Ricardo Cappelli
As últimas pesquisas indicam que o presidente mantém cerca de 30% do eleitorado com ele. O isolamento produzido por suas posições absurdas sobre a covid-19 não surtiram efeito no povo. Ele se agarrou à economia, um aliado sempre poderoso.
Um pedido de impeachment agora seria morder a isca que ele jogou? Não há precedente de presidente que tenha sido derrubado com esse nível de popularidade. Sem povo na rua? Seria uma novidade. Além do mais, quem realmente deseja colocar Mourão no Planalto?
A presença do presidente em frente ao QG do exército numa manifestação a favor de um novo AI-5 causou frisson. Inaceitável? Claro que sim. Novidade?
No sistema político a situação continua confusa. A dura vida de Rodrigo Maia é ilustrativa. Ele apanha do PT na terça-feira por ter colocado a carteira verde e amarela na pauta. Na quarta-feira sinaliza para os governadores aprovando a ajuda aos Estados. Na quinta-feira ganha uma rasteira de Alcolumbre que senta em cima da proposta.
Na sexta e no sábado apanha de Bolsonaro por estar supostamente conspirando para derrubá-lo. No domingo volta a apanhar da esquerda por estar segurando o pedido de impeachment. Na segunda-feira é traído pelo Centrão numa manobra do Planalto para tentar isolá-lo.
Quem sustenta de fato Maia? O povo está com ele? E ainda tem a PF atrás do “Botafogo”.
PP, PL, PSD e Republicanos estão a caminho do governo. Parece uma ratoeira. Tudo indica que Bolsonaro está atraindo a turma para fazê-los de reféns mais a frente. Os “vereadores federais” são tratados por todos como a “Geni” do sistema político. O presidente está oferecendo um “beijinho”. Vão arriscar.
Mas o capitão não é contra acordos com os políticos? Vai fazer jogo duplo mantendo o discurso anti-establishment para o seu eleitorado. Um flanco que poderá ser explorado.
Se a política está confusa, quem sabe os militares, “incomodados”, não derrubam o Jair? Jamais um presidente da República visitou tanto os quartéis. Bolsonaro é o “case” de sucesso da tropa, “o Capitão que manda em generais”.
A tese de que uma junta militar assumiu o governo é um delírio. Quem manda é Bolsonaro. Confundir limite com ausência de poder é um erro grosseiro. Os generais se equilibram entre a defesa da institucionalidade, as loucuras do presidente e o receio de que ele, num ato de irresponsabilidade total, tente atravessá-los comandando a tropa diretamente.
Os militares de alta patente têm a consciência de que se a canoa virar o risco de morrerem todos afogados é enorme. Não são ingênuos, estão gostando do poder. Vão navegando e fechando os buracos no casco como podem.
O que no fundo impede qualquer ação mais conseqüente contra Bolsonaro é uma questão objetiva: quem vai liderar quem? A esquerda topa ser liderada pelos liberais? Os liberais topam o contrário? Lula e Doria de mãos dadas num ato na Paulista, que tal? Quem topa?
Persiste o temor de que uma aproximação pode ser fatal para ambos. Parece ilusão. O buraco aberto por junho de 2013 e pela Lava Jato sugou tudo. O presidente é o antissistema. O sistema vai se unir para enfrentá-lo? Quem quer ser o sistema?
Sem povo e sem unidade, permanecemos no empate de sempre. Não há força para um autogolpe e nem para um impeachment. Só cadáveres em profusão poderiam gerar uma comoção social capaz de mudar esta situação. Tomara que não venham.