A vitória da humildade

Cristina Kichner, mesmo liderando as pesquisas, renunciou à cabeça de chapa, visando reduzir o peso da polarização no resultado eleitoral. Crédito: Página 12.

O resultado das primárias na Argentina surpreendeu os analistas mais otimistas do campo progressista.

É bom lembrar que as eleições definitivas serão realizadas no dia 27 de outubro, mas os resultados deste domingo apresentam algumas tendências extremamente consolidadas.

A chapa Frente de Todos, da dupla Alberto Fernandez e Cristina Kichner Fernandez, venceu em 22 das 24 províncias do país, com exceção de Córdoba e o Distrito Federal.

Na totalização nacional, com 99% das urnas apuradas, a Frente de Todos obteve 11,62 milhões de votos, ou 49,2% do total; o Juntos por El Cambio, de Macri, obteve 7,8 milhões de votos, ou 33% do total.

Os distritos em azul indicam as vitórias da Frente com Todos.

No Página 12, principal periódico progressista argentino, o jornalista Mario Wainfeld observa que, após a divulgação dos resultados, Cristina Fernández de Kirchner “deixou todo o protagonismo da vitória a Alberto Fernández. Este fez um discurso de concórdia e respeito, e anti-polarização “.

A vitória é uma lição de humildade e estratégia para as forças progressistas de toda a América Latina, porque foi construída sobretudo pelo recuo de Cristina K, a qual, apesar de liderar as pesquisas e ser a personagem mais conhecida do país (foi presidente da república), renunciou a ser a cabeça de chapa e entregou o protagonismo da campanha a Alberto Fernández. A decisão de Cristina foi um gesto consciente para reduzir o peso da polarização: em primeiro lugar, o país, depois o partido, disse ela, em vídeo divulgado por ocasião do anúncio de sua renúncia à cabeça de chapa.

A “grieta”, nome que eles dão à polarização extrema entre kichneristas e antikichneristas, era o principal trunfo com que Macri contava para ganhar novamente as eleições presidenciais.

A chapa Fernández X Fernández conseguiu unir a oposição antimacrista, e atrair parte do eleitorado resistente ao kichnerismo mas insatisfeito com a administração neoliberal de Mauricio Macri. Com isso, inflingiu um golpe aparentemente irreversível na estratégia macrista, que era apostar na “grieta” para vencer as eleições.

As primárias indicaram vitórias importantes em todas as camadas da institucionalidade argentina: para os governos dos distritos, deputados federais, deputados estaduais, senadores federais, senadores locais, prefeitos (intendentes).

Importante observar ainda que os terceiro e quarto lugares das primárias foram conquistados por chapas distantes do macrismo: em terceiro lugar, o Consenso Federal, liderado por peronistas históricos, como Roberto Lavagna, ex-ministro da Economia no governo Kirchner, obteve nada desprezíveis 2 milhões de votos, ou 8,5% do total; em quarto lugar, a Frente de Esquerda, reunindo os setores mais duros e radicalizados da esquerda sindical, obteve quase 700 mil votos, ou 3% do total.

Caso não haja nenhuma reviravolta nas próximas semanas, Alberto Fernández será o próximo presidente da república da Argentina, após uma estratégia que não apenas terá lhe permitido vencer as eleições, mas sobretudo (o que sempre foi a principal preocupação de Cristina) lhe dará melhores condições de governabilidade.


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