O que fazer ante o desastre iminente?

O alastrador de vírus. Foto: Joédson Alves/EFE

Os efeitos do discurso da morte proferido por Bolsonaro na última terça se espalham, como alguns tipos perigosos de vírus, rapidamente. Alucinadas carreatas de crédulos estão ocorrendo hoje (27) em muitas cidades do país. Trata-se de um protesto para que a população siga as orientações do presidente — contrariando todos os médicos, pesquisadores, governos de outros países, OMS, etc. — e voltem à vida normal para “salvar a economia”.

Nas redes sociais, a impressão é de que não é apenas o bolsonarismo raiz que está adotando a linha presidencial; há muita gente reproduzindo o discurso do genocida de novo tipo. Conversei com uma vizinha, hoje, que é dona de um salão de beleza. Ela disse desconfiar da gravidade da pandemia. Eu disse os motivos pelos quais a situação é indubitavelmente grave e ela, então, respondeu que não sabia o que fazer para pagar as contas e o aluguel. Ela até conversou com o dono do imóvel, mas não houve qualquer flexibilidade.

Por aí se entende as razões que estão levando as pessoas a se alinhar a Bolsonaro. Como fazer para pagar as contas sem trabalhar? Como sobreviver ficando em casa?

Entre as duas únicas possibilidades que lhes são apresentadas — sair para a rua e correr o risco de pegar o vírus, contaminar outras pessoas e eventualmente morrer / ficar em casa e não ter condições para pagar o aluguel ou se alimentar — muitas(os) brasileiras(os) estão optando pela segunda. O que não é, convenhamos, de todo desarrazoado. É compreensível que a opção arriscada, mas que pode garantir a sobrevivência imediata, se sobreponha à opção mais sensata, cujos danos, contudo, são esparsos, coletivos e intangíveis até que a pessoa fique muito mal ou veja um ente querido nessa situação (ou os números de mortos disparem, como deve ocorrer).

A informação que Bolsonaro e todos os demais adoradores do deus capital sonegam ao público é que há uma terceira opção: o governo federal agir de forma contundente, distribuindo recursos para que os trabalhadores possam sobreviver a este período sem trabalhar e garantindo que apenas os serviços essenciais continuem funcionando. Como se vê nessa reportagem da BBC que compara as medidas econômicas que os países estão adotando, as brasileiras são das mais tímidas. A demonizada Venezuela, ao contrário, adota algumas bem mais avançadas.

Quanto ao isolamento social como medida de primeiríssima ordem para conter o contágio, a esmagadora maioria dos líderes de nações, de todos os espectros ideológicos, está adotando. Até mesmo Trump, o ídolo de Bolsonaro, mudou seu discurso e está recomendando que os americanos fiquem em casa. Bolsonaro, entretanto, segue em sua louca e suicida cavalgada. Seu governo está prestes a colocar no ar uma campanha com o slogan “O Brasil não pode parar”, ao custo de R$ 4,8 milhões de dinheiro público.

O prefeito de Milão, que agiu da mesma forma quando a Itália ainda tinha poucos mortos, disse ontem estar arrependido. Até o slogan era parecido: “Milão não para”. Mesmo assim, o governo do Brasil segue a linha de atuação (já abandonada) que certamente colaborou para que os italianos chorem hoje a morte de 9.134 pessoas — 969 somente nas últimas 24 horas, o recorde de óbitos até aqui.

A tendência é que o Brasil atravesse um vale de lágrimas sem precedentes nas próximas semanas.

É imperativo, portanto, que engulamos a raiva dos bolsonaristas que estão espalhando a desinformação mortal e divulguemos as informações corretas, com a persistência de uma formiga e a paciência de um buda. Eu mesmo estou com dificuldade de fazer isso (já briguei on-line com alguns bolsonaristas), mas é preciso seguir tentando. É necessário sermos estratégicos e recorrermos às nossas melhores armas argumentativas para ao menos minorar o desastre.

No plano da política, continua urgente que Bolsonaro seja detido. Impeachment, ações judiciais, incitação à renúncia, todas as ferramentas devem ser usadas para que a pressão sobre o presidente se intensifique e ele saia — ou seja saído — do comando da nação o mais depressa possível.

Como disse o famigerado profeta Eduardo Cunha, que Deus tenha misericórdia dessa nação.

Pedro Breier: Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.
Related Post

Privacidade e cookies: Este site utiliza cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com seu uso.