Uma vitória do garantismo de Luigi Ferrajoli

A consequência mais importante da decisão tomada hoje pelo STF, embora em maioria apertada de 6 X 5, é trazer um pouco mais de normalidade ao campo jurisdicional brasileiro.

Trata-se de uma vitória filosófica do conceito da presunção da inocência, e do garantismo penal de Luigi Ferrajoli, a corrente jurídica mais moderna e humanista nos dias de hoje, e a mais adequada a um Brasil sacudido por uma terrível crise de anarquia judicial.

Por isso mesmo é um erro primário da esquerda associar a decisão à liberdade de Lula, personalizando uma decisão que deveria ser mostrada como uma vitória da lei, e não de um partido ou de um campo ideológico.

Lula deve ser solto nos próximos dias, e é normal e saudável que a militância se alegre com essa possibilidade, mas as vanguardas organizadas não deveriam ter personalizado a decisão, não apenas porque ela afeta milhares de outros presos, injustamente encarcerados por um dos judiciários mais conservadores do mundo democrático, mas porque essa postura empurra parte importante da opinião pública para o colo da direita, que promete se vingar desse resultado através das urnas, como já fizeram em 2018.

É hora de se comemorar, sim, mas sobriamente, como deve ser a comemoração de uma decisão impopular, visto que um setor majoritário da população acredita – em função da propaganda do campo conservador – que ela beneficiará bandidos e corruptos.

É hora de cumprimentar um dia – enfim! – de coragem por parte de alguns ministros do STF.

Quanto ao ex-presidente Lula, esperamos que possa recorrer de sua condenação em segunda instância em liberdade, como determina a Constituição.

No caso dele, a decisão do STF que mais lhe afeta (como ele próprio e sua defesa já explicaram mil vezes) é a que julgará um pedido de suspeição do então juiz Sergio Moro. Ao que tudo indica, Moro perderá essa votação, o que significará anulação do processo do triplex, que volta à primeira instância, e restituição dos direitos políticos do ex-presidente.

O outro processo contra o ex-presidente, o do sítio de Atibaia, também está prestes a retornar à primeira instância, porque o juiz cometeu um erro já censurado – em outro caso – pelo STF, o de que não se permitiu, à defesa, se pronunciar após os delatores.

Com Lula enfim livre, o debate político também ganhará liberdade, para que possamos discutir os graves erros – e com isso, entendermos melhor também os acertos – do PT durante seus governos, incluindo no campo jurídico, que sofreu enorme retrocesso, sem que isso dê margem a acusações de cumplicidade com esses tenebrosos abusos das esferas jurídicas do Estado.

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STF derruba validade da prisão após a segunda instância

Por 6 votos a 5, a Corte reverteu seu próprio entendimento

Publicado em 07/11/2019 – 21:43
Por André Richter – Repórter da Agência Brasil Brasília

Agência Brasil — O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu hoje (7) contra a validade da execução provisória de condenações criminais, conhecida como prisão após a segunda instância. Por 6 votos a 5, a Corte reverteu seu próprio entendimento, que autorizou as prisões, em 2016.

Com a decisão, os condenados que foram presos com base na decisão anterior poderão recorrer aos juízes que expediram os mandados de prisão para serem libertados. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o julgamento terá impacto na situação de 4,8 mil presos.

Os principais condenados na Operação Lava Jato podem ser beneficiados, entre eles, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril do ano passado, na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, após ter sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), no caso do tríplex do Guarujá (SP), além do ex-ministro José Dirceu e ex-executivos de empreiteiras. Segundo o Ministério Publico Federal (MPF), cerca de 80 condenados na operação serão atingidos.

Votos

Após cinco sessões de julgamento, o resultado foi obtido com o voto de desempate do presidente da Corte, ministro Dias Toffoli. Segundo o ministro, a vontade do Legislativo deve ser respeitada. Em 2011, uma alteração no Código de Processo Penal (CPP) definiu que “ninguém será preso, senão em flagrante delito ou em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado. De acordo com Tofolli, a norma é constitucional e impede a prisão após a segunda instância.

“A vontade do legislador, a vontade do Parlamento, da Câmara dos Deputados e do Senado da República foi externada nesse dispositivo, essa foi a vontade dos representantes do povo, eleitos pelo povo.”, afirmou.

Durante todos os dias do julgamento, os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia votaram a favor da prisão em segunda instância. Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Celso de Mello se manifestaram contra.

Entenda

No dia 17 de outubro, a Corte começou a julgar definitivamente três ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs), relatadas pelo ministro Marco Aurélio e protocoladas pela Ordem dos Advogados, pelo PCdoB e pelo antigo PEN, atual Patriota.

O entendimento atual do Supremo permite a prisão após condenação em segunda instância, mesmo que ainda seja possível recorrer a instâncias superiores. No entanto, a OAB e os partidos sustentam que o entendimento é inconstitucional e uma sentença criminal somente pode ser executada após o fim de todos os recursos possíveis, fato que ocorre no STF e não na segunda instância da Justiça, nos tribunais estaduais e federais. Dessa forma, uma pessoa condenada só vai cumprir a pena após decisão definitiva do STF.

A questão foi discutida recentemente pelo Supremo ao menos quatro vezes. Em 2016, quando houve decisões temporárias nas ações que estão sendo julgadas, por 6 votos a 5, a prisão em segunda instância foi autorizada. De 2009 a 2016, prevaleceu o entendimento contrário, de modo que a sentença só poderia ser executada após o Supremo julgar os últimos recursos.

Veja como votou cada ministro do Supremo

A favor da prisão em segunda instância:

Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia,

Contra a prisão em segunda instância, ou seja, prisão somente após o chamado trânsito em julgado:

Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

Edição: Bruna Saniele

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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