Sussurra-se em Brasília que a última reunião ministerial do governo Bolsonaro foi tensa.
– Bom, pessoal, essa história da briga entre mestre Olavo e os meus subordinados fardados já encheu o saco e… Depois você protesta, Santos Cruz, respeita o seu comandante, por favor. Como eu ia dizendo, precisamos mudar a pauta. Pra isso, nada melhor do que mais um corte de gastos. A mídia apoia e a esquerda pira. Eu e o Paulo Guedes ficamos na dúvida sobre onde cortar e por isso convoquei essa reunião.
– Chefe, antes de mais nada, vamos fazer uma selfie? Tô criando uma conta no Instagram e quero inaugurar com uma foto ao seu lado, como prova da minha lealdade. Inclusive circulei a data do jornal de hoje aqui, a gente pode tirar a foto segurando o jornal. Quero ver falarem que eu não entendo nada de provas agora…
– Porra, Moro, ainda nessa história de redes sociais? Você tá querendo mesmo concorrer à presidência, é? Vou entregar que você só veio pro governo porque eu prometi indicar você pro STF, hein.
– Não faça isso senhor presidente, por favor. E não duvide da minha lealdade, todos sabem da minha conduta perfeitamente ética e…
– Pra cima de mim não, Moro. De qualquer forma, cortar do Ministério da Justiça pegaria mal. Quem sabe a gente corta de um ministério desses que ninguém dá bola… Damares?
– Senhor presidente, depois dessa polêmica sobre a Frozen eu tive uma ideia: contratar uma equipe de investigadores para analisar todos os desenhos animados que são transmitidos no país e descobrir indícios de incentivo à depravação gayzista. Vou inclusive precisar de mais orçamento para cumprir essa importante tarefa.
– Bom, Damares, muito bom. Ótima iniciativa. Viram? É esse tipo de atitude que eu espero dos meus ministros. Ei, Moro, larga o celular e presta atenção aqui, talquei? Depois a gente conversa com o Paulo Guedes e vê se sai esse aumento do seu ministério, Damares.
– Nem pensar!
– Porra, não precisa gritar, Paulo. Tá nervoso? Tá bom, tá bom, nada de aumento orçamentário. Precisamos cortar. Ricardo Salles, que tal fazer este pequeno sacrifício em prol da nação, da família tradicional brasileira e do mercado financeiro?
– Muito me honraria, senhor presidente, mas estou iniciando uma empreitada que vai exigir altos recursos. Os ex-ministros do Meio Ambiente se uniram contra nós. Meu plano de ação é o seguinte: contratar os melhores advogados do Brasil para processá-los por fazerem uma oposição ideológica e contra o Brasil!
– Ótima ideia, Salles, ótima ideia. Eu não aguento mais tanta ideologia, eles querem acabar com o país com esse tanto de ideologia. Vá em frente. Vamos ver… Marcos Pontes, que tal você?
– Estamos sem papel higiênico e sabonete no Ministério da Ciência e Tecnologia há mais de mês, presidente. Não tem onde cortar. Precisamos, inclusive, repor o nosso orçamento, porque…
– Nem vem! Você não trabalhou na Nasa? Se vira, po! É muito mimimi, você é ministro de Estado, astronauta, vai chorar pro presidente da República por causa de um probleminha desses? Vamos ver… Tereza Cristina?
– O pessoal do agronegócio já tá bem puto com o governo, presidente. As ações dos seus filhos nas questões que envolvem Israel e Estados Unidos pegaram mal e…
– Já disse pra ninguém falar dos meninos aqui, talquei!? Deles cuido eu. Bom, sobrou a educação. Uaitrabi, Uentrabe… Porra de nome difícil hein, mas vai ser na sua pasta, ministro!
– Estou à disposição, senhor presidente! Essas universidades só servem para fazer agitação e balbúrdia, mesmo. E só passa nos cursos quem se alinha ideologicamente ao marxismo globalista. Eu mesmo tirei notas baixas porque…
– Ninguém se importa, Uentrube. Mas não vai ter chiadeira? Não queremos criar confusão também, protestos, greve, essas coisas de vagabundo, isso daí pode enfraquecer o governo…
– Não vai dar nada, presidente. Inclusive acabei de bolar uma apresentação com chocolates aqui para explicar os cortes didaticamente. Com certeza o pessoal vai compreender.
– E hoje em dia o que conta mesmo é o número de robôs nas redes né? Quer dizer, de apoiadores. Enfim, manda brasa nisso daí então, talquei? Estão dispensados. Acorda aí, Moro, acabou a reunião. Cara folgado…
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Às ruas!