A era da ditadura da delação parece estar se esvaindo, à força de muita crítica contra o risco de abusos e injustiças.
É bom saber que, apesar de tudo, a Terra gira e, em meio a tanto caos, arbítrio, violências, algumas coisas ainda continuam a avançar.
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COLABORAÇÃO PREMIADA
Com base na lei “anticrime”, TRF-3 rejeita denúncia contra Lula e Frei Chico
18 de maio de 2020, 18h54
Por Tiago Angelo
Conjur — O recebimento da denúncia não pode ser feito apenas com base na palavra do colaborador. Com esse entendimento, a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região rejeitou denúncia contra o ex-presidente Lula e seu irmão, José Ferreira da Silva, o Frei Chico. A decisão unânime foi proferida nesta segunda-feira (18/5).
Lula e Frei Chico foram acusados pelo Ministério Público Federal de terem recebido propina da construtora Odebrecht. Os valores totalizaram mais de R$ 1 milhão.
No entanto, para o desembargador Paulo Gustavo Guedes Fontes, relator do caso, os depoimentos concedidos pelos colaboradores Alexandrino Alencar, Emílio Odebrecht e Marcelo Odebrecht são vagos.
O magistrado argumentou que a “lei anticrime” (Lei 13.964/19) alterou o artigo 4º, parágrafo 16, da Lei 12.850/13. Assim, o recebimento da denúncia apenas com base no que dizem os delatores passa a ser vedado.
Com a decisão, o TRF-3 mantém o entendimento do juiz Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo. Em setembro de 2019, ele rejeitou a denúncia argumentando que faltavam os elementos legais exigidos para configuração de crime. Ainda para o magistrado, não havia justa causa — indícios de materialidade delitiva e de autoria — para abertura de ação penal.
“Nada, absolutamente nada existe nos autos no sentido de que Lula, a partir de outubro de 2002 pós-eleição foi consultado, pediu, acenou, insinuou ou de qualquer forma anuiu ou teve ciência dos subsequentes pagamentos feitos a seu irmão em forma de ‘mesada’. A denúncia não descreve nem mesmo alguma conduta humana praticada pelo agente público passível de subsunção ao tipo penal”, escreveu o magistrado na decisão.
Ordem das alegações
Em sua sustentação nesta segunda, o próprio colaborador Emílio Odebrecht admitiu não ter conhecimento sobre os fatos narrados na denúncia do Ministério Público Federal.
Cristiano Zanin, responsável pela defesa de Lula, pediu para se pronunciar por último, solicitação que foi deferida pela 5ª Turma do TRF-3.
“Eles [Lula e Frei Chico] foram alvo de uma imaginação, de uma criação do MPF. Lamentavelmente, em um cenário de perseguição, que já foi colocado aqui pelo meu colega da defesa do Frei Chico. Foi apresentada uma denúncia, coincidentemente, em um momento em que a imprensa revelava que a ‘lava jato’ havia omitido provas no Supremo Tribunal Federal”, afirmou Zanin em sua sustentação.
O advogado faz referência a uma reportagem feita pelo site The Intercept, em parceria com a Folha de S. Paulo, que revelou que, embora o ex-juiz Sergio Moro tivesse divulgado conversas entre Lula e Dilma, outros diálogos foram mantidos sob sigilo.
Depois da sessão, Zanin afirmou em nota que a decisão do TRF-3 “é pedagógica”, pois, tal como o entendimento de primeiro grau, “rejeitou sumariamente, por ausência de suporte probatório mínimo, uma acusação absurda contra o ex-presidente Lula, feita pela força-tarefa da ‘lava jato’ de São Paulo”.
“A decisão do TRF-3 prestigia o devido processo legal, reforça a inocência de Lula e a excepcionalidade dos processos contra o ex-presidente conduzidos a partir da 13º Vara Federal de Curitiba. É mais uma vitória de Lula na Justiça que mostra a necessidade de ser julgado o habeas corpus que aponta a suspeição do ex-juiz Sergio Moro e a declaração da nulidade de todos os processos que ele tenha atuado contra Lula.”, diz.
0008455-20.2017.4.03.6181
Tiago Angelo é repórter da revista Consultor Jurídico.