Os bolsonaristas estão espalhando uma nova fake news por aí, na qual comparam as mortes somadas por Covid-19 em seis países europeus duramente atingidos (Itália, Espanha, França, Portugal, Suíça e Bélgica), com as mortes totais no Brasil, até agora.
As imagens, que vem sendo espalhadas por grupos de Zap, são essas. Volto em seguida.
Fui até um centro internacional de monitoramento da evolução do Covid, o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC), baixei os números atualizados, para analisar mais essa manipulação.
A população somada dos seis países em questão totaliza, de fato, 204 milhões de pessoas, contra 209 milhões no Brasil.
Nesse conjunto de países, morreram 102,9 mil pessoas, ao passo que, até o momento, o Brasil registrou 35,93 mil óbitos.
Até aqui, a propaganda bolsonarista está correta. A Fake News vem na interpretação completamente esquizofrênica desses números.
Em primeiro lugar, esses números não são tranquilizadores.
Muito ao contrário, são extremamente preocupantes!
Se este conjunto de seis países registrou um número de óbitos por Covid-19 tão alto, mesmo tendo praticado os mais severos níveis de isolamento social, possuindo sofisticados sistemas públicos de saúde, e com uma população não vivendo, como no Brasil, em favelas e comunidades altamente deficitárias em termos de saneamento básico, o que esperar do Brasil?
As previsões para o Brasil, ainda conservadoras, são de um número de mortos próximo a 100 mil, dentro de alguns meses.
Além disso, é preciso olhar para a evolução dos óbitos a partir dos primeiros casos fatais.
O Covid entrou primeiro na Europa. Ela está cerca de 30 dias à nossa frente.
A comparação mostra como o Brasil conseguiu reduzir a inclinação da curva de óbitos em função das medidas de isolamento social.
A curva de óbitos diários no conjunto de seis países atingiu o ápice no dia 38 a partir da décima morte. No Brasil, nessa mesma época da evolução do Covid, a quantidade de mortes era bem menor.
Nossa curva poderia ter atingido a inclinação vista na Europa não fossem as medidas preventivas de governadores e prefeitos, que decidiram – graças a Deus – não ouvir as manifestações delirantes do presidente da república.
Entretanto, em função de um isolamento que tem sido insistentemente boicotado pelo governo federal, além das dificuldades inerentes a um país pobre, o gráfico também mostra que, enquanto a curva de óbitos na Europa atinge, no início do segundo mês de pandemia, cerca de 1.000 fatalidades diárias, e começa a cair rapidamente, no Brasil, no mesmo período, atingimos mil mortes por dia e estamos observando uma curva ascendente.
O delírio maior, no entanto, é fazer uma comparação com os países mais desgraçados pelo coronavírus do mundo (inclusive por não terem levado a sério a pandemia em seus estágios iniciais, como Itália e Espanha), que registraram os maiores números de mortes por milhão de habitantes, ao invés de adotarmos, como modelo, países que foram mais bem sucedidos do que esses, como a Alemanha, a Coreia do Sul, a Nova Zelândia, a China.
Fazendo uma comparação do Brasil com alguns dos países mais populosos, dentre o grupo dos seis, a situação também é preocupante. Enquanto os outros países conseguiram reduzir drasticamente o número de mortes atribuídas a Covid por milhão de habitantes, no Braisl este número continua crescendo, embora pareça ter se estabilizado nos últimos dias.
Há ainda um outro dado fundamental que prejudica profundamente qualquer comparativo entre o Brasil e a Europa: a nossa quantidade de testes por milhão de habitantes é irrisória em relação aos países mais avançados. Com isso, o Brasil está exposto a uma brutal subnotificação, ou seja, muita gente pode estar morrendo de Covid mas sem entrar nas estatísticas.