“Dentro do Evangelho há ainda muito para aprender, e nunca os seus preceitos tiveram tanta atualidade”
(Alberto Pasqualini, in “A Lei e As Mulheres”, Correio do Povo, 04 de julho de 1943)
Considerando que o cristianismo, em suas vertentes católica e protestante, é a religião da maioria do povo brasileiro e cimento social da nossa civilização, como na consagrada definição de Gilberto Freyre;
Considerando que o nosso país vive um momento singular em sua história, onde a religião, especialmente as religiões cristãs, estão sendo usadas como instrumento de poder político através do “voto de cajado”, ou seja, o voto conduzido pelos líderes religiosos;
Considerando que ideologias políticas estão sendo transformadas em posições teológicas por líderes cristãos, com o objetivo de obrigar o povo brasileiro que professa a fé cristã a se submeter a estas posições ideológicas;
Considerando ainda que a ampla maioria dessas posições ideológicas, vendidas como teologia bíblica, são todas no sentido de retirar direitos básicos dos trabalhadores, impedir a emancipação do povo brasileiro e aumentar a desigualdade com o incentivo do individualismo sobre a fraternidade e a solidariedade;
Considerando que o campo progressista, que sempre se colocou na defesa dos interesses do povo trabalhador, ao ser alçado ao poder, frustrou grande parte das expectativas das massas, mantendo o mesmo sistema tributário e a mesma subserviência ao rentismo e ao sistema financeiro mundial;
Considerando que a falta de um projeto nacional dos governos progressistas fez com que esses mesmos governos dessem ênfase aos debates transversais, como a defesa de identidades, debate este apartado do universalismo da luta dos trabalhadores pela sua emancipação;
Considerando que, como resultado da desorganização do campo progressista e de sua contribuição para que houvesse um afastamento das lutas justas das minorias, usou-se o confronto direto à fé do povo e com uma estratégia agressiva, não condizente com o caráter dessas populações que representam grupos excluídos da cidadania plena;
Considerando que a descrita estratégia trouxe como resultado um afastamento do povo brasileiro, majoritariamente de fé cristã, dos partidos e movimentos progressistas;
Considerando também que esse debate foi maliciosamente usado por políticos e líderes religiosos a fim de desviar a atenção do povo para as urgentes necessidades de nosso país, promovendo um duelo de costumes onde se misturou de forma insidiosa valores morais cristãos e política;
Considerando que essa mistura e esse debate odioso quebrou diversas pontes de diálogo que havia entre o campo progressista e os cristãos;
Considerando que o resultado de toda essa discórdia foi a enorme derrota de todo campo progressista nas eleições de 2018, onde nosso povo escolheu um projeto diametralmente oposto ao projeto do campo progressista, revelando que de fato existe uma ferida e rupturas abertas que precisam ser analisadas;
Considerando ainda que o resultado dessa derrota do campo progressista foi o aumento do acirramento no nosso povo e das divisões internas, com o incentivo e colaboração de interesses mercantilistas que querem que o Brasil continue como uma colônia governada por vassalos dos interesses econômicos estrangeiros;
Considerando a necessidade de reconstruir as pontes com a ampla maioria cristã de nosso país a fim de reduzir a divisão odiosa existente que irá condenar todo nosso povo à miséria, a fim de sermos mão de obra barata para as multinacionais e eterno exportador de produtos de baixo valor agregado;
Considerando que a reconstrução dessas pontes passa pelo diálogo, por saber ouvir e compreender a linguagem e a fé do brasileiro cristão;
Considerando ainda que os cristãos que frequentam as mesmas igrejas, paróquias, comunidades e células de outros cristãos são os melhores atores para iniciar esse diálogo franco, aberto, humilde e fraterno.
Nós, cristãos, que confessamos o Credo Niceno-Constantinopolitano e que estamos em consonância com a ideologia política trabalhista, nos reunimos em um movimento, doravante denominado de Cristãos Trabalhistas, e nos manifestamos, firmes no Estado Democrático de Direito, na Constituição Federal e nos princípios do trabalhismo previstos no estatuto do PDT, nos seguintes termos:
- Acreditamos e afirmamos nossa crença em um único Deus, Criador e Senhor do mundo, que fez os homens à Sua imagem e semelhança. Por ser a humanidade a imagem e semelhança desse Criador, entendemos o valor da vida humana, sua dignidade e que todo nosso esforço nesta terra deve ser voltado para a solidariedade, compaixão e fraternidade para com todos os seres humanos, independente de raça, gênero, idade, crença ou opção política.
- Apesar de acreditarmos firmemente nesse Deus Único e Criador, entendemos que a nossa fé é resultante de uma escolha individual, pessoal, livre e consciente e que JAMAIS essa fé deve ser imposta a qualquer outro ser humano, sendo este livre para crer ou não crer naquilo que quiser.
- Por isso, defendemos com todas as nossas forças um estado laico, onde todas as religiões, crenças e ausência de crenças sejam protegidas, respeitadas bem como seus lugares de culto sejam resguardados contra toda a forma de violência, ataques, discriminação e vilipêndio. Nesse sentido, defendemos que a fé faz parte da cultura e tradição do povo brasileiro e seu exercício público deve ser, por estes motivos, protegidos pelo estado como patrimônio imaterial do povo brasileiro.
