Nesta sexta-feira, 4, o colunista da revista Época, Guilherme Amado, publicou 16 perguntas respondidas pelo vice-presidente Nacional do PDT, Ciro Gomes. Confira!
1. Fortaleza reuniu uma aliança de todas as forças políticas contra o candidato de Bolsonaro, o Capitão Wagner (PROS), que terminou derrotado pelo pedetista Sarto. Esse movimento mimetiza o que poderia ser uma frente ampla contra Bolsonaro em 2022?
É possível, mas não é provável. A característica de Fortaleza é muito peculiar, é uma cidade extremamente politizada, uma cidade rebelde. O PT aqui, apesar de o governador Camilo (Santana) ser nosso aliado, lançou candidato. E não participou do segundo turno. Só o PSDB, o DEM e o PSOL já estavam com a gente no primeiro turno.
2. No campo nacional, seria então mais viável uma aliança com o PSDB do que com o PT?
Sim, eu acho. O PSDB vai passar por um processo interno, que já está acontecendo, é muito silencioso, mas é uma disputa de hegemonia interna. Nas últimas declarações do Fernando Henrique, você percebe que ele está nesse projeto do Luciano Huck. O Tasso Jereissati não tem nenhum entusiasmo pelo Doria, o governador do Rio Grande do Sul (Eduardo Leite) também não, o (senador Antonio) Anastasia saiu do PSDB por causa disso e está no PSD.
3. Como juntar centro-esquerda e centro-direita no mesmo barco em 2022?
Este é o ponto. Não há coesão. Sob o ponto de vista de costumes, que é uma caracterização de direita e esquerda, é avassalador o voto conservador. Não tenho dúvidas de que o voto conservador, em matéria de costumes, prevaleceu sobre a agenda identitária dessa esquerda moderna, esquerda americanófila etc. Porém, sob o ponto de vista econômico, temos contradições tremendas, que hoje permitem que você veja uma fissura. Por exemplo, ao expor o agronegócio, que tende a ser um voto conservador, ao risco em mercados tão centrais, como a política ruinosa do Bolsonaro faz em relação ao nosso principal mercado, que é a China, você abre um flanco para esse voto. Quando você começa a ter restrições de importações dos produtos brasileiros em função do manejo trágico da função ambiental, você tem uma fração do agronegócio que está percebendo a necessidade de o Brasil ter outra conduta, mais moderna. Isso é o que nós vamos fazer. Eu estou vendo isso nesse grupo mais jovem do DEM, que é o Rodrigo Maia, o ACM Neto, com quem tenho conversado concretamente. A grande questão é saber se conseguimos afastar esse mundo produtivo de seu alinhamento instantâneo, automático e pouco crítico com o setor financeiro. Veremos se temos êxito ou não.
4. Há chance de uma candidatura se eleger em 2022 sem o apoio da centro-direita?
É difícil. Mas eu fico mesmo pensando se, em meu caso, eu quero, entendeu? Porque eu não tenho a menor vocação para demagogia, para populismos. Enfim, não tenho a menor. Portanto, eu vou, inclusive, como já fiz, fazer as promessas claras antes. Porque quero que minha eleição seja um plebiscito sobre as propostas que tenho para pôr em prática. Senão, posso me eleger por essas deficiências do presidencialismo, chegar lá e ser emparedado e não conseguir fazer nada num país falido. Isso eu não quero.
5. O senhor já disse que não precisaria, necessariamente, ser o nome dessa aliança. Mas tampouco tem o perfil de topar ser vice dos outros nomes em jogo.
Depende do projeto. Eu não preciso ser nada. Dependendo do projeto, eu carrego a pasta, vou distribuir panfleto… Mas quero um projeto. O lulapetismo não me responde, e esse bolsonarismo boçal e as tentativas de reciclar esse bolsonarismo boçal de forma mais, vamos dizer, Faria Lima de ser, isso também não me interessa.
6. O primeiro passo para uma aliança com a centro-direita é a disputa pela presidência da Câmara, em 2021?
Hoje, nós (oposição) somos 130 em 513 deputados. Então o máximo que podemos extrair de nossa presença, e isso exige coesão entre nós, antes de mais nada, é que a presidência da Câmara continue como o Rodrigo Maia tem feito exemplarmente, obrigando o Bolsonaro a jogar dentro dos limites da funcionalidade democrática e com o compromisso de nos ajudar a conter danos, nessa agenda antinacional, antipovo e antiprodução que o Bolsonaro representa. Qualquer candidato que seja indicado pelo Bolsonaro, nós vamos ficar contra.
7. O senhor é a favor da reeleição do Rodrigo Maia?
Acho que essa decisão esperta do Supremo, que tudo indica que vai acontecer, não lesiona a democracia. A ideia é que a Câmara decida, regimentalmente, se pode ou não pode fazer. Gosto muito do Rodrigo e digo a ele: “Rodrigo, você precisa abrir a cabeça para outros conselheiros econômicos. Vamos fazer uma conversa, eu e o Arminio Fraga, que você fica ouvindo o tempo todo, o Marcos Lisboa, esse povo aí que não está vendo nada da realidade”. O Arminio é até um pouco melhor, mas o Marcos Lisboa não enxerga um dedo na frente do nariz.
