Se o objetivo da entrevista de Fabio Wajngarten (ex-secretário de comunicação do governo Bolsonaro) à Veja foi isentar o presidente de culpa na condução da pandemia, a tentativa foi deveras mal sucedida. Fabio afirma basicamente que houve um movimento capitaneado por ele próprio (e que envolveu presidentes do Senado e da Câmara, PGR, ministros do STF) para que o governo adquirisse as 70 milhões de doses da vacina oferecidas pela Pfizer no ano passado, mas que a negócio não saiu por causa da incompetência do ministério da Saúde.
Jair Bolsonaro, o dono da caneta mais poderosa do Brasil, aquele mesmo que escolheu a dedo um ministro da Saúde que lhe obedecesse bovinamente, não teve nada a ver com isso, segundo essa curiosa narrativa. Como estamos às vésperas da instalação da CPI que vai apurar as ações e omissões do governo federal diante da Covid-19, é evidente o que o ex-ministro tenta fazer com essa entrevista: livrar a sua cara (“Falei com a República inteira a respeito [da vacina]”, garante ele) e a do presidente – talvez imaginando que os consideráveis nacos do poder que Bolsonaro mantém possam lhe ser úteis durante a investigação que ocorrerá no Senado.
A entrevista inaugura uma fase que promete ser terrível para o governo e, consequentemente, ótima para o país. Bolsonaro e sua trupe de tresloucados precisarão se explicar. Se tudo correr bem, o óbvio saltará aos olhos de todos: o governo federal comete um crime continuado contra a população do próprio país e os responsáveis precisam ser afastados o quanto antes (para que evitemos mais mortes estúpidas) e punidos exemplarmente (porque um país civilizado não pode tolerar assassinato em massa cometido por seus representantes eleitos).
A notícia de que deputados de esquerda e de direita – incluindo ex-bolsonaristas caricatos como Kim Kataguiri, Joice Hasselmann e Alexandre Frota – se reuniram para unificar os trocentos pedidos de impeachment do presidente indica que a queda de Bolsonaro não é mais uma utopia. A hipótese de que o impeachment aconteça está iniciando um lento movimento do campo do improvável para o do possível.
Grandes empresários e especuladores que têm um mínimo de faro político (ou mesmo bom senso) sabem que não há futuro algum para o país caso Bolsonaro permaneça no poder. Os partidos da direita tradicional sabem que com Bolsonaro na urna seu caminho na disputa em 2022 fica interditado. Os grandes veículos de imprensa e o STF podem até se alinhar ao bolsonarismo em muitas pautas, mas apanham da malta quase todo dia e, portanto, não devem mover uma palha para salvar o presidente – muito pelo contrário.
Restam a Bolsonaro uma base ideológica radicalizada e violenta e um apoio resiliente, embora declinante, de algo em torno de um terço do eleitorado. Não é pouco, mas talvez não seja o suficiente para se salvar.
É hora de partir para cima dos indecisos – aqueles congressistas que esperam o barco submergir quase completamente para pular na água e tentar se salvar.
Saibam estes que não tem mais volta. Não há futuro político para um genocida. Não pode haver. É hora de arrumar um bote salva-vidas, porque há impeachment à vista.