Publicamos abaixo a opinião de um observador atento das “tretas” políticas e partidárias que acontecem nas redes sociais. A opinião do colaborador não corresponde, necessariamente, à do blog.
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Por Frederico Krepe
Não é segredo para ninguém que a militância petista e a militância trabalhista estão em guerra desde 2018. Desde o momento em que Lula e o PT decidiram trabalhar para desarticular a candidatura de Ciro Gomes e que este começou a subir o tom nas críticas ao petismo, o que temos visto é uma guerra aberta no campo progressista, o que naturalmente desce para a militância de base, especialmente nas redes.
O segundo turno ensaiou uma espécie de união ao redor de algumas candidaturas, o que selou uma trégua temporária, que foi completamente abandonada com o fim das eleições municipais. O clima já não estava bom, mas parece que essa semana será marcada pela escalada nos conflitos. Esse texto é uma tentativa de entender essa escalada para desnudar seus possíveis motivos ocultos.
Assim que o segundo turno acabou, o clima de guerra foi reestabelecido por parte da blogosfera petista. Logo na segunda de manhã, Ciro Gomes deu uma entrevista ao programa do Datena na Rádio Bandeirantes onde fez uma série de apontamentos importantes sobre o resultado eleitoral. Na entrevista, fez alguns comentários sobre a derrota do bolsonarismo e do petismo, dizendo que o recado das urnas foi uma mensagem contra a polarização entre PT e Bolsonaro.
Ainda, elogiou a presença de Boulos no segundo turno em São Paulo, falando ser um fator positivo a emergência de uma esquerda mais radical que não precise explicar as contradições do petismo. Teceu também uma crítica a Flávio Dino, dizendo que saiu derrotado em seu estado e tem dificuldade em ler o recado das urnas, ao mencionar o voto com a camisa escrito “Lula livre”.
Imediatamente após a entrevista, a blogosfera petista entrou em polvorosa ao destacara que Ciro teria “atacado covardemente” Flávio Dino e “chamado Boulos de radical” em uma clara deturpação do que o trabalhista disse. A mensagem que tentavam passar era a de que Ciro estava implodindo a unidade dos progressistas ao fazer esses “ataques”. Inclusive, o próprio Flávio Dino repercutiu essa narrativa em suas redes.
Na mesma semana, ainda tivemos a blogosfera petista compartilhando de forma sincronizada uma denúncia policialesca de que o “braço direito” de Ciro Gomes seria alvo da Polícia Federal, tentando forçar uma ligação do Ciro com supostos atos ilícitos. Tivemos também o problema envolvendo a ocupação da sede do PDT no Ceará, onde algumas de conversas vazadas da Juventude do PDT de São Paulo comentando o caso serviram para uma denúncia sem pé nem cabeça de que “Dirigentes do PDT de São Paulo” estariam planejando ataques contra militantes do PCB.
De fato, muitas declarações lamentáveis foram ditas por militantes trabalhistas nas conversas, mas o que foi repercutido dava a entender que era algo institucionalmente atrelado à direção do PDT, o que não era verdade, já que a mesma repreendeu os integrantes do grupo e entrou com processo contra eles no conselho de ética do partido, inclusive dissolvendo a direção da Juventude Socialista do PDT de São Paulo.
Entretanto, a cereja do bolo foi a “bombástica revelação” de Renato Rovai e da Revista Fórum sobre um suposto “gabinete do ódio cirista”. Em que consistia esse tal “gabinete do ódio”? Rovai teve acesso a prints de um grupo público de militantes trabalhistas no Facebook onde as pessoas comentavam aleatoriedades, compartilhavam memes entre si e faziam chamadas para que os integrantes fossem defender o Ciro em comentários de postagens contrárias. A reportagem foi repercutida (também de forma sincronizada) por outros meios como o Diário do Centro do Mundo e o Brasil 247.
A narrativa era de que o Ciro e o PDT tinham um grupo de militantes, tal como o bolsonarismo, fazendo trabalho de propagação de ódio contra adversários na internet e eles tinham as provas. Entretanto, qualquer pessoa com um mínimo de bom senso sabe que não tem nada próximo ali de um gabinete do ódio. É importante frisar que o verdadeiro gabinete do ódio é um instrumento que se alimenta de recursos públicos para criar narrativas falsas sobre adversários políticos e se utiliza da estrutura presidencial para esse trabalho de criação e disseminação de fake news através de uma estrutura de disseminação em massa no WhatsApp e que também envolve perfis falsos no Twitter e Facebook.
O grupo em questão da militância trabalhista é simplesmente um grupo de voluntários que não chega nem perto do verdadeiro gabinete do ódio. Por esse motivo, Renato Rovai está fazendo escândalo nas suas redes, chegando a chamar o deputado André Figueiredo (PDT-CE) de “líder da gangue”, como se houvesse algum ato ilícito ou imoral sendo feito no grupo em questão com coordenação de André.
Dado o que foi apresentado, devemos nos perguntar o que está por trás dessa atitude extremamente raivosa e violenta contra a militância trabalhista. Algumas hipóteses são possíveis, mas a principal delas é a derrota nas eleições municipais e a guerra interna vivenciada pelo Partido dos Trabalhadores. Estes dois fatores podem nos ajudar a compreender porquê tamanha virulência, inclusive ultrapassando limites éticos, dirigida à militância e as lideranças trabalhistas.
