O Instituto de Estudos para Desenvolvimento Industrial (Iedi) divulgou hoje um amplo estudo, assinado pelos economistas Paulo Morceiro e Mileni Tessarin, sobre a evolução do grau de industrialização no Brasil e no mundo.
A íntegra do documento pode ser baixada aqui.
Separei alguns gráficos e as considerações finais do estudo.
Considerações finais
Por Paulo Morceiro e Mileni Tessarin
Este estudo fez uma avaliação descritiva do desenvolvimento industrial em perspectiva internacional comparada para 30 países ao longo de 48 anos, cobrindo o período de 1970 a 2017 (para o Brasil e Estados Unidos há informações para 72 anos, 1947 a 2018). Os trinta países representaram conjuntamente cerca de noventa por cento do parque industrial mundial, e em 2017, cada um representou ao menos meio por cento do valor adicionado manufatureiro mundial.
Ao longo das últimas cinco décadas houve um notável deslocamento industrial dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento, sobretudo para a Ásia, que atualmente possui metade da indústria global. Somente a China detém um quarto da indústria mundial, com um parque industrial maior que a totalidade presente no continente americano.
Além dos países desenvolvidos, alguns países em desenvolvimento também vivenciaram encolhimento no market share da manufatura global: Brasil, Rússia, México e Argentina.
Em 1980, o Brasil deteve 4,11% da indústria de transformação global a preços constantes de 2010. Porém, desde 1981, a manufatura brasileira vem encolhendo e, em 2017, representou 1,86% da manufatura mundial. Cabe ressaltar que em 1980 a indústria brasileira era maior que as manufaturas conjuntas da China, Coreia do Sul e Índia. Hoje, cada um destes países possui parque industrial maior que o brasileiro.
O retrocesso industrial brasileiro fica ainda mais evidente quando o desempenho do Brasil é comparado internacionalmente. Entre 1980 e 2017, o Brasil obteve a menor taxa de crescimento real acumulada do valor adicionado manufatureiro (VAM) entre os 30 países avaliados neste estudo. A manufatura brasileira cresceu apenas 24% entre 1980 e 2017, enquanto a manufatura mundial cresceu 204% e o mundo excluída a China cresceu 135%. Em 19 dos 30 países o VAM mais que dobrou, sendo que nos cinco países líderes do ranking o parque industrial foi, no mínimo, multiplicado por 10.
Na China o parque industrial multiplicou-se por 44 e na Coreia do Sul por 18, sendo os líderes em crescimento industrial desde 1980. Cabe ressaltar que ambos os países realizaram políticas industriais robustas focadas na inovação, na exportação e na internacionalização de empresas nacionais, com o Estado atuando em conjunto com o setor privado para elevar significativamente o desenvolvimento, além de seguirem políticas macroeconômicas favoráveis ao crescimento industrial.
China e Coréia do Sul também lideraram a lista do crescimento do VAM per capita.
Em 2017, o VAM per capita chinês superou o da economia mundial e foi cerca de mil dólares maior que o brasileiro, que se encontra abaixo da economia mundial.
A Coreia do Sul possui Desenvolvimento industrial em perspectiva internacional comparada 50 atualmente VAM per capita acima de vários países desenvolvidos, situando-se no topo do ranking mundial. Note que o VAM per capita é uma boa proxy do desenvolvimento econômico.
Em termos per capita, a evolução do VAM por habitante do Brasil também foi medíocre. Novamente, o Brasil ficou em último lugar na lista dos trinta países com evolução negativa em 28% do VAM per capita entre 1980 e 2017.
Além do Brasil, apenas a Austrália teve evolução negativa. Em contraste, a economia mundial apresentou evolução positiva em 79% no mesmo período. O setor industrial contribui negativamente com o PIB per capita do Brasil desde 1980.
Este estudo verificou que a maioria dos países – desenvolvidos e em desenvolvimento – ou seguem uma trajetória de aumento da parcela manufatureira no PIB a preços constantes ou de estabilidade no período de 1970 a 2017. Com isso, a fatia da indústria de transformação no PIB da economia mundial apresentou ligeira tendência de aumento de 1970 a 2017, quando mensurada a preços constantes de 2010.
Cabe salientar que a preços correntes, o peso da manufatura no PIB da economia mundial registrou diminuição acentuada desde 1970, assim como em dois terços dos países da amostra. Porém essa diminuição não se deve ao fato de a manufatura ter crescido menos que a economia mundial, mas sim a evolução desfavorável à indústria de transformação dos preços relativos.
Entre 1970 e 2017, a manufatura mundial cresceu ligeiramente acima do PIB mundial, logo, não houve diminuição real de tamanho; porém os preços dos produtos manufaturados cresceram apenas 60% dos preços da economia total, o que explica a diminuição da parcela industrial a preços correntes. Portanto, a série a preços correntes está contaminada pela inflação setorial, sendo assim, é mais adequado avaliar o peso industrial no PIB na série mensurada a preços constantes.
Cabe registrar que a manufatura brasileira perdeu participação no PIB de modo mais intenso que a manufatura mundial na série a preços correntes. Além disso, o Brasil também perdeu participação no PIB na série mensurada a preços constantes, fato que contraria a tendência mundial e a observada na maioria dos países. Na verdade, o Brasil representa o caso mais agudo de desindustrialização prematura, pois entre os países que começaram a se desindustrializar com renda per capita abaixo do patamar de US$ 20 mil em PPC de 2017 foi o que apresentou a maior diminuição da parcela industrial no PIB.
Portanto, numa perspectiva internacional comparada, o desenvolvimento industrial brasileiro foi o menor desde 1980 dentre todos os países que possuem ao menos meio por cento da indústria global e bem abaixo do verificado para a economia mundial com e sem China.