O governo brasileiro e a imprensa estão anunciando, com grande estardalhaço, um acordo militar com os Estados Unidos, sem atentar para alguns pontos importantes:
- acordos militares criam, automaticamente, espaços de exclusão, ou seja, ao fechar um acordo desse tipo, em alguma área específica, com o governo americano, o Brasil perde liberdade para fechar acordos com países que, de alguma maneira, tenham qualquer conflito de interesses com a Casa Branca.
- Se o Brasil tivesse fechado “acordo militar” com os EUA em ocasiões anteriores, não teríamos transferido tecnologia nuclear para o Brasil, por exemplo.
- Na atual conjuntura, um acordo militar com os EUA significa, diretamente, envolver-se na guerra tecnológica entre EUA e China.
- Assessores da Casa Branca já estão usando o tal “acordo militar”, por exemplo, para pressionar o Brasil a adiar indefinidamente (o que aliás está sendo feito, o governo Bolsonaro já está adiando, em obediência aos interesses americanos) a entrada de tecnologia 5G no país, hoje atentida, comercialmente, apenas por uma empresa chinesa, a Huwaei.
- Os “100 bilhões de dólares” aos quais empresas brasileiras teriam acesso com este fundo são apenas uma cenoura dourada para justificar a subserviência do governo Bolsonaro aos interesses do imperialismo, porque dificilmente alguma empresa nacional verá a cor deste dinheiro, e se ver, o controle político sobre esses recursos – sobre a produção e a demanda – permanecerá nas mãos da Casa Branca.
- Empresas brasileiras podem ficar com migalhas desse fundo, desde que se disponham a obedecer as diretrizes da Casa Branca, e não façam negócios com empresas chinesas.
- Os US$ 100 bilhões são de um fundo disponibilizado para todas empresas americanas e todos os países-participantes da Otan. Diluído para tantos países, dificilmente haverá espaço para alguma empresa brasileira.
- A grande questão sempre será: haverá transferência de tecnologia? Os Estados Unidos são, historicamente, o país mais fechado do mundo em termos de transferência de tecnologia. Não é da cultura americana transferir tecnologia, sobretudo na esfera militar. Pelo já declararam funcionários da Casa Branca, não apenas não haverá transferência de tecnologia, como pode haver bloqueio de iniciativas brasileiras de obter tecnologia em outro lugar, como o uso de sistemas 5G operados por empresas da China.
- Haveria leilão de 5G programado para março deste ano. O evento foi adiado para outubro. Agora se fala em novo adiamento. Com este adiamento, as empresas brasileiras, sobretudo suas indústrias, ficarão ainda mais atrasadas e obsoletas, e, paradoxalmente, terão dificuldade ainda maior para concorrer com multinacionais norte-americanas, beneficiadas, há décadas, por subsídios e financiamentos do Estado americano.
Abaixo, trecho de matéria publicada hoje na Reuters. Atente para o que diz um “funcionário de alto escalão da Casa Branca”.
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Para governo dos EUA, entrada da Huawei no 5G do Brasil pode atrapalhar cooperação em defesa
Reuters Staff
2 Min, DE LEITURA
PALM BEACH, Estados Unidos (Reuters) – O governo norte-americano vê a entrada da chinesa Huawei no mercado de 5G brasileiro como um possível impedimento para o desenvolvimento de uma relação forte de cooperação na área de defesa e inteligência entre Brasil e Estados Unidos, disse nesta sábado um assessor de alto escalão da Casa Branca em um briefing sobre o encontro entre os presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump.
O tema não necessariamente seria tratado entre os dois presidentes no jantar da noite deste sábado em Mar-a-Lago, a residência não oficial de verão do presidente norte-americano na Flórida, disse o assessor, falando em condição de anonimato dada a sensibilidade dos temas tratados nas conversas entre governos.
“Nós acreditamos fortemente, e olhe, claramente, que para ter uma cooperação forte de defesa e inteligência com o Brasil, você sabe, ter os chineses penetrando a rede de 5G, particularmente pela Huawei, iria se tornar um enorme impedimento. Esse é apenas um fato, um fato lamentável. Isso está por exemplo afetando nossa relação com o Reino Unido”, disse o assessor de Trump.
Paulo
09/03/2020 - 08h45
Pois é! O próprio Reino Unido, tradicional aliado americano, preferiu os chineses…Tem que ver direito isso aí! Espero que o Congresso abra a discussão a amplo contraditório e com debates isentos…