Uma crítica ao PDT (e a todo o campo progressista)

Nos últimos tempos, andei fazendo muitas críticas ao PT, por razões óbvias: é o partido que governou o país. Também já fiz muitas críticas ao PSOL, diretas, ou indiretas (quando menciono o que considero excessos e erros da política identitária, ou o purismo ideológico, por exemplo). Recentemente, fiz algumas críticas ao PCdoB, por considerar que era hora da legenda demonstrar um pouco mais de brio e independência.

Queria agora fazer uma crítica – construtiva, naturalmente – ao PDT. Mas ela pode ser igualmente destinada a qualquer outra organização partidária, de esquerda ou não. 

Também tenho muitas críticas a Ciro Gomes, e à maneira incrivelmente desastrada com que ele e seu partido lidaram com a reforma da previdência, mas isso fica para outra ocasião.

Tenho visto militantes da velha guarda do PDT muito preocupados com a pureza da doutrina trabalhista, a qual estaria sendo “ameaçada” pela entrada de novos membros.

No entanto, onde está a preocupação do partido e dos trabalhistas com o que vem fazendo os 328 prefeitos do partido?

É o segundo partido de esquerda com mais prefeituras no país, depois do PSB, que tem 404 prefeituras; à frente inclusive do PT, que tem 256 prefeituras.

Se o partido tem um projeto nacional de desenvolvimento, que é o norte principal da atual doutrina trabalhista, por que estas prefeituras não são mapeadas, contatadas, pressionadas, para que a população brasileira possa saber se há algum vestígio desse projeto sendo tocado em alguma delas?

Suponho que se poderá encontrar alguns bons exemplos. Em outros casos, nem tanto. Um trabalho para dar transparência ao que fazem prefeitos, no entanto, seria fundamental.

A ideia vale, naturalmente, para todos os partidos.

Mas não se vê nada! Vejo alguns trabalhistas mais preocupados com a possível “influência” de jovens militantes dispostos a entrar na legenda, classificando-os com estereótipos ofensivos, como “cirominions”, do que em monitorar o que as prefeituras do PDT, que lidam com a educação e saúde básica de milhões de brasileiros, estão fazendo pelo bem do país.

Não vale dizer que há algum tipo de monitoramento secreto dessas administrações, que apenas os “iniciados” conhecem, porque isso não cola. Estamos em tempos de transparência. Os partidos de esquerda com ambições de governar o país precisam fazer o dever de casa, que é organizar sistemas transparentes de monitoramento, inclusive para que a população possa aplaudir os bons projetos e criticar os maus. Ou mais que isso: a transparência, a pressão externa, a crítica podem fazer com que maus prefeitos se tornem bons, e bons prefeitos se tornem melhores ainda.

Tenho visto a esquerda se lamuriando muito nas redes, e isso está me irritando cada vez mais. Suponho que o povo brasileiro também deve estar perdendo a paciência, e o resultado eleitoral das eleições municipais de 2016 e gerais de 2018 provam isso. O povo quer ver trabalho!

Voltando ao PDT, o partido tem 3.769 vereadores, contra 2.809 do PT, e 3.631 do PSB. Ou seja, é o maior partido da esquerda em termos de vereadores. Há alguma iniciativa para coordenar o trabalho desses vereadores, de maneira que possam servir como agentes de propaganda de um projeto nacional de desenvolvimento, promovendo algumas ideias tanto dentro das câmaras municipais, como para fora, para o mundo?

Considerando todo o campo progressista, temos a seguinte situação: a esquerda tem hoje, no Brasil, somando todos os sete principais partidos (PT, PSB, PDT, PCdoB, PSOL, Rede e PV), um total de 14.575 agentes políticos na ativa. Ainda somando os sete partidos, são 1.172 prefeitos, 12.967 vereadores, 270 deputados estaduais, 9 governadores, 140 deputados federais e 17 senadores. Se alguém contasse a Marx que a esquerda teria tanta força num país como o Brasil (descontando o fato de já ter presidido o país diversas vezes, com Vargas, Juscelino, Jango, Lula e Dilma), sem necessidade de nenhuma revolução armada, apenas via um processo eleitoral democrático, talvez ele afastasse a ideia como excessivamente otimista.

A expressão “projeto nacional de desenvolvimento” corre o risco de se tornar uma caricatura, uma retórica vazia, se este projeto não começar a ser explicitado em detalhes, com apresentações de modelos, propostas e comparativos internacionais para cada item, e divisão em partes que possam ser aplicadas e testadas regionalmente. 

Prefeitos, vereadores, deputados, senadores, governadores tem muito poder em suas mãos. Decidem sobre políticas públicas estratégicas.

O que pode ser articulado?

Algumas ideias:

  • Projetos agroindustriais inteligentes, ecológicos e modernos;
  • coleta de lixo seleta e sustentável;
  • linhas solidárias de micro-crédito;
  • criação de centros de inteligência, para coleta, discussão e análise dados;
  • criação de fundos financeiros para sustentar jornalismo profissional independente dos interesses corporativos; 
  • cursos técnicos e profissionalizantes, abertos, gratuitos, online, voltados para as novas profissões da economia do conhecimento;
  • criação de frentes de trabalho, para aliviar o desemprego, e constranger o governo federal a imitar a iniciativa;
  • criação de um fundo de incentivos à cultura (audivisual, literatura, música).
  • criação de um centro de solidariedade, para distribuir alimentos e roupas aos mais necessitados. 

Se houver coordenação, inteligência e criatividade, o povo brasileiro poderá dar ao campo progressista uma segunda chance em 2022. Senão, teremos Bolsonaro novamente.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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