoritismo de Lula e Bolsonaro tentará criar simetria entre os dois, e fará pela denúncia da corrupção. A diferença é que Mandetta, Eduardo Leite e João Dória não perdem nada chamando Lula e Bolsonaro de ladrões. A situação de Ciro Gomes é diferente, é muito mais complicada.
Não estou dizendo que a estratégia eleitoral de Ciro esteja errada. Tem gente boa, especialista em eleição, cuidando da campanha. Estou questionando é a ambição de Ciro em ser presidente da República. Diferente dos outros aspirantes à terceira via, Ciro tem (ou tinha) biografia consolidada no campo político progressista, que é hegemonizado por Lula.
O dilema de Ciro pode ser resumido da seguinte forma: está arriscando a biografia pra tentar vencer uma eleição que muito provavelmente não pode ser vencida. Pros outros (Mandetta, Dória, Eduardo Leite e quem mais se arrisque a ser terceira via), seria só uma derrota, com a vantagem de tentar liderar a oposição ao novo governo, seja ele quem for. Pra Ciro, seria uma dupla derrota: na eleição e na reputação.
Sinceramente, não sei se vale o esforço e o constrangimento. A história do Brasil é cheia de grandes lideranças que não chegaram à presidência da República. Acontece.
Para Ciro, a terceira via é fardo muito pesado, missão inglória e fadada ao fracasso. De todos os candidatos, Ciro é o que mais tem a perder.