- O valor humanitário básico, extraído das Sagradas Escrituras, a Bíblia, é o que norteia nossa luta para que todo ser humano tenha direito e acesso a uma vida digna nesta terra, com acesso à água, saneamento, educação, saúde, trabalho digno com remuneração que lhe proporcione vida digna e confortável, transporte, segurança, moradia e terra para cultivar e poder sustentar sua família.
- Ainda no mesmo sentido do valor humanitário básico extraído das Escrituras, nos solidarizamos com a luta de todos os trabalhadores por condições dignas de trabalho, remuneração justa, direitos consolidados em lei, proteção do Estado para garantia desses direitos e aposentadoria justa e em idade que possa ser gozada de maneira plena e feliz.
- Também nos solidarizamos da mesma forma com a luta dos negros contra o racismo e a desigualdade histórica a que foram submetidos em virtude da escravidão promovida e protegida pelo Estado por três séculos, devendo este mesmo Estado, compensar esta iniquidade com políticas emancipatórias para os negros.
- De igual forma, nos unimos pelo mesmo sentimento cristão, com os povos indígenas pelo seu sagrado direito à terra, às demarcações estatais que protejam esses povos a fim de que exerçam sua cultura de maneira livre.
- Nossa solidariedade e fraternidade também alcançam com igual força e amor toda a população brasileira LBTQI+ em sua luta pelo exercício de plena cidadania e contra toda a forma de discriminação, violência, ódio e preconceito, bem como para com as mulheres em sua constante luta por emancipação, remuneração igualitária, defesa contra a violência doméstica e políticas de segurança que previnam o feminicídio.
- Entendemos que a exploração do trabalho, a desigualdade social promovida pelo sistema capitalista sem freios e contrapesos estatais, o individualismo, o consumismo como valor e medida de felicidade são valores antagônicos aos valores cristãos extraídos das Sagradas Escrituras, particularmente do Novo Testamento que exorta a todos para que sejam solidários, empáticos, revelando um Deus que se indigna com a injustiça dos patrões para com os trabalhadores (Tiago 5:4).
- Acreditamos, como cristãos que somos, que o melhor caminho político é o da moderação e por isso, rechaçamos quaisquer movimentos de ruptura da ordem democrática vigente, bem como os movimentos revolucionários de qualquer vertente ideológica. Acreditamos que as mudanças devem ocorrer dentro da ordem democrática e que toda luta por direitos não deve ser violenta a ponto de causar dor e sofrimento a outros seres humanos, independente de sua ideologia.
- Por isso, defendemos o trabalhismo, tal qual proposto e praticado por Alberto Pasqualini, Santiago Dantas, João Goulart, Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, que tem sua presente continuidade histórica no Projeto Nacional de Desenvolvimento preconizado por Ciro Gomes, Mangabeira Unger e outros formuladores, pois representa um projeto reformista, sem rupturas, que defende distribuição de renda através de uma política tributária progressiva, medidas compensatórias, emancipação dos trabalhadores e a soberania da nação brasileira, ao mesmo tempo protegendo os valores da democracia, as liberdades individuais de crença e ideologia, a propriedade privada e a livre iniciativa, com o reconhecimento pleno dos direitos de todas as minorias, inseridas em um único e generoso projeto de Nação.
- O Evangelho (‘Boa Nova”) que professamos, não é uma mensagem reacionária; antes, pelo contrário, é um convite permanente a trazer para o hoje a realidade do Reino de Deus, promovendo justiça, fraternidade e igualdade para todos os Filhos de Deus. Queremos caminhar construindo essa nova realidade com o legado dos profetas bíblicos, a serenidade sacrificial de Nosso Senhor, o exemplo de mártires e testemunhas como Dom Pedro Casalgálida, Missionário Manoel de Melo, Doutor Martin Luther King, Dom Desmond Tutu e Dietrich Bonhoeffer e nos proclamamos, nesta jornada, irmãos de Abdias Nascimento, Darcy Ribeiro, Mário Juruna, palmilhando a jornada soberanista de Vargas e os caminhos democráticos do estadista educado por um pastor metodista, Leonel de Moura Brizola.
Que Deus possa abençoar nossa nação, guiar nossos passos e iluminar o nosso entendimento para que sigamos em conformidade com todas as intenções descritas nesse manifesto.
Brasília, 11 de agosto de 2020
Subscrevem e apoiam esse movimento 771 brasileiros filiados ao PDT.
Guilherme
14/08/2020 - 01h43
Impecável!
Como me filio?
Tem como fazer slides dos 12 pontos para colocar nos stories d ajudar a divulgar???
Um pouco de ânimo pra quem viu sua igreja amada afundando na lama do farisaísmo mais reacionário.
Paulo
13/08/2020 - 19h51
E o aborto, como fica? E a ideologia de gênero? E as chamadas políticas de discriminação positiva, serão aceitas? E a adoção de crianças por pais gays? A situação é muito mais complexa. E o manifesto corre o risco de propor uma espécie de nova Teologia da Libertação. Ainda bem que não falaram de Boff…