Greve geral na Argentina desgasta governo Macri e favorece Cristina Kirchner
Publicado em 29-05-2019
Modificado em 29-05-2019 em 11:57
As centrais sindicais argentinas fazem, nesta quarta-feira (29), a quinta greve geral contra a política econômica do presidente Mauricio Macri, mas a primeira abertamente a favor do retorno de Cristina Kirchner ao poder.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
A greve geral que paralisa a Argentina desde a meia-noite desta quarta-feira conseguiu a adesão de todos os sindicatos importantes, principalmente os responsáveis pelo transporte público e pelos bancos. Além dos sindicatos, organizações sociais e partidos de esquerda bloqueiam avenidas e acessos à capital argentina.
O resultado é uma paisagem urbana desértica. Não há ônibus circulando, nem o metrô ou trens funcionam. Todos os voos foram cancelados. Não há aulas. Os hospitais funcionam em regime de plantão.
Também pararam os setores que dependem de transporte, como o da coleta de lixo ou os funcionários que abastecem os caixas eletrônicos com dinheiro.
Para aqueles que ousarem funcionar, uma advertência já foi dada, preventivamente: cinco ônibus foram incendiados nas horas prévias à greve. “As máfias já estão agindo”, acusou a ministra da Segurança, Patricia Bullrich.
Objetivos da greve
A paralisação visa atacar uma situação econômica angustiante: inflação de 50% ao ano, taxas de juros de referência em torno de 70%. Porém, mais do que a clássica reivindicação salarial, a greve é também político partidária: os líderes sindicais jogam abertamente a favor de alguma alternativa opositora ligada ao peronismo nas próximas eleições de outubro.
“Vamos trabalhar para consolidar o peronismo como alternativa política”, anuncia o secretário-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), Héctor Daer.
Historicamente, os sindicatos argentinos respondem ao peronismo com atitudes dóceis e bloqueiam o normal andamento dos governos não-peronistas com repetidas greves.
Enquanto gozou de popularidade durante os dois primeiros anos de governo, Mauricio Macri buscou recortar o poder dos líderes sindicais e ensaiou uma reforma trabalhista que não avançou. A Justiça, por outro lado, passou a investigar sindicalistas cujo patrimônio é incompatível com a atividade.
No último ano, com a queda vertiginosa da popularidade de Macri associada às dificuldades fiscais, que levaram o país a um acordo de déficit zero com o FMI, o sindicalismo reagrupou-se contra o governo, amparado na forte perda do poder aquisitivo a partir de reajustes salariais que não acompanharam a velocidade de uma inflação que duplicou.
Apesar da turbulência econômica, o sindicalismo não esconde outro objetivo da greve: o de desgastar o governo Macri rumo às eleições de outubro, nas quais o presidente tentará a sua reeleição enquanto a ex-presidente Cristina Kirchner tentará o seu regresso, agora como vice-presidente. Os sindicalistas já fizeram a sua opção e tentam, inclusive, ter influência na escolha dos candidatos a legisladores.
Sindicatos apoiam Alberto Fernández
Héctor Daer, da CGT, prevê que o sindicalismo reagrupe-se em torno da candidatura de Alberto Fernández para presidente e de Cristina Kirchner para vice.
“Esta greve é contra a política econômica do governo, decidida pelo FMI, que beneficia o setor financeiro”, atacou Daer, ressaltando a saída: “Tem de haver outro governo que discuta outro plano com o FMI. Eu e a imensa maioria dos trabalhadores vamos apoiar a chapa Fernández-Fernández (Alberto Fernández e Cristina Fernández de Kirchner)”.
A ex-presidente enfrenta dez processos, a maioria por corrupção. Há dois pedidos de prisão preventiva, confirmados pela Justiça em segunda instância, que só não são executados devido à imunidade parlamentar, privilégio do seu atual cargo como senadora.
“É preciso parar um pouco com essa coisa de julgar primeiro na imprensa e depois esse julgamento não tem correlato nos tribunais”, defendeu Héctor Daer.
Publicado no RFI Brasil