A jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura e do Estado de S. Paulo, foi vítima de doxxing (exposição de dados pessoais) e da criação de um perfil falso em uma rede social, depois de ter revelado na terça-feira (25.fev.2020), em reportagem publicada no site BR Político, que o presidente Jair Bolsonaro tem disparado mensagens de apoio a um ato contra o Congresso Nacional por meio de seu WhatsApp privado.
Quem cria perfil falso em rede social pode ser responsabilizado civil e criminalmente. Na esfera cível, responde por danos morais e na criminal, por falsidade ideológica. Caso seja notificada por ordem judicial específica de exclusão de conteúdo e não retire o perfil do ar, a plataforma também pode ser responsabilizada. O Tribunal de Justiça de São Paulo tem jurisprudência sobre o assunto e em 2018 condenou o Facebook por omissão por não ter retirado do ar o perfil falso de um médico, mesmo tendo sido notificado.
Segundo reportagem publicada no Estado de S. Paulo, foi criada uma conta falsa no Whatsapp em nome de Vera Magalhães, e mensagens fraudadas foram distribuídas em outras redes sociais. Também houve compartilhamento de uma cobrança de 2015 do colégio onde estudam os filhos da jornalista, colocando em risco a integridade física de sua família, além de expor assuntos de foro privado. A Abraji considera a exposição de dados pessoais uma forma de ameaça a jornalistas e um constrangimento à liberdade de imprensa.
A Abraji também considera lamentável e preocupante que o presidente da República use um canal de comunicação, ainda que privado, para propagar um ato que vai contra o equilíbrio dos três poderes e contra a própria democracia. Como figura pública que jurou respeitar a Constituição, Jair Bolsonaro deve prestar contas de seus atos à população.
Ao desprezar o trabalho da imprensa, ele incita seus apoiadores a atacar jornalistas nas redes sociais, em clara campanha de linchamento virtual. Seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal (PSL-SP), postou no Twitter resposta agressiva à afirmação da jornalista de que em 2018 Jair Bolsonaro dissera: “Se caísse uma bomba H no Parlamento, pode ter certeza, haveria festa no Brasil”.
Como se isso não bastasse, apoiadores do presidente passaram a linchar virtualmente a jornalista lançando mão de frases sexistas, machistas e misóginas. “O jornalismo profissional já enfrentou resistências desse tipo em outros governos, mas a escala e virulência são inéditos e procuram colocar em xeque a própria existência da imprensa livre”, disse Magalhães, acrescentando que as jornalistas sofrem em dobro. “O objetivo é tirar nossa credibilidade. É algo que não acontece em relação a jornalistas homens.”
Organizado por ativistas conservadores e marcado para 15.mar.2020, o ato compartilhado por Bolsonaro levanta bandeiras antidemocráticas, contrárias ao Congresso Nacional e em defesa de militares e do atual governo.
Entre os ataques, Magalhães também chegou a ser insultada por trabalhar na TV Cultura, empresa de comunicação pública do estado de São Paulo. Jornalista com mais de 20 anos de carreira, ela é apresentadora do Roda Viva, além de colunista do Estado de S. Paulo e editora do site BR Político.
Muitas das ofensas direcionadas à jornalista fazem alusão aos recentes ataques propagados por figuras públicas e nas redes sociais contra a jornalista da Folha de S. Paulo Patricia Campos Mello, reforçando o caráter machista e misógino dos insultos.
Magalhães afirma que os ataques são frequentes, mas se intensificam quando publica alguma reportagem que exponha ações do atual governo. “Os ataques são muito mais virulentos contra as mulheres”, aponta.
Diretoria da Abraji, 26 de fevereiro de 2020.