O Datafolha foi a campo no início de abril, para uma pesquisa sobre a Lava Jato que não recebeu a devida atenção dos blogs políticos.
É, no entanto, uma pequena joia, que nos ajuda a entender, por exemplo, o processo eleitoral com muito mais objetividade do que esses comentários superficiais sobre “mamadeira de @#$&”.
A pesquisa indica que o entendimento sobre a Lava Jato jogou um papel muito mais importante do que as fake news.
E o que diz a pesquisa?
Em primeiro lugar, que a maioria da população – 61% – apoia a Lava Jato; 18% consideram que a operação está fazendo um trabalho regular; e os restantes 18%, que seu trabalho é ruim/péssimo.
Entretanto, quando se estratifica o resultado, deparamo-nos com diferenças profundas na opinião popular.
Entre eleitores declarados de Bolsonaro no segundo turno, por exemplo, o apoio à Lava Jato é de 74% (ótimo/bom), ao passo que, entre eleitores de Haddad, o percentual de ótimo/bom dado à Lava Jato é de 44%.
A diferença fica mais clara quando se olha para quem deu nota “ruim/péssimo” para a Lava Jato. Entre eleitores de Bolsonaro, apenas 11% deram nota ruim/péssimo para a Lava Jato, enquanto 26% dos eleitores de Haddad deram nota baixa à operação.
Entre eleitores que anularam ou votaram em branco, o apoio à Lava Jato fica num relativo meio termo entre os dois pólos: 54% deram ótimo/bom à operação, 24% regular e 17% ruim/péssimo.
O apoio à Lava Jato parece ainda bastante atrelado à aprovação do presidente. Entre os que avaliam o seu governo como “ótimo/bom”, 78% dão ótimo/bom à Lava Jato, ao passo que os que avaliam o seu governo como ruim/péssimo, apenas 39% deram a mesma nota boa para a Lava Jato.
Já entre quem avalia o governo como ruim/péssimo, um total de 30% não gosta da Lava Jato, três vezes mais do que o percentual de 10% dos entrevistados que gostam de Bolsonaro mas não da Lava Jato.
Essa relação de afinidade entre o eleitor de Bolsonaro e a Lava Jato é fácil de entender: o presidente se elegeu como o candidato mais claramente identificado como de oposição ao PT e anti-política, ao passo que o PT era visto como a legenda mais implicada nos escândalos de corrupção revelados pela Lava Jato, tendo o seu candidato em quase todo o primeiro turno, Lula, condenado e preso pela própria Lava Jato. Depois da vitória, Bolsonaro explorou essa afinidade entre seu eleitorado e a Lava Jato, convidando o juiz Sergio Moro, responsável pelos atos mais notórios da operação (incluindo a condenação e prisão de Lula), para o ministério da Justiça e Segurança Pública.
Na tabela abaixo, com a estratificação por gênero, idade, escolaridade e renda familiar, identificamos igualmente elementos que explicam a psicologia do voto em 2018.
Os eleitores de renda média, ou seja, justamente aqueles que desenvolveram maior rejeição ao PT, são os que mais aprovam a operação Lava Jato. Na verdade, entre todas as faixas de renda o apoio à Lava Jato é forte; apenas entre famílias que ganham menos de 2 salários, porém, há um percentual razoável (23%) de pessoas que dão nota baixa à operação.
Entre famílias que ganham entre 2 e 5 salários, temos 65% de ótimo/bom para a Lava Jato, percentual que cresce para 73% nas faixas superiores.
Nas colunas por idade, o apoio é mais disperso, mas nota-se um aumento expressivo do apoio à Lava Jato a partir dos eleitores com mais de 35 anos.
A Lava Jato é muito mais apoiada entre homens (71%) do que entre mulheres (52%), o que também pode ser relacionado ao resultado eleitoral, visto que Bolsonaro tinha muito mais votos junto ao público masculino do que entre mulheres. Apenas 12% dos homens consideram o trabalho que a Lava Jato está fazendo ruim/péssimo, ao passo que, entre mulheres, esse percentual é quase o dobro, 23%.
Na coluna de escolaridade, há uma relação clara entre os níveis de instrução e o apoio à Lava Jato. Eleitores com ensino médio e/ou superior dão muito mais apoio à operação do que os que tem até o ensino fundamental, o que também se pode relacionar ao resultado eleitoral, visto que as pesquisas sempre indicaram que a rejeição ao PT crescia entre as classes mais instruídas.
Na divisão por ocupação, vale destacar o fortíssimo apoio dos empresários (85% de ótimo/bom e apenas 6% de ruim/péssimo) à Lava Jato. Entre as ocupações onde há um pouco mais de crítica à Lava Jato, poderíamos destacar o funcionalismo público (19% de ruim/péssimo), estagiários (27% de ruim/péssimo), donas de casa (25% de ruim/péssimo), profissionais liberais (28% de ruim/péssimo) e, ironicamente, brasileiros que vivem de rendas (29% de ruim/péssimo). Mas todas as ocupações dão um apoio bastante expressivo à operação.
Na divisão por cor e religião, nota-se uma diferença razoável entre pretos e brancos, e que também pode ser relacionada às votações respectivas de Bolsonaro e Haddad no segundo turno das eleições de 2018. 66% dos brancos consideram que a Lava Jato está fazendo um trabalho ótimo/bom, percentual que cai para 55% quando a mesma pergunta é feita aos pretos.
Nas colunas de religião, o único segmento com alguma crítica significativa à Lava Jato é o dos brasileiros agnósticos ou sem religião.
A tabela abaixo traz a estratificação por região, natureza do município e partido de preferência.
Nela, pode-se ver um padrão eleitoral evidente. O nordeste, região onde Haddad venceu, é o espaço mais crítico à Lava Jato, embora a maioria dos nordestinos ainda apoie a operação.
No Nordeste, 53% consideram que a operação está fazendo um trabalho ótimo/bom, ao passo que, no Sul, este percentual explode para 69%.
Segundo o Datafolha, 23% dos nordestinos deram nota ruim/péssimo para a Lava Jato, enquanto que, no Sul, apenas 13% avaliaram mal a operação.
As colunas dos partidos de preferência evidenciam a profunda clivagem ideológica por trás da percepção da Lava Jato. Entre os que marcaram o PSL, partido de Bolsonaro, como seu preferido, 91% consideram que a Lava Jato está fazendo um ótimo/bom trabalho, e apenas 3% deram nota ruim/péssimo à operação. Já entre eleitores do PT e do PSOL, os números são radicalmente diferentes. Entre petistas, temos 43% de ótimo/bom e 29% de ruim/péssimo, e entre psolistas, 28% de ótimo/bom e 28% de ruim/péssimo.
Entre brasileiros sem nenhum partido (maioria absoluta da população), a balança é favorável à Lava Jato: 62% consideram que a operação faz um trabalho ótimo/bom e apenas 16% ruim/péssimo.