No finalzinho de 2019 saiu uma pesquisa do Datafolha apontando que a maioria dos brasileiros (57%) é favorável à priorização de investimentos na área social como medida para combater a criminalidade. Em segundo lugar (41%) ficou a turma do prendo e arrebento, para a qual deve-se priorizar o investimento em segurança com vistas ao combate à criminalidade. Considerando o fenômeno do bolsonarismo e o fato de que a principal proposta de seu líder, o presidente eleito em 2018, é “jogar duro nessa cuestão aí da segurança”, podemos dizer que essa preferência dos brasileiros por uma solução de bom senso para a questão da segurança é uma grata surpresa. Quando vi a notícia sobre a referida pesquisa, logo lembrei de outras pesquisas (como esta) apontando que a maioria da população é contrária às privatizações de empresas estatais.
Acontece que a venda de patrimônio público e a repressão dura/violenta ao crime são dois dos pilares do discurso da direita moderna brasileira. Como se explica a existência destas pesquisas desfavoráveis às políticas da direita, mesmo no auge da popularidade deste campo e das ideias liberais?
Algumas reflexões se impõem. A primeira é óbvia: há fortes inclinações das pessoas a apoiarem ideias identificadas com a esquerda. Desta, segue-se outra, também óbvia: a esquerda não está conseguindo se comunicar com a população. Ou seduzi-la a apoiar sua política — mesmo que a população tenha inclinações a fazê-lo, o que causa certo estranhamento. Uma das explicações para o fenômeno é o fato de que a direita tem o capital, a mídia tradicional e o conservadorismo do judiciário a seu favor, como bem sabemos. É uma trinca poderosa.
No entanto, a incompetência das várias vertentes da esquerda na área comunicacional também precisa entrar na equação. Até mesmo porque trata-se do elemento que podemos trabalhar para aprimorar, uma vez que não se vislumbra no horizonte uma guinada à esquerda do capital, da mídia e do judiciário. Não é uma tarefa fácil melhorar a comunicação com o povo, mas algumas coisas parecem ser imprescindíveis. Do lado de quem cria conteúdo, profundidade e criatividade, para tornar o que é dito acessível e atraente. Do lado dos governos estaduais ou municipais de esquerda, políticas para fortalecimento, expansão ou criação de mídias alternativas e públicas, assim como para o acesso massivo à internet pela população.
As táticas de um grupo político devem ser flexíveis para se adaptarem às mudanças de conjuntura. Pode até soar estranho, mas sonhar com uma onda de youtubers de esquerda de sucesso, nesta quadra histórica, é perfeitamente razoável.