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Externalidades de industrialização
10 DE JANEIRO DE 2020
Por Paulo Morceiro
A manufatura é uma das precondições para o desenvolvimento econômico? Ela ainda é importante para um país em desenvolvimento? Nos últimos dias isso tem sido bastante discutido nas redes sociais. Neste post falarei brevemente qual é o papel que a indústria desempenha no desenvolvimento.
A industrialização esteve associada com o desenvolvimento socioeconômico, pois muitos países, especialmente populosos, tornaram-se industrializados e desenvolvidos simultaneamente. Chamarei de externalidades de industrialização algumas características especiais que se manifestam com maior intensidade no setor manufatureiro, a saber:
- Inovação. A manufatura, especialmente os setores industriais de maior intensidade tecnológica, é a principal fonte de inovação e difusão de novas tecnologias para toda a economia. Fora da manufatura só temos serviços de informação (softwares) com o mesmo protagonismo.
- Locomotiva do crescimento (encadeamento para trás). A manufatura possui grande capacidade de puxar o crescimento dos demais setores da economia, pois praticamente todos os setores manufatureiros possuem os maiores multiplicadores de produção (longas cadeias produtivas).
- Desenvolvimento regional. A manufatura possui elevada capacidade de promover o desenvolvimento regional. Localidades em que se instalam indústrias novas passam por grandes transformações.
- Produtividade. Contribui mais do que proporcionalmente – ao seu tamanho – para o crescimento da produtividade da economia ao apresentar elevadas economias estáticas e dinâmicas de escala, especialmente na fase de industrialização. A indústria é intensiva em capital e tecnologia incorporada, condições necessárias para o aumento da produtividade.
- Balanço de pagamentos. A manufatura pode aliviar pressões sobre o BP já que ela realiza cerca de 2/3 das exportações mundiais. Ao contribuir para o saldo comercial a manufatura permite que países em desenvolvimento possam gerenciar suas políticas macroeconômicas com maior autonomia.
- Empregos e salários. A manufatura é um dos poucos setores que empregam (formalmente) grande quantidade de pessoas e tem remuneração superior à média da economia.
- Qualificação da mão-de-obra. A manufatura contribui para a qualificação adicional da força de trabalho, pois exige montante expressivo de profissionais com treinamento técnico, tecnológico e superior que são intrínsecos a atividade industrial.
- Segurança nacional. A manufatura é importante para a segurança nacional ao produzir os avançados sistemas de defesa para fiscalizar fronteiras e riquezas domésticas. Relevante também para segurança energética, alimentar, saúde e cibernética.
- Duração do crescimento: a maior participação da indústria de transformação e uma estrutura de produção mais diversificada contribuem para uma maior duração temporal dos episódios de crescimento e reduz a volatilidade dos padrões de crescimento.
- Carregadora de serviços sofisticados: os bens industriais carregam os serviços sofisticados para outros países quando eles são exportados, transformando assim vários serviços não-comercializáveis em comercializáveis. Note que a manufatura consome inúmeros insumos de serviços no processo de produção.
As características acima não se manifestam com a mesma intensidade entre os setores manufatureiros, por exemplo, os setores manufatureiros low-tech pagam salários baixos e investem proporcionalmente menos em tecnologia. Setores fora da indústria, como os serviços sofisticados (sobretudo serviços de informação) remuneram bem, investem em tecnologia e são vitais para a segurança nacional.
Fatos históricos:
- As revoluções industriais têm mudado e elevado o padrão de vida da humanidade em múltiplas dimensões.
- As maiores taxas de crescimento econômico ocorreram na fase de industrialização.
- Nenhum país populoso se tornou desenvolvido sem passar por uma experiência de industrialização bem-sucedida.
As “externalidades de industrialização” se manifestam com maior intensidade no setor manufatureiro – sobretudo nos setores de alta e média-alta tecnologia –, mas algumas também são encontradas nos demais setores não-manufatureiros. Porém, dificilmente um setor não-manufatureiro reúne a maioria da lista acima.
Também vale ressaltar que os setores manufatureiros possuem contribuição diferente conforme o estágio do desenvolvimento, conforme ilustra a figura abaixo extraída deste paper.
Acima de US$ 20 mil per capita em paridade poder de compra (PPC) os setores predominantemente de alta e média-alta tecnologia — e os serviços sofisticados (não mostrados na tabela acima) — são vitais para o desenvolvimento. O Brasil está estacionado no estágio intermediário há 40 anos, na verdade, tem retrocedido prematuramente em vários setores dos estágios (2) e (3) da tabela acima.
Luiz
11/01/2020 - 17h47
No passado, antes do neoliberalismo representar o imperialismo, foram extensos os debates sobre economias planificadas e planejadas. Seria esquerdistamente decente reintroduzir esta pauta.
Paulo
10/01/2020 - 19h47
Mas o Porco Guedes prometeu que aqui iria jorrar leite e mel com a Reforma da Previdência e Trabalhista…Ou será que ainda faltam a Administrativa e a tributária, bolas da vez?