O ministro das relações exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, passou a apregoar a tese de que o nazismo é de esquerda.
Fez isso primeiramente na entrevista que deu ao blog Brasil Paralelo. Diante da repercussão negativa, inclusive da imprensa pública alemã, o ministro fincou pé e insistiu, publicando um texto em seu blog para reiterar sua opinião.
Naturalmente, este é um daqueles assuntos que não ajudará o Brasil a gerar um mísero emprego.
É um tremendo papo de maluco. Difícil entender o que o ministro imagina ganhar (para si e para sua gestão como chanceler da terceira maior democracia do mundo) defendendo uma tese tão prodigiosamente idiota.
Entretanto, como se trata do nosso ministro de relações exteriores, a sua palavra tem um peso, especialmente diante de uma sociedade que, pela baixa qualidade de sua educação, é muito vulnerável à todo tipo de picaretagem intelectual.
Então lá vamos nós a rebater a teoria do ministro, ponto a ponto. Meus comentários estão entre colchetes e em negrito.
Publicado no blog Metapolítica
Pela aliança liberal-conservadora
A esquerda fica apavorada cada vez que ressurge o debate sobre a possibilidade de classificar o nazismo como movimento de esquerda. Dá a impressão de que existe aí um perigoso segredo de família, cuidadosamente guardado. Eu opinei que o nazismo é de esquerda, e imediatamente a esquerda (junto com o mainstream por ela dominado sem o saber) chegou correndo com seus extintores de incêndio, ou melhor, seus extintores de verdade, tentando apagar essa ideia.
[Em primeiro lugar, ao nomear, de maneira tão peremptória, uma entidade chamada “esquerda”, que teria ficado “apavorada” com sua teoria, o ministro deixa claro uma consciência paranoica e um profundo déficit cognitivo. Usa-se o termo “esquerda” para se referir, em termos muito gerais, a uma imensa gama de visões de mundo. O prefeito de Nova York, o democrata Bill de Bilasio, é considerado um homem de esquerda dentro do contexto norte-americano, assim como a prefeita de Paris, a socialista Anne Hidalgo, pode ser classificada como uma política de esquerda. Mas certamente o pensamento de ambos não tem nada a ver com a filosofia política dos bolivarianos da Venezuela (digo isso sem julgamento de valor) ou com a ditadura da Coreia do Norte.
Léon Homo, num livrinho sensacional intitulado “Les institutions politiques romaines” (as instituições políticas romanas), aplica generosamente o termo “esquerda” para designar não apenas as agitações plebeias e populares da antiga república romana, como também os setores progressistas e liberais da própria nobreza.
Toda a grandeza romana nasce dessas agitações, porque são elas que irão, paulatinamente, modernizar e consolidar o quadro institucional do país (e, mais tarde, do mundo inteiro), com o surgimento da figura dos tribunos (os ancestrais políticos de nossos deputados) e o estabelecimento de leis escritas.
Aliás, este é um ponto que nos remete a alguns problemas que se repetem nos dias de hoje. Como havia regras que restringiam os cargos judiciais apenas para membros dos “optimates”, ou patrícios, que eram as famílias nobres de Roma, os plebeus, através de suas vanguardas políticas e intelectuais, foram percebendo a necessidade de uma constituição escrita, para reduzir o poder discricionário dos magistrados. E assim nasceu a Lei das 12 tábuas, que foi proposta pelo tribuno plebeu Gaio Terenzilio Arsa, no ano de 462 antes de Cristo.
É curioso constatar que as primeiras e mais conhecidas constituições escritas do mundo antigo, como as 12 Tábuas romanas e o Código de Hamurabi, continham algumas linhas de caráter expressamente popular e democrático.
Na Tábua 9 da antiga lei romana, por exemplo, constava uma frase que poderia tranquilamente ter sido pronunciada dois mil anos depois por um revolucionário francês: Privilegia ne irroganto, que significa (não se espantem pela tradução extensa, o latim era incrivelmente sintético): “não devem ser propostas leis privadas em favor de um cidadão”.
Era uma das primeiras leis escritas da humanidade contra os privilégios e em favor de um sentido republicano e igualitário para uma constituição!
Uma outra lei, no artigo 3 da mesma Tábua 9, dizia que “Se um juiz ou um árbitro indicado pelo magistrado receber dinheiro para julgar a favor de uma das partes em prejuízo de outrem, que seja morto.”
