Em entrevista ao jornalista Glenn Greenwald, que trabalha hoje na Carta Capital, o presidenciável Ciro Gomes voltou a fazer um ataque muito equivocado a alguns blogs políticos, nominalmente o 247 e o DCM. E digo voltou porque não é a primeira vez.
É um erro, sobretudo, de conteúdo. A acusação de Ciro é de que os blogs formam uma espécie de “gabinete do ódio” pago com “dinheiro sujo do PT”. Em algumas ocasiões ele fala em “sobras do petrolão”.
É uma acusação que não tem sentido algum. Esses blogs não precisam de financiamento do PT, porque criaram fontes próprias de receita. Eles tem relação política com o PT, o que é diferente.
Quanto ao uso de “dinheiro sujo”, isso é uma baixaria desnecessária. Não se deve acusar ninguém sem provas.
Tampouco são “gabinete do ódio”, expressão que não deveria ser vulgarizada. Se Ciro bate duro no PT, deveria encarar como natural, e até positivo para ele, que alguns blogs de esquerda, lidos e assinados por milhares de petistas, reajam na mesma moeda.
Eu não concordo com diversas críticas que esses blogs fazem a Ciro Gomes. Inclusive já postei alguns contrapontos aqui no Cafezinho. Mas também não concordo com algumas críticas que Ciro faz ao PT. Temos que aprender a discordar uns dos outros com mais respeito e civilidade.
Mesmo se se descobrisse que o PT “financia” esses blogs, o que acho difícil que seja verdade, não entendo qual seria o crime ou o problema. O partido comunista sempre financiou sua imprensa, e, em inúmeros momentos da história, em muitos países, foi uma imprensa de excelente qualidade, oferecendo um contraponto fundamental à imprensa burguesa, que também, aliás, sempre foi financiada por seus “partidos”.
Partidos políticos não são organizações criminosas, e não devemos jamais nos render a retórica antipartidária que levou a Lava Jato e a Bolsonaro. Como dirigente partidário, Ciro Gomes deveria defender que o PDT, por exemplo, trabalhasse pela democratização da comunicação, estimulando que suas prefeituras anunciassem também em blogs políticos. É isso que todo partido progressista, de esquerda, e comprometido com um debate político plural, deveria fazer.
Por trás dessas acusações, há também um certo preconceito, derivado do desconhecimento sobre os mecanismos de financiamento dos blogs políticos, até por eles constituírem fenômeno relativamente novo na vida brasileira.
Desde algum tempo, os blogs políticos que atingiram uma audiência razoável, obtém financiamento com certa facilidade através de ferramentas publicitárias as mais diversas, além do hábito crescente dos leitores de ajudarem os blogs que mais gostam. Diferentemente do passado, em que jornais locais precisavam, quase que necessariamente, de financiamento político, isso não é mais uma realidade.
Toda mídia que opera no jornalismo político, grande ou pequeno, tem lado. O Globo tem lado. A Folha tem lado. O Estadão tem lado. A Veja tem lado. E os blogs tem lado. Alguns disfarçam melhor. Outros tem um tamanho relativamente grande, que os permitem “diluir” um pouco a opinião central do órgão. Um blog político tem muito menos instrumentos para fazer isso. Se o editor do blog tem uma opinião, e ao mesmo tempo escreve para o blog e trabalha de âncora nas lives do blog, será impossível disfarçar a sua opinião. E aí a questão da “parcialidade” aparece com uma clareza às vezes constrangedora.
Mas não há nada de errado nisso. Ter lado, assumir posições políticas, não é crime. Numa democracia, eu diria até que é bastante saudável. Não precisamos recuperar a lei de Sólon, primeira liderança democrática da Grécia Antiga, que instituía pesadas multas contra os cidadãos “isentos”, mas também seria absurdo, num regime inteiramente baseado em partidos políticos, alimentar preconceito contra cidadãos, jornalistas ou blogs por causa de seus vínculos, muitas vezes puramente ideológicos, com esses mesmos partidos.
É um erro igualmente na forma, porque seria perfeitamente possível a Ciro Gomes rebater as críticas desses blogs, sem apelar para menções a “dinheiro sujo” ou supostas ligações com o PT.
Além do mais, se o objetivo é neutralizar as críticas desses blogs, o resultado é o oposto. Acusações exageradas acabam por gerar movimento de solidariedade em favor desses veículos, inflamando de tal maneira os ânimos da militância petista, que ela acaba por aderir a uma cruzada anticirista que apenas prejudica o presidenciável e exaure a sua “turma boa”, que precisa ficar lhe defendendo o tempo inteiro.
Numa eleição, assim como numa guerra, apostar em fazer mais e mais inimigos, não me parece a melhor estratégia.
Ciro hoje é um dos líderes mais importantes da terceira via. Sua palavra é ouvida com muita atenção, sobretudo por milhares de brasileiros que preferem não votar em Lula ou Bolsonaro, e o vêem como um candidato viável, e com um bom projeto nacional.
Não deveria cometer esse tipo de erro, até porque, diante da tragédia social na qual estamos submersos, será difícil convencer o brasileiro de que um dos grandes problemas do país são dois ou três blogs que o criticam.