O debate sobre a reforma tributária vem tomando os rumos esperados em um governo de direita. A ideia é manter a pequena porcentagem de brasileiros ricos intocada enquanto se aumenta a arrecadação por meio de impostos que pesam muito mais no bolso da classe média e dos pobres.
Esta matéria da Folha apresenta um bom resumo do que está em disputa. Sim, há disputa, porque associações de auditores questionam as propostas do governo e apresentam outras, as quais visam o estabelecimento de um sistema tributário mais progressivo em nosso país.Trecho da matéria: “No Brasil, segundo os autores [da proposta], renda e patrimônio respondem por 23% da arrecadação, ante 40% na média dos países da OCDE (organização que reúne as economias mais desenvolvidas). Na tributação do consumo, que afeta proporcionalmente mais os mais pobres, os percentuais são de 50% no Brasil e 32% na média da OCDE.”
Como se vê, a distribuição injusta da carga tributária é um dos fatores cruciais para a manutenção da pornográfica desigualdade social brasileira.
Pois neste ponto da manutenção da desigualdade há uma convergência notável entre a agenda do governo fascistoide de Jair Bolsonaro e a agenda dos demais setores da direita, os quais formam, em conjunto, uma esmagadora maioria no Congresso Nacional.
Dada a centralidade da questão tributária na longeva luta por vida digna que permeia a história do povo brasileiro (luta que deverá se acentuar no próximo período), me parece necessária uma articulação mais substancial entre os partidos, movimentos e pessoas à esquerda do espectro político.
A união dos partidos progressistas, improvável nas próximas eleições, vem ocorrendo em questões pontuais, como determinadas votações no Congresso ou o movimento Janelas pela Democracia, que contou com a adesão de PDT, PSB, PT, PCdoB, PSOL, PV, Rede Sustentabilidade e Cidadania.
Por que não trabalhar conjuntamente no debate sobre a reforma tributária? Esta é uma questão decisiva demais para que não se busque uma convergência de forças.
Quem sabe um calendário unificado, com lives (debates, seminários, palestras), atos, pressão organizada sobre parlamentares, divulgação conjunta e ágil da tramitação das propostas de reforma… Lembremos que a articulação e a ação da oposição (em sentido amplo, desde a institucional até os movimentos sociais, sindicatos e militantes) foram fundamentais para que a reforma da Previdência fosse barrada durante o governo Temer.
Bolsonaro conseguiu aprová-la, o que indica que podemos tirar lições dos erros que cometemos aqui, bem como aproveitar os ensinamentos dos acertos anteriores.
A batalha que se apresenta agora é, repito, fundamental. A pauta da reforma tributária é ainda melhor para uma luta vitoriosa: é difícil defender publicamente que não se deve taxar mais os ricos do que os pobres.
Apesar de vivermos um período duro, ou justamente por conta disso, é preciso dedicar máximo esforço a esta tarefa. No pior dos casos, caso seja aprovada uma reforma boa para os ricos e péssima para os pobres, podemos colar a imagem da direita “limpinha” ao genocida que está na presidência. Saber usar os talheres não será suficiente para desvincular esta direita mais tradicional da brutalidade assassina de Jair Bolsonaro. Entrarão para a história como os liberais na economia e genocidas nos costumes.
No melhor dos cenários, a pressão popular organizada pode fazer com que uma proposta minimamente justa seja aprovada pelo Congresso. Seria uma vitória digna de epopeia nestes tempos dantescos.
À luta.