Por Theófilo Rodrigues
No próximo dia 1o. de fevereiro, a Câmara dos Deputados elegerá seu novo presidente. Com a impossibilidade de reeleição do deputado Rodrigo Maia (DEM), uma competitiva disputa começou a ser travada nos corredores de Brasília. Ao menos três campos políticos já começaram a ser construídos: os partidos do Centrão que apoiam o presidente Jair Bolsonaro parecem estar unidos em torno da candidatura do deputado Arthur Lira (PP); os deputados de Direita e Centro-direita (DEM, PSDB, PSD, MDB e PV) que orbitam Rodrigo Maia parecem não ter definido ainda um nome, embora Baleia Rossi (MDB) apareça com força; e os deputados à esquerda do espectro político (PT, PCdoB, PSB, PDT, PSOL e REDE) avaliam entre uma candidatura própria ou apoiar o candidato de Maia.
Se esses três campos de fato concorrerem em chapas separadas, as chances do Centrão eleger Arthur Lira crescem, o que seria péssimo para a oposição ao governo Bolsonaro. Por outro lado, se os dois campos de oposição se unirem em uma chapa única, a derrota de Bolsonaro será certa. Se esse é o caminho mais óbvio para a oposição, o que falta para a Frente Ampla se concretizar? Esse é o grande debate que os partidos enfrentarão nos próximos 50 dias.
Toda aliança política pressupõe acordos e pactos mínimos. E a construção desse compromisso exige paciência e flexibilidade de todos os atores envolvidos. O campo da esquerda pode abdicar de ter uma candidatura própria à presidência da Casa em favor de um candidato do campo de Maia, mas não sem que alguns compromissos sejam feitos. Hoje, ao menos cinco compromissos estão na mesa para que essa aliança seja possível: (1) de que não haverá perseguição aos movimentos sociais nos próximos 2 anos; (2) de que privatizações não entrarão na agenda da Câmara; (3) contra a reforma administrativa; (4) de que não haverá preconceito contra a China no Leilão do 5G; (5) e em favor da criação do mecanismo das federações partidárias. Vejamos cada um deles.
O primeiro compromisso que o candidato da Frente Ampla na Câmara deverá ter é o de não abrir espaços para a perseguição aos movimentos sociais. Em seu mandato, Rodrigo Maia não permitiu que CPIs contra organizações da sociedade civil fossem abertas como a CPI da UNE. Também não permitiu que fosse aprovado o fim do monopólio das carteiras estudantis, o que seria um grave ataque contra o movimento estudantil. Esse compromisso precisa ser mantido para o próximo período.
O segundo compromisso é o de não permitir que sejam pautadas propostas de privatizações das grandes empresas públicas como Petrobras, Eletrobras, Correios etc. Por diversas vezes, o ministro da Economia Paulo Guedes reclamou publicamente que as privatizações não avançavam devido aos obstáculos encontrados no Congresso Nacional. Para a oposição de esquerda, é importante que esses obstáculos sejam mantidos.
O terceiro compromisso gira em torno da reforma administrativa. Essa reforma pode ser muito prejudicial para o funcionalismo público. Entre as medidas levantas pelo ministro Paulo Guedes estão o fim da estabilidade para os novos concursados, a demissão por mau desempenho e a redução salarial do funcionalismo público. A oposição de esquerda é assertiva na crítica desse projeto. Por isso considera importante que o candidato da Frente Ampla deva se comprometer em não colocar em votação a reforma administrativa.
A transparência no leilão da tecnologia 5G é o quarto grande compromisso que deve ser exigido pela oposição de esquerda. Esse leilão do 5G será uma das principais agendas do país em 2021. Disputado por grandes empresas dos Estados Unidos, da Europa e da China, a tecnologia 5G será o grande tema da geopolítica nos próximos anos. Contudo, o governo Bolsonaro parece já ter optado de forma discricionária por uma parceria com os Estados Unidos. Essa decisão, meramente ideológica, exclui a empresa chinesa Huawei de investir no Brasil. Algo que é péssimo para a soberania nacional, pois essa tecnologia chinesa é a que oferece os melhores benefícios ao país. Rodrigo Maia já criou um grupo de trabalho na Câmara, presidido pela deputada Perpétua Almeida (PCdoB), para acompanhar o leilão. O que se espera é que o candidato da Frente Ampla mantenha esse grupo em funcionamento e fiscalize o leilão para impedir que o preconceito ideológico exclua a empresa chinesa do 5G.
Por fim, o quinto compromisso é com uma mudança pontual na legislação eleitoral. A última reforma política liderada pelo ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB) aprovou medidas muito duras contra partidos “ideológicos” como a antidemocrática cláusula de barreira. Uma medida pontual que pode fortalecer programaticamente os partidos políticos é a criação das chamadas federações partidárias para já valer em 2022. Com as federações partidárias, os partidos passam a construir coligações mais próximas ideologicamente o que é pedagógico para o eleitor. E, assim, a sobrevivência dos pequenos partidos de esquerda é assegurada. Esse é um compromisso fundamental que se espera do candidato da Frente Ampla.
Em síntese, com esses cinco compromissos firmados publicamente e com transparência, é possível construir uma Frente Ampla em que a oposição de esquerda apoie uma candidatura do campo da direita e centro-direita que orbita em torno de Rodrigo Maia. Com essa aliança, o único derrotado será Jair Bolsonaro.
Theófilo Rodrigues é cientista político e pesquisador na UERJ