A decisão do Exército de não punir o ex-ministro da Saúde e general Eduardo Pazuello é uma vitória de Pirro do presidente Jair Bolsonaro.
Vitória de Pirro, para quem não se lembra, é aquela onde você ganha a batalha, mas a um custo tão alto que é pior do que uma derrota.
Bolsonaro é o Comandante em Chefe das Forças Armadas, portanto é o superior hierárquico do comandante do Exército, o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira. Este não precisa de uma ordem direta de Bolsonaro para entender perfeitamente qual é a opinião e o desejo do presidente em relação ao tema.
Em tempos de anarquia nas redes sociais, pode parecer que a opinião pública não tem mais importância.
Mas tem.
A opinião pública ainda dirige os rumos da democracia, porque ela é quem decide quem será eleito, quem será preso, quem será alijado do processo político.
E agora foi criado mais um constrangimento entre o Exército e a opinião pública.
Segundo o Datafolha, 54% dos brasileiros acham que os militares não deveriam ter cargo no governo.
Quando olhamos esses números mais de perto, percebemos a mesma dinâmica que já viemos detectando em outros pontos dessa e de outras pesquisas: a perda de apoio de Bolsonaro junto tanto as camadas populares, que são as que dão voto, como junto aos mais instruídos e com maior renda, que são os que organizam o mercado da opinião pública.
Entre pessoas com renda até dois salários, 56% responderam que os militares não deveriam ter cargo no governo.
Entre os mais instruídos, com ensino superior, 58% acham que militares não deveriam ter cargos.
Esse constrangimento pode ser o ingrediente que faltava para se deflagrar, dentro das Forças Armadas, um movimento de oposição ao presidente. Ele começa silencioso, mas virá a tôna a qualquer momento.
O apoio a Bolsonaro dentro das próprias Forças Armadas tenderá a ficar cada vez mais problemático, na medida em que o bom senso fizer o seu trabalho implacável.
Bolsonaro, como sempre, ajuda a prejudicar sua própria imagem, fazendo pouco caso de todos os seus críticos, que estão ganhando força na mídia, no Senado, no Congresso, no judiciário, em toda a parte.
Hoje, em live, o presidente decidiu cuspir no rosto do bom senso mais elementar, ao afirmar que a participação de Pazuello no ato de Copacabana, em apoio a Bolsonaro, não foi “político”. Para ele, “político” seria apenas se as pessoas portassem bandeiras vermelhas. É o mesmo tipo de lógica que estamos testemunhando nas falas dos senadores bolsonaristas: o desprezo à lógica e aos fatos.
Além disso, Bolsonaro produz mais uma dessas pérolas fascistas, ao tentar explorar, ao máximo, esse elemento cultural de “ódio à esquerda” e “medo do comunismo”.
Mas o Brasil não é Estados Unidos. Aliás, mesmo nos EUA, esse “fantasma do comunismo” não vem colando mais tanto, vide a quase vitória de Bernie Sanders, auto-intitulado socialista, nas prévias do Partido Democrata.
Muitas pesquisas revelam que, mesmo setores conservadores da população brasileira, como os evangélicos, já começam a se afastar de Bolsonaro. No último Datafolha, Bolsonaro tem 33% de ótimo e bom entre evangélicos, mas 35% de ruim e péssimo.
O bom senso nem sempre prevalece, mas ele tem uma força natural incontestável. E está ficando cada vez mais difícil para Bolsonaro demonstrar aos eleitores que o possui.