A entrevista do ex-presidente Lula ao jornalista Reinaldo Azevedo, da Bandenws, traz um indivíduo ainda em estado de graça pela decisão judicial que anulou todos seus processos judiciais, tornando-o novamente um cidadão livre, em plena posse de seus direitos políticos.
Em alguns momentos da entrevista, todavia, Lula demonstrou nervosismo, como quando lembrou reações crueis de seus adversários políticos durante a morte de seus entes queridos, como no caso do falecimento de dona Marisa.
Lula também se alterou um pouco quando Reinaldo abordou os problemas de corrupção na Petrobras, respondendo que a Lava Jato acabou por beneficiar corruptos e prejudicar empresas estratégicas para a economia brasileira.
Uma das oportunidades perdidas de Reinaldo Azevedo, de provocar o ex-presidente, foi quando Lula menciona o papel de Palocci na corrupção da Petrobras. Lula havia defendido que nenhum petista participou ativamente dos desvios, e que os diretores da estatal mais envolvidos eram funcionários de carreira, com décadas de serviço. Mas e o Palocci?
A corrupção na Petrobras ainda precisa ser melhor explicada pelo ex-presidente em futuras entrevistas.
Em seu livro, a jornalista Malu Gaspar traz denúncias muito graves contra o PT, que também precisariam ser respondidas com mais assertividade.
É inegável constatar, porém, que o momento político atual pertence a Lula.
Admiradores e adversários observam o ex-presidente com um misto de fascínio e perplexidade, porque assim como ninguém imaginava que Bolsonaro se tornasse presidente da república, igualmente poucos previam que o ex-presidente voltaria ao cenário com tanta força.
Aliás, o próprio fato de Lula reaparecer na grande imprensa, num programa de entrevista de Reinaldo Azevedo – que durante anos foi um dos críticos mais ferozes do PT – é outra dessas surpresas da política nacional que ninguém poderia prever.
Lembro-me, por exemplo, de Reinaldo defendendo o impeachment de Lula com tanta raiva e amargor, que ele repetia o termo impeachment como um cônsul romano defendendo a destruição de Cartago.
Se esse “momento Lula” vai durar e prosperar, apenas o tempo vai dizer. O famigerado antipetismo vai se diluir, ou vai experimentar um “revival” com esse retorno triunfal do ex-presidente à arena política?
Depois de tantas reviravoltas, é temerário fazer qualquer previsão daqui para frente.
Na parte econômica, Lula arriscou uma tímida autocrítica a Dilma, dizendo que ela cometeu exageros nas isenções fiscais que concedeu aos empresários, mas que já tinha dado sinais de que os rumos seriam corrigidos.
Essa é a parte que mereceria uma crítica mais detalhada em nossa análise, mas deixemos para outro post.
Ao final da entrevista, Reinaldo mencionou o manifesto assinado por alguns presidenciáveis de centro, direita e centro-esquerda, e admitiu que seria um “sonho” que se oferecesse uma alternativa à polarização.
Lula reagiu com visível desprezo, dizendo que não se “pesca em terra seca”, e afirmando que todos tinham votado em Bolsonaro. Foi corrigido por Reinaldo sobre Ciro, ao que Lula rebateu que o pedetista não tinha votado, pois estaria em Paris.
O jogo político de 2022 ainda não está claro. A reentrada de Lula embaralhou tudo. O centro começa a se reorganizar e agora tudo indica que o bolsonarismo pode, de fato, entrar em colapso, com seus eleitores migrando massivamente para outro candidato.
Por outro lado, a missão do “centro” – alguns se irritam com essa denominação, pois vêem nisso um eufemismo para o que seriam forças de direita, mas é fato que, diante de Bolsonaro, temos um centro político cuja principal característica é o esforço para se afastar do atual presidente, mas também se manter distante da esquerda identificada com Lula e o PT – a missão do centro é complicada, porque o seu candidato mais forte, Ciro Gomes, tem propostas e ideias que dificilmente serão aceitas pelos outros partidos, de perfil mais liberal. E vice-versa.
Embora o cenário ainda não esteja claro, todavia, já é possível prever que teremos três ou quatro forças importantes disputando as eleições presidenciais em 2022: Lula ou outro candidato do PT, Bolsonaro, o “centro”, e Ciro. As chances de Ciro, diminuídas dramaticamente com a volta de Lula ao jogo, poderiam aumentar caso ele fosse o candidato escolhido por este centro, assim como um outro candidato do centro, se viesse a receber o apoio de Ciro, poderia quebrar resistências junto a alguns setores mais ligados ao trabalho.
De qualquer forma, a volta de Lula foi fundamental para tirar o Brasil do marasmo e da depressão política. Ele é um personagem de importância histórica, cuja presença pode ajudar na grande luta que temos nos próximos meses, que é asfixiar o fascismo tupiniquim representado por Bolsonaro, empurrando-o de volta ao buraco do qual ele nunca deveria ter saído. Essa é um luta de todas as forças democráticas, e todos sairemos ganhando diante de uma derrota clara sobre o bolsonarismo.
Caso Bolsonaro não venha a disputar o segundo turno em 2022, e agora existe a chance disso acontecer, teremos oportunidade de experimentar uma campanha menos emocional, baseada em projetos, em críticas construtivas ao passado, em anseios genuínos por mudanças estruturais em nossa economia política!