Entrevista de Freixo ao Globo, onde ele explica porque desistiu de sua candidatura à prefeitura do Rio.
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Por que o senhor está desistindo de ser candidato à prefeitura?
Não é uma notícia que dou com alegria. É uma decisão em formato de gesto, mais do que de palavras. É doído, mas é preciso que a gente sacuda um pouco esse processo para tentar a construção de um projeto no Brasil. Estou fazendo isso em nome de algo que é maior do que qualquer coisa. Considero o governo Bolsonaro uma ameaça à democracia. E por que tanta gente competente está assistindo a um incompetente no poder? Algum erro todos nós cometemos e estou me incluindo. Estou tendo um gesto de chamar para a unidade. No Rio, coloquei minha candidatura, que era supostamente natural. Tive muito apoio de imediato do PT, de quem não tenho uma vírgula para falar. No Rio, não houve nenhuma crise de hegemonismo do PT do qual ele é acusado em outros lugares. Também estava tendo diálogo com o PCdo B. Mas o PDT não aceitou essa composição, mesmo com muito diálogo com o (Carlos) Lupi. Mas, ele entende que o PDT tem que lançar candidato porque tem projeto para 2022. O PSB sequer quis fazer reunião, mesmo eu tendo solicitado inúmeras vezes.
Há alguma chance de voltar atrás na decisão?
Não. Não faz sentido. Repetiríamos uma situação como em 2016 e não vejo cabimento, diante de uma ameaça fascista e de um governo autoritário como o do Bolsonaro, nós nos comportarmos como sempre nos comportamos: divididos e fragilizados. Se é para isso, eu, antes de pedir para alguém tomar esse gesto, tomo uma atitude.
O medo de sair da eleição menor do que entrou pesa na decisão?
Não. Quando disputei 2012, quem acreditava que eu chegaria a 28%? Fui para 2016 no pior momento para ser candidato pela esquerda, que era o momento do golpe. É importante que eu tome essa decisão agora, em que as pesquisas apontam chance de irmos para o segundo turno. Mas, ir para o segundo turno com a esquerda dividida? Para quê? Vamos tentar ganhar o Rio, mas vamos perder o Brasil e a democracia, com o campo democrático se enfrentando e se engolindo, correndo o risco de não ter eleição em 2022.
Por que a dificuldade de união da esquerda?
O Bolsonaro é tosco, violento e autoritário. Para derrotar o bolsonarismo é preciso mais que responder as crises que ele provoca. Tem que ir além. Temos que vencê-lo com um projeto que seja melhor que o dele. Qual é o nosso projeto? E aí acho que o desafio que está colocado é construir uma proposta calcada no combate à desigualdade e na garantia de direitos. Temos que retomar a Constituição de 1988. Precisamos de um projeto que não seja meu, do (Fernando) Haddad, do Ciro (Gomes), de quem for. Estou pedindo uma unidade tanto no Rio quanto em outros lugres. Vou dar um exemplo: acho importante apoiar a Manuela D’Ávila em Porto Alegre. É uma candidata compatível com o que estamos debatendo e não tem unidade lá também. Em Pernambuco, a gente teve uma situação delicadíssima e não podemos correr o risco de perder nenhuma capital do Nordeste.
Acha que tem partidos da esquerda que não veem essa ameaça que o senhor fala?
Acho que até vê, mas entre ver e fazer uma coisa que seja mais coletiva vai uma distância. Dou o exemplo do impeachment. Quantos projetos de impeachment tem na casa? Mais de 20. Por que não conseguimos construir um projeto de impeachment coletivo, sociedade civil e partidos? Porque ficou um correndo na frente do outro para ver quem dá mais entrevista. Fica um querendo dizer que é mais contra Bolsonaro que o outro.
Tem uma disputa de ego na esquerda então?
É mais do que de ego, é uma disputa de espaço ali, só que não vai ter vitorioso de pedaço. A gente precisa ter maturidade. Muitas vezes conseguimos no Congresso. Mas a maturidade precisa sair dessas relações congressuais para as relações estratégicas de disputas eleitorais nas cidades. Não pode as pessoas se matarem nessas disputas. É muito ruim. Tenho muito respeito pelas diferenças. As diferenças que existem entre o PT e o PDT, eu respeito. Mas, não é possível que o tamanho dessas diferenças sejam maiores do que a ameaça do fascismo.
O senhor citaria algum exemplo específico dessa diferença?
Existe um conflito entre o PT e o PDT. Esse conflito tem uma razão de ser e um histórico. Mas, seja qual for esse conflito, ele não é maior do que a ameaça que o bolsonarismo coloca sobre todos nós.
A origem desse confronto entre PT e PDT não foi a insistência na candidatura do Lula em 2018?
No entendimento do PDT, sim. No do PT, não.
E no entendimento do senhor?
Todos deveriam estar juntos no projeto para derrotar o Bolsonaro. Não tem cabimento nesse momento ataque entre nós. Não tem nenhum sentido, diante do risco à democracia, um conflito nesse ponto.
O Lula ajuda ou atrapalha nessa unidade?
O Lula, quando ganha a liberdade, sai numa ofensiva de rua. Vem a pandemia e ele perde muito espaço. Nas redes sociais, Lula não é o mesmo que num palanque. Ele tem uma capacidade de dialogar com o povo pobre desse país que talvez só o Bolsonaro tenha neste momento. Não acho que o Lula seja uma força que atrapalha essa unidade. Ele pode ajudar muito. Se ele tiver o mesmo entendimento da necessidade de unidade, acho que ajuda muito. Com todas as criticas que se possa ter ao PT, aos erros e acertos, não vamos construir um campo capaz de derrotar o bolsonarismo sem eles.
O senhor admite aliança do PSOL com partidos de centro ou outras siglas?
Aliança eleitoral, não vejo essa possibilidade. Mas, não estou falando só de aliança eleitoral. Dou um exemplo. Éramos minoria no debate sobre o pacote anticrime. No Congresso, fizemos um trabalho de aliança com partidos de centro-direita. Tivemos uma grande articulação democrática e derrotamos propostas como o plea bargain, o excludente de ilicitude e pontos centrais que piorariam a segurança pública. Esse é um tipo de aliança com outros partidos que pode acontecer, sim.
O senhor poderia apoiar Eduardo Paes no Rio contra um candidato do Bolsonaro?
Num segundo turno contra o Crivella, sim. Já fiz isso contra o Witzel. Tenho grandeza democrática. Agora, dependendo do que o Eduardo Paes faça na campanha, porque ele também adora namorar o fascismo. Ele já fez muita coisa errada na vida e sabe disso mais do que eu, inclusive. Mas vou defender quem represente a vitória contra o bolsonarismo.