Carlos Eduardo Martins: o fascismo de Bolsonaro

SOBRE FASCISMO, PROTO-FASCISMO E A AMEAÇA QUE PAIRA SOBRE O BRASIL

Por Carlos Eduardo Martins

1) Bolsonaro nunca foi proto-fascista, mas sim um fascista inconformado com a transição democrática para um regime liberal;

2) Protofascista foi o Golpe de 2016, que trouxe os germes do que esta ai. O bolsonarismo sempre foi fascista e, desde 2017, tornou-se um projeto internacionalmente articulado de superação do regime liberal por um totalitário a serviço do imperialismo estadunidense e seus interesses no Cone Sul;

3) O fascismo não se define pela sua base de massas, mas por sua forma final que é o regime totalitário. Este impõe uma centralização política extrema que prescinde de uma lógica plebiscitaria ou do ativismo das massas. Na Alemanha nazista isto implicou a destruição da Republica de Weimar e das SA, tropa de assalto do nazismo, com conteúdo pequeno-burgues e popular. A base de massas joga um papel importante na primeira etapa de desenvolvimento do fascismo, seja para acumular forças e romper com regime político liberal ou para combater os avancos democraticos e socialistas através da guerra civil;

4) O que temos no Brasil, neste momento, é justamente o risco de transição para um regime totalitário, exatamente porque bolsonarismo vê sua base de massas ameacada pela depressão econômica e a profunda desorganizacao social, resultado da combinação entre a política neoliberal ortodoxa e servil e os efeitos da Covid-19 nas pariferias

Foi exatamente o desgaste oriundo do caso Matteoti que levou Mussolini a implantar o Estado totalitario na Italia em 1925. Para o fascismo avançar a um regime totalitário é preciso que ele acerte contas com o Estado liberal onde sobrevive, o que exige acumular forças e leva a conflitos e hesitações entre suas lideranças;

4) As classes dominantes estão divididas entre uma ala que representa o establishment liberal globalista e a ala neofascista emergente. Este conflito tem sua principal expressão na luta entre o Bolsonarismo e a Rede Globo, que se desdobra em dois projetos, a extinção da concessão dos direitos de transmissao televisiva à empresa, ou o impeachment de Jair Bolsonaro. A ausência de uma alternativa política de representação dentro do regime liberal presidencialista e a possibilidade de ascensão dentro da ordem burguesa atraem setores da classe dominante para o bolsonarismo;

5) No confronto entre o establisment liberal e os fascistas, os primeiros não tem base de massas para mobilizar, só podendo lançar mão da que possuem as esquerdas, o que abre a possibilidade dos liberais recuarem do protofascismo de 2016, o que não farão sem muitas resistências. A aceleração do tempo histórico exige uma rapidez de decisão e organização que limita esta alternativa;

6) Uma aliança antifascista não leva necessariamente a um projeto burguês. Foi a aliança entre Stalin, Churchill e Roosevelt que que derrotou Hitler e projetou a URSS no mundo como potência mundial. O resultado de uma aliança anti-fascista dependerá de quem a dirige e de como as diversas forças se movimentam nela; e

7) As forcas da ultraesquerda tem falhado na criação de uma alternativa real ao fascismo e na análise da realidade brasileira. Não basta a crise econômica, um líder e uma mensagem para as massas se sublevarem. Guerra de movimentos sem guerras de posição que as preparem não funcionam. Os caminhoneiros não foram a ponta da renovação do movimentos de massas e nem da superação do sindicalismo reformista. Houve golpe de Estado em 2016, apesar das convergências entre tucanos e petistas, por isso há que se refinar a análise e incluir nela as suas diferenças.

Carlos Eduardo Martins é professor Associado da UFRJ e autor de Globalização, dependência e neoliberalismo na América Latina ( Boitempo).

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