O presidente Jair Bolsonaro divulgou hoje vídeo de sua entrevista à CNN Brasil, filial da rede americana que estreou ontem no país.
Perguntado o que achava das críticas dos presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e do Senado, David Alcolumbre, Bolsonaro os desafiou a também saírem às ruas.
Bolsonaro parece estar sofrendo de grave déficit cognitivo.
Confiram a sequência de tweets de Rodrigo Maia:
O presidente da Câmara criticou o presidente da república por desprezar as advertências do ministério da Saúde de seu próprio governo. O ministério pediu à população, em nome do combate à pandemia, evitar aglomerações. E o que faz o presidente? Abandona uma quarentena, em que estava confinado porque mais dez pessoas com quem ele interagiu nos últimos dias testaram positivo, despreza os alertas oficiais, e participa de manifestação em frente ao Palácio, interagindo com quase 300 pessoas (segundo reportagem do Estadão).
Bolsonaro acaba de voltar de uma viagem aos EUA na qual 11 pessoas com quem teve contato contraíram o Covid-19, tanto que ele mesmo fez um teste e recebeu orientação médica de permanecer em quarentena durante o final de semana.
É importante observar que a quarentena imposta a uma pessoa que teve contato com indivíduos contaminados com o coronavírus é feita sobretudo para proteger o coletivo.
Em todo o mundo, presidentes, primeiro-ministros e autoridades governamentais usam as redes sociais para divulgar informações úteis, fazer advertências, transmitir orientações e prestar contas das ações do governo.
E o que faz o nosso presidente? Passa o dia divulgando vídeos de manifestações altamente inoportunas (por causa do risco de ajudarem a disseminar o coronavírus).
O irônico (é um tipo de ironia mórbida, triste, mas ainda assim, ironia) é que o próprio Ministério da Saúde, no mesmo dia, divulgava em suas redes as seguintes advertências e orientações: que idosos são o grupo mais vulnerável ao coronovírus (Covid-19), e que, por isso mesmo, deveriam evitar aglomerações humanas, ou seja, o contrário do exemplo mostrado pelo presidente.
A atitude de Bolsonaro tem consequências graves. Repare que na entrevista à CNN, que ele mesmo divulga em suas redes, ele critica o fechamento de estádios, qualificando a decisão da CBF de “histeria”.
Nas manifestações realizadas ontem, a favor de Bolsonaro, onde se viu sobretudo pessoas mais velhas, locutores apregoavam mentiras como “o coronavírus nunca matou ninguém”, e teorias conspiratórias. Alguns chamavam de “comunavírus”.
Tudo isso é muito grave, porque implica que o governo federal, através de seu comandante maior, o presidente da república, está transmitindo mensagens confusas, contraditórias, à população.
Se o presidente não tem noção da gravidade do momento, ele também não vai tomar as decisões necessárias para conter seus efeitos.
Um dos efeitos mais crueis do coronavírus é o econômico, sobretudo num país onde a maioria dos empregos gerados nos últimos meses são de informais, numa magnitude tal que eles já respondem por 41% de todos os trabalhos, correspondendo a mais de 38 milhões de brasileiros. Nas regiões mais pobres, ou seja, nas mais vulneráveis a epidemias e disrupções econômicas, a informalidade chega a mais de 50%, o que significa que essas pessoas não poderão “ficar sem trabalhar”, porque não tem nenhum tipo de proteção trabalhista. Precisam trabalhar para comer.
A impressão que se tem é que Bolsonaro, no fundo, sabe de tudo isso, e justamente por saber está em pânico, em fase de negação, talvez por pressentir que a lua de mel da população com seu governo terminou. Até o momento, Bolsonaro tinha conseguido “empurrar com a barriga” a sua administração, usando de todo o tipo de artifício desonesto, polarizando, inventando inimigos imaginários. Agora não dá mais. Agora será preciso governar.
Mesmo essas manifestações de domingo, medíocres, minúsculas, mas presentes em muitas cidades, serviram mais à oposição do que ao governo. A oposição teve alguma coisa para a qual apontar o dedo: vejam todos como os bolsonaristas são irresponsáveis, toscos, delirantes, e como o próprio presidente apoia essa atitude!
Na entrevista à CNN, Bolsonaro fala que os políticos precisam ser “quase escravos” da vontade popular. É uma definição muito interessante do neopopulismo reacionário que o guia, sobretudo porque ele não estava se referindo ao povo, de maneira geral, e sim a seu próprio eleitorado, que não resistirá muito tempo a tanta incompetência e mania de grandeza.