22/10/2019, 16h43
Agência Senado — A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Fake News debateu nesta terça-feira (22) o fenômeno da divulgação das notícias falsas. Os debatedores foram unânimes em apontar que a disseminação de fake news está ligado à disputa política e ao avanço tecnológico.
O coordenador-geral do curso de extensão em Direito Eletrônico da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro, Walter Capanema, definiu fake news como a desinformação com a intenção de prejudicar alguém. Ele afirmou que hoje as pessoas “vivem na internet” e que a rede mundial é a praça do debate político e das informações. Assim, a internet se tornou uma espécie de manancial de fake news. Capanema sugeriu uma pena maior para quem divulga fake news pela internet, como forma de combater a rápida propagação de informações falsas.
Na visão do comandante do Comando de Defesa Cibernética do Exército, General de Divisão Guido Amin Naves, há um relacionamento evidente entre a divulgação das notícias falsas e o mundo da tecnologia de internet. O general afirmou que, quando as fake news contagiam uma eleição, o equilíbrio de poder fica prejudicado.
— Enfrentar esse fenômeno é um desafio para todos da nação brasileira. Tem que começar com as crianças na escola, com uma educação verdadeira. Ninguém hoje vive sem tecnologia e precisamos de segurança para viver nesse mundo — declarou.
Hiperpolarização
O doutor em Filosofia Wilson Gomes, professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (UFBA), disse que a disseminação de notícias falsas é um fenômeno persistente, ao contrário do que muitos pesquisadores diziam, quando avaliavam a divulgação de notícias falsas como um movimento pontual. Para ele, as fake news se tornaram fenômeno a partir de 2016, em um ambiente de “hiperpolarização política” e com o avanço da direita conservadora e digital.
O professor também ressaltou que a produção de fake news está ligada à prática da “política suja”. Wilson Gomes lembrou que já existiam notícias falsas nas guerras mundiais do século passado, mas o avanço da conexão tecnológica permite que as fake news se espalhem de forma rápida e para todos os lugares.
— Hoje não há front: não há lugar que não possa ser alcançado. Fake news tem a ver com o mundo digital, com ambientes de convivência, com uma espécie de retribuição de amor digital — apontou o professor.
Checagem
Editor do Estadão Verifica e presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Daniel Bramatti disse que evita o uso do termo fake news — que não abarcaria todos os desdobramentos do fenômeno, como a sátira, um erro de apuração ou um conteúdo falso intencionalmente produzido para prejudicar um oponente. Ele apontou que há políticos, principalmente os de linha autoritária, que chamam de fake news todo o noticiário que o desagrada.
Para Daniel Bramatti, porém, o problema das fake news não será resolvido com leis ou Justiça, mas com iniciativas da sociedade organizada. Ele citou como exemplos os serviços de checagem criados por vários órgãos da imprensa, que ajudam o leitor a identificar uma notícia falsa.
— Criminalizar as fake news é um absurdo. Há muitos ditadores usando esse recurso para prender jornalistas — alertou Bramatti.
Democracia
A relatora da comissão, deputada Lídice da Mata (PSB-BA), ressaltou que as audiências são importantes para ajudar o trabalho dos parlamentares. Lídice disse que as fake news têm um caráter de malignidade e representam uma ameaça para a democracia. O deputado Rui Falcão (PT-SP) reforçou o compromisso da CPI com a liberdade de expressão. A deputada Luizianne Lins (PT-CE) registrou que a revolução tecnológica representa um marco para a humanidade. Para ela, as fake news devem preocupar toda a sociedade. Já a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) declarou que a CPI não tem objetivo de prejudicar o governo, afirmando que as notícias falsas vêm de todos lados e não só da direita.
A audiência foi coordenada pelo presidente da CPI, senador Angelo Coronel (PSD-BA). Ele destacou várias mensagens de cidadãos que chegaram pela internet. Leandro Souza, do Distrito Federal, defendeu a educação como forma de evitar a disseminação de fake news. Fernanda Silva, da Bahia, pediu punição rápida para quem espalhar notícias falsas.
Coronel convocou uma nova reunião da comissão para esta quarta-feira (23), às 12h, quando serão apreciados mais de 100 requerimentos. O senador ainda negou que a CPI tenha o objetivo de “perseguir” o presidente da República, Jair Bolsonaro, ou de limitar a liberdade de expressão.
— Vamos trabalhar com total isenção e contribuir com a sociedade para evitar que as pessoas usem perfis falsos e depreciem seus desafetos — assegurou.
Fake news
A CPI foi criada com o objetivo de investigar os ataques cibernéticos que atentam contra a democracia e o debate público. A comissão também vai investigar a utilização de perfis falsos para influenciar os resultados das eleições de 2018 e a prática de cyberbullying sobre os usuários mais vulneráveis da rede de computadores, bem como sobre agentes públicos.
O aliciamento e a orientação de crianças para o cometimento de crimes de ódio e suicídio também serão objeto de investigação da CPI, que tem até o dia 23 de dezembro para concluir seus trabalhos.