8. Em relação ao grupo de economistas, o senhor tem se reunido com os mesmos de sua campanha?
Eu falo com todo mundo. Estou até tentando achar uma hora para fazer uma discussão pública com o André Lara Resende, que desse mundo mais conservador, para mim, é o mais brilhante disparado. A minha tropa tem grandes luminares e pessoas a quem eu ouço. Dos mais antigos, o Bresser-Pereira e o Delfim Netto, o pessoal da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, o professor Nelson Marconi, que coordena uma equipe gigante. O Belluzzo, o Mauro Benevides Filho. O Mauro, além de ser intelectual, é um operador, conhece tudo de sistema tributário, foi secretário de Fazenda do Ceará há muitos anos, foi presidente do Confaz, enfim, é um cara que conhece tudo.
9. O senhor vê chance de haver aliança com outros partidos de esquerda no primeiro turno de 2022, além de PSB, PV e Rede, já citados como seus aliados?
Dentro do PT, hoje, há um problema grave que é a absoluta censura a qualquer discussão que não passe pela ideia do Lula ser o eterno presidente da República. O PT está definhando, isso não é bom para o país. Mas isso é um problema deles. O que não dá é para esperar mais que ele não faça sequer uma discussão. Não há discussão nem interna e muito menos com os outros parceiros.
10. Chegou a falar isso para o Lula no encontro com ele?
Falei com todos os esses e erres. Nós conversamos durante quatro horas. Uma conversa que gostei de ter porque não me agrada nunca interromper o diálogo, mas foi uma conversa absolutamente franca, falei tudo que eu falo em público e mais alguma coisa. Ele me ouviu e também disse o que queria dizer para mim. Percebemos ali que ele ficou muito isolado e estava cercado de puxa-sacos que fraudam a percepção das coisas para ele. Combinamos, inclusive, de nos tratarmos pessoalmente. Mas nosso fosso hoje é intransponível.
11. Em relação às críticas que o senhor tem feito ao PT, ele reconhece alguma necessidade de mudança?
Eu falei para ele tudo que penso, parte das coisas ele compreendeu e concordou, mas não posso devassar isso por um limite ético meu.
12. Como o senhor viu essa declaração do Jaques Wagner colocando-se como um possível nome para a disputa nacional?
Isso é sintomático dessa tensão que está lá dentro. O Jaques Wagner é um belo quadro, isso desde 2018. A questão básica é que a força dominante daquelas eleições, que parece não ter sido removida ainda do Brasil, é um antipetismo, parte justo e parte injusto. Uma força dominante revelada já nas eleições de 2016 quando Haddad tirou 16% dos votos, perdendo para nulo e branco. Em todos os extratos sociais, em todas as urnas eleitorais, perdeu. E inevitavelmente é ele que o Lula traz para ser o candidato do Brasil um ano e pouco depois.
13. Como ficou sua relação com o Flávio Dino depois de o senhor tê-lo atacado no segundo turno?
Eu sou muito amigo dele, mas considero que sua atitude foi muito errada no processo eleitoral. Errada em desfavor dele e de nossa causa. Nessas eleições, havia cinco candidatos no Maranhão. Três da base de sustentação do Flávio Dino, à qual nós pertencemos também, e ele não declarou apoio ou pelo menos não fez campanha para nenhum dos três. Os três ficaram fora do segundo turno. Aí foram para o segundo turno o cara do partido da Igreja Universal e o outro adversário dele, os dois. Aí ele resolve apoiar o cara da Igreja Universal, desse Republicanos? Não dá. Aí, o que acontece? Nós estávamos juntos no Recife. Quando ele declarou apoio ao João Campos, a petezada caiu matando no Dino. Eu saí em sua defesa. Isso na véspera do segundo turno. E aí o Flávio Dino vai votar no segundo turno com a camiseta Lula Livre?
14. Ele sonha em ser o candidato do Lula, não?
Já disse a ele: “Olha, essa enganação aí, já passei por ela quatro vezes”. O Lula chorando na presença de várias pessoas dizendo que devia tudo a mim, que eu tinha sido o cara mais leal do mundo e que naturalmente eu era o candidato. Falei: “Lula, você não tem condição de cumprir essa promessa, não precisa ficar dizendo isso, não. Estou fazendo pelas minhas convicções, pelo Brasil. Mas você não entrega essa promessa porque fora do PT não existe mundo para você”. Mas não é isso. O jogo do Lula é mais cretino, é filiar o Flávio Dino ao PSB para me tirar o PSB.
15. O PT o vê como o principal adversário para 2022?
Sem nenhuma dúvida.
16. Mais do que o próprio Bolsonaro?
Você acha que o Lula, com a experiência, a brilhante vocação política que tem, o extraordinário gênio político que ele é, não sabia que as eleições de 2018 estavam perdidas para o PT? Acha que ele acreditava que o… Bom, eu conheço a opinião dele sobre o Haddad, mas também estou interditado eticamente de dizer. Mas a pergunta é: Por que não deixar Jaques Wagner ser candidato, Tarso Genro ser candidato? Lançar alguém que teve 16% dos votos um ano antes? A grande questão é que o Lula não quer que surja nenhuma grande liderança dentro do PT. E eu não obedeço a isso. Acabou.