Ações de Bolsonaro contra a pandemia são reprovadas por 66% dos paulistanos

Antes eu gostaria de fazer uma introdução, com números das últimas eleições presidenciais em São Paulo, capital.

Se quiser pular diretamente para a matéria que trata da pesquisa sobre o que os paulistanos pensam de Bolsonaro, role o post para depois das imagens.

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Nas eleições de 2018, Bolsonaro obteve 44% das intenções de voto no município de São Paulo no 1º turno, e 60% no segundo.

O voto em Bolsonaro é muito concentrado nas áreas ricas do centro; nessa região, o único enclave um pouco mais de esquerda é a 1ª zona eleitoral, de Bela Vista, onde fica o Bexiga.

Vale a pena olhar esse trecho de um estudo do Labcidade sobre os votos em São Paulo, no 1º turno.

Trecho do estudo sobre o voto em Bolsonaro na capital paulista: “A concentração dos percentuais maiores de votos em Bolsonaro se deu, como algumas análises já vêm apontando, nas regiões que concentram maiores percentuais de famílias de renda mais alta. Assim, era de esperar que as regiões que tradicionalmente abrigam este grupo social, no eixo denominado pelos urbanistas de “quadrante sudoeste”, composto por bairros como Jardim Paulista e Morumbi, assim como na região dos condomínios de Alphaville, o candidato teve votação expressiva.

Entretanto, o mapa revela o surgimento de novos elementos nesta geografia eleitoral com uma altíssima concentração de votos no candidato do PSL distantes em áreas distintas do tradicional “quadrante sudoeste”. Destacamos, na Zona Leste de São Paulo, Tatuapé, Carrão, Vila Formosa, Água Rasa, Mooca, Vila Prudente e Vila Matilde; na Zona Oeste, a Vila Leopoldina; na Zona Norte, Santana e Tremembé; e, em municípios da região metropolitana, destacam-se as áreas centrais e de maior renda de Guarulhos, Santo André, São Bernardo, São Caetano e Osasco.

O que essas regiões têm em comum? Foi nestes bairros em que, ao longo das últimas duas décadas, se instalou uma nova classe média alta da metrópole, em um processo de reconfiguração territorial que já vinha acontecendo desde o final dos anos 1990, mas que se intensificou especialmente com o boom imobiliário de 2006. Nessas regiões, uma explosão de condomínios verticais com disponibilidade de serviços e lazer internos aos complexos de torres, transformou a paisagem econômica, política e cultural de bairros que já foram tradicionalmente bairros operários.”

Trecho do estudo sobre o voto em Haddad: “Fernando Haddad, por sua vez, teve o melhor desempenho nos extremos da metrópole, ou nos termos do Prof. Eduardo Marques, na “hiperperiferia”. Esses territórios são marcados por processos de autoconstrução em diferentes graus de consolidação e por novas ocupações e loteamentos irregulares. É onde se situa hoje a frente de expansão de moradia de menor renda de São Paulo, marcada por precariedades materiais e situações de deslocamentos permanentes, fruto de altas nos preços de aluguel e de despejos e remoções. No mapa acima, é possível identificar um arco no sul/sudeste do município de São Paulo, composto pelos distritos de Vila Andrade (correspondente à favela de Paraisópolis), Capão Redondo, Jardim São Luís, Jardim Ângela, Parelheiros, Grajaú e Sacomã (correspondente à favela de Heliópolis); além das periferias de Osasco, Guarulhos e do ABC. Importante chamar atenção ainda para a presença dos melhores percentuais de Haddad em regiões do centro de São Paulo, também marcadas pela presença de territórios populares.

Chama a atenção a grande coincidência eleitoral desses territórios com as regiões que concentraram os maiores percentuais de votos brancos e nulos da metrópole, acrescentando-se, neste caso, uma grande franja no extremo leste da capital em distritos como Itaim Paulista e Jardim Helena. Esse fenômeno provavelmente se deve à insatisfação e negação da política exatamente aonde a presença de políticas públicas se dá, sobretudo, através da ação da polícia e muito menos em ações de acolhimento e qualificação.”

Trecho do estudo sobre o voto em Ciro: “Finalmente, a geografia dos maiores percentuais do voto em Ciro Gomes é bem clara. Seus votos estão concentrados em bairros residenciais centrais entorno do centro novo da capital. Os bairros de Santa Cecília, Bela Vista e Consolação são regiões que passam atualmente por um processo de transformação e crescimento de população moradora de classe média, concentrando cada vez mais uma população jovem, principalmente universitários e profissionais das artes e da cultura, que retomaram a moradia em bairros centrais. Essa mesma população também marca presença em Vila Madalena, Pinheiros e Butantã.”

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Os números acima mostram que o eleitor de Bolsonaro residia nos bairros nobres, onde há uma população mais escolarizada.

Entretanto, os delírios de Bolsonaro durante a pandemia não estão agradando os paulistanos.

Pesquisa Ibope divulgada há pouco (íntegra aqui) mostra que 66% dos paulistanos consideram que as ações de Bolsonaro no combate ao coronavírus tem sido “inadequadas”. Apenas 21% consideram “adequadas”.

E o problema do paulistano não é com a classe política de maneira geral.  Outras autoridades, como o prefeito, o governador, o congresso nacional, os vereadores, o ministro da saúde, tem avaliações bastante superiores a do presidente da república.

O problema do paulistano é com Bolsonaro, em particular.

Quando olhamos as tabelas segmentadas da pesquisa (clique nas imagens para ampliar), fica bem claro que a rejeição ao presidente é ainda mais forte justamente nas regiões e nas famílias onde o voto em Bolsonaro foi mais forte. No zona central do município, por exemplo, 77% consideram as ações do presidente “inadequadas”.

O segmento onde as ações de Bolsonaro na crise do coronavírus são melhor avaliados é o eleitor evangélico; mesmo aí, porém, Bolsonaro é reprovado por 51%, contra 28% de aprovação ao desempenho no combate ao Covid.

Entre católicos, Bolsonaro é rejeitado por 73%.

Na divisão por escolaridade, chama atenção a rejeição de 77% às ações de Bolsonaro na pandemia, junto aos eleitores com ensino superior, e de 59% junto aos eleitores com ensino médio.

Na divisão por idade, o segmento que mais rejeita Bolsonaro é o que está na faixa etária entre 35 e 44 anos, entre os quais o presidente é reprovado por 78%.

Na divisão por renda, Bolsonaro é reprovado sobretudo pelas classes A e B, entre as quais 73% rejeitam seu desempenho na pandemia.

Conclusão: ao mesmo tempo que a pandemia vem fazendo com que outras autoridades experimentem uma recuperação vigorosa de seu prestígio junto ao eleitor, Bolsonaro segue no caminho inverso, perdendo cada vez mais capital político. E o estrago na popularidade de Bolsonaro está avançando mais rápido onde mais dói: nos bairros, nas famílias e nas faixas etárias onde ele obteve mais votos nas eleições de 2018.

Um paulistano de classe média, com idade entre 35 e 44 anos, com ensino superior, tem potencial para fazer um grande estrago na reputação de um político. Esse tem sido o perfil onde Bolsonaro tem mais perdido popularidade.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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