Senadores da oposição apresentam projetos para anular normas da Funai

Dois projetos em análise no Senado buscam derrubar normas editadas pelo governo que afetam povos indígenas. Um deles, apresentado nesta segunda-feira (1°), trata da instrução normativa conjunta entre Funai e Ibama que facilita o licenciamento ambiental para empreendimentos ou atividades dentro de terras indígenas. O outro projeto é sobre a resolução que restringe a autodeclaração indígena. Nos dois casos, os senadores apontam inconstitucionalidade e prejuízo aos direitos dos índios.

O Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 96/2021, dos senadores Paulo Rocha (PT-PA) e Zenaide Maia (Pros-RN), foi apresentado nesta segunda-feira para sustar a instrução da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que busca incentivar a atividade produtiva dentro de terras indígenas. Uma das principais críticas é à permissão para que haja, dentro dessas terras, empreendimentos feitos por organizações de composição mista de índios e não índios. A regra, segundo Paulo Rocha, é inconstitucional.

“Essa regra da instrução normativa permite, por exemplo, que grandes grupos econômicos dos setores da agropecuária realizem empreendimentos e atividades no interior de terras indígenas, por meio de organizações de composição mista de indígenas e não indígenas. Isso viola frontalmente as regras constitucionais”, alertou o senador.

Além disso, a instrução normativa prevê casos de dispensa e de simplificação do licenciamento. A mudança, de acordo com Paulo Rocha, pode resultar na liberação de atividades em grandes proporções sem o devido licenciamento no interior de terras cujo usufruto exclusivo é dos povos indígenas.

Autodeclaração

Já o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 95/2021, apresentado na semana passada, tem o objetivo de derrubar a resolução que estabeleceu novos critérios para a heteroidentificação de povos e indivíduos indígenas complementares à autodeclaração. O procedimento de heteroidentificação racial se baseia na percepção social de outros, que não a própria pessoa, para promover a identificação racial.

O projeto foi apresentado pelos senadores Paulo Rocha (PT-PA), Rogério Carvalho (PT-SE), Zenaide Maia (Pros-RN), Humberto Costa (PT-PE), Jean Paul Prates (PT-RN), Jaques Wagner (PT-BA) e Paulo Paim (PT-RS). De acordo com os senadores, a resolução fere a Constituição e tratados internacionais assinados pelo Brasil ao transferir para a Funai a prerrogativa de definir quem é e quem não é índio no Brasil.

Além disso, segundo eles, a resolução pode promover a exclusão de pessoas das políticas públicas como a vacinação prioritária, no momento em que a mortalidade por covid-19 apresenta números 16% maiores entre os índios. “Subtrair desta população o próprio direito de se identificar como indígena é um cruel golpe que pode ter como uma das consequências a exclusão de políticas públicas como a vacinação prioritária de grupos de maior risco”, dizem os autores na justificativa do projeto.

Intenção

Segundo a Funai, a mudança nos critérios foi feita para padronizar e dar segurança jurídica ao processo de heteroidentificação, de modo a proteger a identidade indígena e evitar fraudes na obtenção de benefícios sociais. De acordo com o presidente da fundação, Marcelo Xavier, ainda que se considere que a identidade e o pertencimento étnico não sejam conceitos estáticos, mas processos dinâmicos de construção individual e social, a ausência de critérios na heteroidentificação pode gerar uma banalização da identidade indígena.

A resolução, editada em janeiro, já foi alvo de manifestações contrárias de diversas organizações, como o Conselho Indígena Missionário (Cimi) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Também gerou uma nota pública da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal, com a recomendação para que a norma seja revogada.

“Os chamados ‘critérios específicos de heteroidentificação’ definidos pela Funai, além de contrariarem o direito à autodeterminação dos povos indígenas, revelam-se ambíguos e permitem interpretações descabidas acerca da identidade indígena, como se esta fosse mera cristalização de diferenças biológicas ou culturais entre grupos humanos”, diz a nota.

Se aprovados pelo Senado, os projetos ainda precisarão passar pela Câmara dos Deputados.

Fonte: Agência Senado

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