Não é segredo para ninguém que o petismo foi um dos grandes derrotados da eleição municipal. O ano de 2016 mostrou uma expressiva queda eleitoral do partido, que foi ampliada pelas eleições em 2020. Essa derrota foi marcada por um número inferior a 200 prefeituras em todo o Brasil e nenhum governo de capital para os petistas.
É verdade que o partido teve algumas vitórias importantes no segundo turno, mas foram todas em cidades médias e por margens apertadas. Não é segredo para ninguém, inclusive para uma série de dirigentes, que o PT sofreu um duro baque. Logo após a derrota nas eleições, vimos uma série de declarações de figuras importantes do partido cobrando por renovação, mudança e autocrítica do partido para entender que decisões erradas contribuíram para sua derrocada. Inclusive, com forte pressão interna para que o congresso do partido seja adiantado, o que significaria encurtar o mandato da deputada Gleisi Hoffmann da presidência do partido. Qualquer consulta à imprensa mostra esse clima de guerra interna no PT entre aqueles que querem salvar o partido e aqueles que resistem à necessária mudança de rumos.
É justamente o elemento apontado acima como o fator essencial para explicar a virulência da blogosfera petista contra os trabalhistas. A verdade, que já não é mais possível esconder, é que o PT sofreu uma derrota muito violenta nas eleições e está processo de guerra interna pelo comando da sigla. Onde entra os ataques à militância trabalhista nesta equação? Ao apontar um inimigo externo como os trabalhistas e seu “gabinete do ódio”, a blogosfera petista adota uma tática desesperada para buscar uma certa coesão interna no PT, fazendo com que não passem mais a olhar para a derrota eleitoral, mas os “ataques” da militância trabalhista e de Ciro Gomes.
O PT sofre hoje um dilema existencial: se renova e abre espaço para novos dirigentes e uma nova linha política que considere o tamanho da rejeição e seus erros no processo político ou uma linha negacionista que negue os problemas e siga o caminho de sempre, correndo um grande risco de dissolução interna. Por isso a virulência nos ataques, para segurar as críticas ao desempenho eleitoral do PT, tanto externas, mas especialmente as internas. Quando Ciro Gomes e a militância trabalhista são vistos como “o grande mal a ser combatido”, fica mais fácil varrer os problemas para debaixo do tapete.
Penso ser importante destacar que essa briga entre o PDT e o PT não está sendo produtiva para a construção de um projeto para o país que supere a dependência econômica e o atraso e garanta uma vida digna e agradável para os trabalhadores do país. É importante que as lideranças de ambos os partidos reflitam sobre esse momento e não trabalhem para aumentar as tensões. Entretanto, há uma certa ingenuidade em achar que isso é uma mera disputa de egos.
A derrota eleitoral e o estado de guerra interna colocam sob xeque a hegemonia do PT entre os progressistas, especialmente depois da vitoriosa aliança entre PDT e PSB. O ideal seria um estado de convivência pacífica, mesmo abraçando projetos políticos diferentes, mas temos que tomar cuidado para não cairmos em uma certa postura ingênua que pensa que essa pacificação passa simplesmente por um processo de “trégua” entre Lula e Ciro, sem olhar para os determinantes políticos mais profundos dessa divisão.
Lincoln Collins Bortolin
09/12/2020 - 15h01
O bloco que se forma é
PT PC do B e PSOL
E
PDT PSB Rede …
O jogo é jogado
José de Souza
07/12/2020 - 11h47
Rovai não exagerou não. Ele simplesmente trooxe a tona uma prática da direita que o campo progressista abraçou, lamentavelmente. E que, se nada for feito pelas lideranças, vai se ampliar.
O PSB jogou sujo com a Marília Arraes também. Dentro do PT já tinha histórico disso também em outras oportunidades.
O fato é que o estilo destemperado do Ciro estimula esse comportamento nas bases.
E, lamentavelmente, não há qualquer indício de que isso vai arrefecer.
PT e Ciro (PDT é legenda de aluguel pra ele) não estarão juntos em 2022. Isso tá claro. O desafio é que não se ataquem, algo cada vez mais dificil.
Nordestino
07/12/2020 - 09h49
Adoraria ver o Ciro no segundo turno, implorando os votos petistas….em 2022..Vou logo avisando..Estarei viajando …kkkkk
Luiz Feitosa
07/12/2020 - 02h56
Seus comentárioscomo sempre, muito sensato, inteligentee abrangentes. Parabéns, vc faz um ótimotrabalho
Thiago Sanderson
06/12/2020 - 17h27
É importante ressaltar que militância pestista está se valendo dos mesmo “modus” da militância bolsonarista e fazendo uma campanha de desinformação, fazendo uma ginástica interpretativa de todas as falas do Ciro desde o fim do segundo turno. O blog 247 faz uma chamada dizendo que o Ciro foi para direita de vez e ele teria declarado que prefere o PSDB do que o PT na chapa, onde claramento o presidenciável do PDT diz: é mais fácil uma aliança com o PSDB do que com o PT. Qualquer pessoa que entende o mínimo de política entende o conteúdo por trás da frase, o PT nunca vai abrir mão de encabeçar uma chapa presidencial que ele faça parte, desde 1989 isso nunca aconteceu e não acontecerá agora.