No Conjur
TRF-4 segue MPF e decide que e-mails corporativos não são protegidos por sigilo
13 de junho de 2019, 20h01
Por Francisco Prehn Zavascki
Muitos vêm argumentando que as mensagens de celular de integrantes da força-tarefa da Lava Jato divulgadas pelo site The Intercept foram obtidas de forma ilegal. Entendo que, a despeito de aparentemente se tratar de celulares funcionais, eles estão protegidos pelo direito à privacidade. Portanto, somente mediante ordem judicial é que se poderia ter acesso a essas conversas.
Entretanto, em recentíssimo precedente, o TRF da 4ª Região, apoiado em parecer do Ministério Público Federal, entendeu que e-mails corporativos não estão submetidos à regra constitucional da inviolabilidade das comunicações. O número do processo é 5016202-28.2018.4.04.7100.
No caso, uma autarquia federal, na qual tramitava um inquérito administrativo para investigar ex-administradores de uma companhia de previdência, sem qualquer ordem judicial, e sem estarem investigando qualquer fato específico (portanto, numa verdadeira “expedição de pesca”), acessaram as caixas de e-mails dos ex-administradores. Elas estavam salvas nos servidores da empresa (que é privada) e os investigadores utilizaram essas informações para embasar imputações com repercussões nos âmbitos civil e penal.
Esse ato foi contestado judicialmente e o TRF-4, com base em parecer do MPF, afirmou que “o e-mail corporativo é uma ferramenta de trabalho, que pertence ao empregador, e não aos funcionários, que devem restringir o seu uso ao cumprimento de suas atribuições. Assim, o primeiro pode (e deve) zelar pela utilização adequada dos meios proporcionados aos segundos, para o desempenho de suas funções”.
Dessa forma, “se o objeto das correspondências é, confessadamente, a atuação da entidade investigada (presentada por seus dirigentes), a inviolabilidade de correspondências não pode ser oposta ao poder de polícia ínsito à atividade regulatória, previsto no Decreto-Lei 73/66, na Lei 6.204/74, 10.190/2001 e na Lei Complementar 109/2001”.
Diante disso, concluiu o TRF-4 que “as informações obtidas por meio do monitoramento de e-mail corporativo não são provas ilícitas, quando relativas a aspectos não pessoais e de interesse da administração pública ou da coletividade”.
Reitero que não concordo com esse entendimento, pois acredito que, mesmo nestes casos, incide a garantia da inviolabilidade das comunicações.
Respeitosamente, porém, faço uma provocação: tendo em vista o manifesto interesse da coletividade na operação Lava Jato, por uma questão de coerência, não seria o caso de a íntegra das caixas de e-mails corporativos (e, pela lógica, das mensagens enviadas por celulares corporativos) das autoridades colocadas sob suspeição (do Judiciário ou do MPF) serem remetidas, independentemente de ordem judicial aos órgãos de fiscalização competentes para que, vasculhando-as, possam achar eventuais irregularidades?
Deixo a pergunta no ar apenas para reflexão.
Francisco Prehn Zavascki é advogado
Revista Consultor Jurídico, 13 de junho de 2019, 20h01