Por Paulo Cesar Ribeiro Lima – AEPET
No dia 24 de fevereiro de 2021, a Petrobrás anunciou que conseguiu reverter a trajetória do resultado contábil
nos primeiros nove meses do ano e alcançou o lucro líquido de R$ 59,9 bilhões no quarto trimestre de 2020. No resultado consolidado de 2020, a estatal obteve lucro líquido de R$ 7,1 bilhões.
A reação de alguns meios de comunicação foi imediata. Importante sítio da internet publicou a seguinte manchete: “Lucro da Petrobras é o maior já registrado na história da Bolsa brasileira” (1) .
Um jornal de grande circulação publicou “A doce ironia de Castello Branco e um tapa de luva de R$ 59 bilhões em Bolsonaro” (2) . Outra matéria desse mesmo jornal tem o seguinte título: “Após lucro recorde, Petrobras repassará R$ 2,9 bi a União” (3) .
Nesse contexto, é muito importante apresentar alguns esclarecimentos sobre o resultado contábil da Petrobrás no exercício de 2020.
No primeiro trimestre de 2020, a estatal apresentou um prejuízo contábil de R$ 48,5 bilhões, o pior resultado da empresa em um trimestre. Esse prejuízo foi consideravelmente afetado pela “perda no valor recuperável” de ativos no valor de R$ 65,3 bilhões derivada da realização de teste de impairment.
A mais relevante causa para essa perda foi a inadequada projeção da Administração da estatal para o preço do Brent, que mudou de US$ 65 por barril para a escala mostrada na Figura 1 . (4)
Figura 1: Escala do Brent para cálculo do impairment no primeiro trimestre
O Brent médio em termos reais no ano de 2020 foi US$ 41,96 por barril e não de US$ 25,00 como projetado pela Administração da Petrobrás, liderada pelo Sr. Roberto Castello Branco.
Para o ano de 2021, o Administração da estatal tinha previsto um Brent médio de US$ 30,00 por barril. Em 2021, até o dia 22 de fevereiro de 2021, o Brent médio foi de US$ 57,68 por barril. No dia 22 de fevereiro de 2021, o preço do Brent foi de US$ 64,73 por barril.
Observa-se, então, quão equivocada foi a projeção feita pela equipe do Sr. Roberto Castello Branco, que levou a uma “perda contábil” de R$ 65,3 bilhões no primeiro trimestre de 2020.
Se nada fosse feito, em razão das equivocadas projeções, a Petrobrás apresentaria um prejuízo bilionário no exercício de 2020. Veio então a solução: a reversão parcial dos “equivocados impairments”. No resultado do quarto trimestre de 2020, a estatal apresentou uma reversão de perdas por impairments de R$ 31 bilhões . (5)
Apesar dessa reversão, no resultado consolidado da Petrobras do exercício de 2020, a perda anual no valor de recuperação de ativos (Impaiment) foi R$ 34,26 bilhões, conforme mostrado na Figura 2; no resultado anual da controladora, essa perda foi de R$ 43,34 bilhões.
Também é importante ressaltar que a Petrobrás ainda é uma empresa de elevado lucro bruto. Nos resultados consolidados de 2020 e 20290, esse lucro foi de, respectivamente, R$ 123,96 bilhões e R$ 122,11 bilhões. Esses elevados lucros, entretanto, não geram justo pagamento de tributos.
Conforme mostrado na Figura 2, no resultado consolidado, o lucro da Petrobrás antes dos impostos foi de apenas R$ 37 milhões. Ou seja, praticamente não houve lucro. Essa ausência de lucro decorre de duas grandes deduções: despesa de vendas, de R$ 25,02 bilhões, e impairment de R$ 34,26 bilhões.
Geralmente, o impairment não é dedutível para fins de tributação, a menos que haja venda ou baixa (6) ; ou seja, os impairments são after-tax.
No ano de 2019, a despesa de vendas no resultado consolidado foi muito menor: R$ 17,75 bilhões. Em 2018, a despesa de vendas foi de apenas R$ 13,94 bilhões. Esse grande aumento da despesa de vendas decorreu, principalmente, da venda de ativos de transporte de gás natural. Em 2019, a Transportadora Associada de Gás S.A.- TAG, proprietária dos gasodutos das regiões Nordeste e Norte, foi privatizada com a venda de 90% das ações por R$ 33,5 bilhões . (7)
No fluxo de caixa consolidado da Petrobrás de 2019, os recebimentos pela venda de ativos foram de R$ 41,05 bilhões. Nesse ano, a estatal teve um “melhor” resultado financeiro por causa da venda de ativos estratégicos, mas que compromete os resultados seguintes, como já ocorreu em 2020. De 2018 a 2020, a despesa de vendas, por exemplo, aumentou de R$ 13,94 bilhões para R$ 25,02 bilhões.
Como já mencionado, o lucro consolidado da Petrobrás antes dos impostos foi de apenas R$ 37 milhões. No caso da controladora, esse lucro foi de somente R$ 2 bilhões. O aumento de R$ 2 bilhões para o celebrado lucro contábil de R$ 7,1 bilhões foi decorrência tão somente de imposto de renda e contribuição social diferidos no valor de R$ 5,6 bilhões. O valor corrente desses tributos foi de apenas R$ 489 milhões.
Apesar do mal resultado anual de 2020, o Conselho de Administração aprovou remuneração aos acionistas sob a forma de dividendos no valor de R$ 10,3 bilhões (8). Esse valor é equivalente a 5% do capital social, aplicado tanto às ações preferenciais quanto ordinárias. Os acionistas estrangeiros, que detêm 43,11% do capital social da Petrobrás (9) , serão importantes recebedores de dividendos.
Do valor de R$ 10,3 bilhões de pagamento de dividendos, R$ 5,7 bilhões são referentes à destinação do resultado do exercício de 2020 e R$ 4,6 bilhões são oriundos da conta de reserva de retenção de lucros.
Em suma, não há o que celebrar no resultado contábil da Petrobrás de 2020. Nesse ano, a estatal teve um mal desempenho contábil e o lucro da controladora de R$ 7,1 bilhões decorreu, principalmente, da parcela referente ao “recebimento” de R$ 5,1 bilhões de imposto de renda e contribuição social.
Desse modo, em vez de pagar, a Petrobrás “recebeu” imposto de renda e contribuição social em 2020, o que não é compatível com a lucratividade da estatal (10) , que produz e exporta petróleo extraído dos poços mais produtivos do mundo localizados na província petrolífera do Pré-Sal. Nesse cenário, é urgente a alteração da Lei nº 13.586/2107, que permite grande renúncia fiscal.
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