Recentemente, Jair Bolsonaro parou num restaurante de beira de estrada e almoçou com cerca de 50 caminhoneiros que estavam no local. Perguntado sobre políticas públicas para reduzir o preço do diesel, Bolsonaro desconversou, dizendo que a maior parte do preço se devia ao ICMS, responsabilidade de governos estaduais.
É uma mentira deslavada. O governo federal é o controlador da Petrobras, que detêm, na prática, o monopólio da produção, refino e distribuição do óleo diesel no país.
Não haveria nenhum problema em estabelecer políticas de preço mais estáveis. Bastava não exagerar, como fez Dilma, e sobretudo investir no aumento da capacidade de refino, coisa que Bolsonaro não vem fazendo.
Na verdade, se tivéssemos um governo com projeto nacional, o setor de petroquímica seria um de nossos principais trunfos para alavancar o crescimento econômico do país. Somos um dos poucos países que tem muito petróleo e gás, e uma demanda interna sólida, em função de sermos uma nação continental, com 210 milhões de habitantes, detentora de enormes riquezas naturais.
Com um setor petroquímico desenvolvido, poderíamos ter políticas públicas específicas para a categoria de caminhoneiros, além de usar parte dos recursos para fomentar outros tipos de transporte, em especial o ferroviário.
No mesmo almoço, ainda tentando desviar dos assuntos que realmente importam para os caminhoneiros, como o preço do diesel e a condição das estradas, o presidente trouxe à tôna o assunto das armas, perguntando se eles eram a favor do decreto que flexibiliza o seu uso. Uma das categorias incluídas foram os caminhoneiros, que agora terão mais facilidade para portar armas.
A medida do governo é, naturalmente, mais uma de suas imbecilidades. O que vai acontecer é simplesmente aumentar o número de caminhoneiros assassinados por criminosos, porque o motorista não tem nenhum preparo para usar arma, não é militar (diferente de Bolsonaro); ao mesmo tempo, o ladrão, após saber, pela mídia, que os caminhoneiros agora estão andando armados, tenderá a ser mais violento, talvez matando o motorista antes mesmo que este se renda.
Outra trapalhada de Bolsonaro é seu projeto de lei para alterar o Código de Trânsito no Brasil.
Como sempre, Bolsonaro usa a lógica do “tiozão do zap”. Seus projetos não são fundamentados em nenhum estudo sobre sua efetividade, e representam, por isso, mesmo um enorme risco para milhões de brasileiros, visto que o país tem sido, há anos, um dos campeões mundiais de acidentes de trânsito.
Para se ter uma ideia, a taxa de mortalidade nas vias brasileiras é duas vezes maior que a dos Estados Unidos.
Um estudo feito pelo Centro de Pesquisa e Economia do Seguro (CPES), da Escola Nacional de Seguros, divulgado amplamente na imprensa há dois anos, estimava que o Brasil sofrera um prejuízo de R$ 146,8 bilhões com mortes e ferimentos relacionados ao trânsito em 2016, e mais R$ 217,11 bilhões em 2015. Ou seja, em dois anos, acidentes de trânsito produziram prejuízos ao país da ordem de mais de R$ 350 bilhões, o que dá em média R$ 175 bilhões por ano. Em dez anos, portanto, acidentes de trânsito significariam prejuízo de R$ 1,75 trilhão! É quase duas vezes o que Bolsonaro quer economizar, no mesmo período, com uma reforma da previdência voltada para assaltar a aposentadoria do brasileiro mais pobre.
Em 2016, ocorreram 33.346 mortes mais 28.032 casos de invalidez permanente.
Na verdade, essa contabilidade financeira é um tanto cínica, feita por profissionais ligados ao mercado de seguro, porque os custos da morte e da invalidez permanente são incalculáveis.
Ainda no decreto de Bolsonaro, ele quer remover a proibição da cadeirinha de segurança para crianças pequenas.
Outra mudança proposta por Bolsonaro é elevar para 40 pontos, o limite de pontos em que o condutor tem sua carteira suspensa. Durante um evento público em Goiás, hoje, o presidente disse que, se dependesse dele, este limite seria de 60 pontos.
Não há nenhum bom senso nas ações de Jair Bolsonaro.
Um governante responsável, diante da redução expressiva do número de acidentes, e após estudos que comprovassem a elevação do nível de educação dos motoristas, poderia propor o abrandamento das leis de trânsito. Mesmo assim, deveria fazê-lo de maneira muito moderada, com testes, para que não implicasse em retrocesso de conquistas alcançadas. Bolsonaro propõe mudanças perigosíssimas, sem nada que as avalize cientificamente; e num momento em que, ao contrário, a quantidade de acidentes é extremamente elevada.
Se somarmos a isso o fato de que o governo não está fazendo os investimentos necessários na conservação de nossas estradas, que Bolsonaro também propôs a redução de testes toxicológicos para “motoristas profissionais”, e apenas nos resta constatar que ingressamos em tempos muito perigosos para todos nós.