No caso do Código de Hamurabi, que ajudou a trazer estabilidade política por muitas décadas ao império babilônico, os primeiros artigos já deixam bem claro que um de seus principais objetivos era reduzir o poder dos juízes, desde sempre a encarnação mais perigosa do Estado (porque é o juiz que pode, através de uma sentença, tirar a vida, a liberdade ou a propriedade do cidadão).
A primeira lei do Hamurabi:
§ 1 Se um homem acusa outro homem e lhe imputa um homicídio, mas não pode trazer provas contra ele, o acusador será executado.
Quarta ou quinta lei de Hamurabi:
Um juiz deve julgar um caso, alcançar um veredito e apresentá-lo por escrito. Se erro posterior aparecer na decisão do juiz, e tal juiz for culpado, então ele deverá pagar doze vezes a pena que ele mesmo instituiu para o caso, sendo publicamente destituído de sua posição de juiz, e jamais sentar-se novamente para efetuar julgamentos.
Fiz essas digressões todas para ilustrar um ponto: todas as conquistas políticas e jurídicas da civilização humana nasceram do entrechoque de interesses, entre as massas de poucas posses e as elites econômicas; o conceito de “esquerda” pode ser aplicado às formas de pensar favoráveis à expansão dos direitos populares.
Mas voltemos ao texto do chanceler. A infantilidade do ministro é patológica. Em sua paranoia, ele atribui à esquerda um tamanho muito maior do que ela tem, a ponto de afirmar que ela domina “sem o saber” o mainstream (ou seria o mainstream que não sabe ser dominado pela esquerda?). Trata-se da visão lisérgica do Olavo de Carvalho, para quem existe um grande complô esquerdista mundial, no qual ele inclui os bilionários que não rezam na cartilha do Tea Party, a indústria de Holliwoood, a ONU e quase toda grande imprensa comercial.
Eu avisei: é papo de maluco.]
Porém os extintores de verdade já estão ficando secos e os inibidores de pensamento já não funcionam.
[hehehe, Araújo lacrou. Não importa que virtualmente ninguém relevante, em todo o planeta Terra, tenha concordado com seu ponto-de-vista sobre o nazismo. Ele é louco mas é feliz.]
Livres dessa inibição, podemos facilmente notar que o nazismo tinha traços fundamentais que recomendam classificá-lo na esquerda do espectro político. O nazismo era anti-capitalista, anti-religioso, coletivista, contrário à liberdade individual, promovia a censura e o controle do pensamento pela propaganda e lavagem cerebral, era contrário às estruturas tradicionais da sociedade. Tudo isso o caracteriza como um movimento de esquerda.
[O nazismo não era anti-capitalista. Somente um imbecil diria uma coisa assim. Tanto que todas as grandes corporações industriais alemãs irão se beneficiar sobejamente do regime. O nazismo cresce na Alemanha com forte financiamento dos grandes empresários e capitalistas alemães e apoiado pelos setores mais reacionários (ou seja, de direita) da sociedade, que estavam muito aflitos com a disseminação das ideias socialistas. Desde o início do século XX, os partidos socialistas estavam obtendo muitas vitórias políticas em toda a Europa. Na Rússia, durante séculos o país mais atrasado e mais reacionário da Europa, eclodira a primeira revolução comunista da história, em 1917. Na Alemanha, os socialistas governavam o país desde o fim da I Guerra, sob a nova e frágil república de Weimar. O nazismo se consolida essencialmente como uma ideologia anticomunista e antissocialista. Os discursos de Hitler tinham muito mais impropérios contra socialistas e marxistas do que contra judeus, até porque eram os primeiros que tinham força política.
Durante séculos, a Igreja Católica patrocinou censura, controle de pensamento e lavagem cerebral, em quase todo o mundo ocidental, mas merece uma camisa de força quem afirmar que isso a caracterizava como um movimento de esquerda…
Quanto à liberdade individual, o chanceler deveria se lembrar que as lutas por direitos individuais, inclusive aquele nunca lembrado pela direita, o direito de se alimentar, marcou a luta da “esquerda” desde a revolução francesa. O rei francês que mandou trancafiar Voltaire na Bastilha também promovia censura e atacava as liberdades individuais. Ele era de esquerda?
A revolução francesa que consagrou definitivamente uma nova era de liberdade individual foi um movimento, aí sim, de esquerda. Ou o nosso excêntrico chanceler pensa diferente?]
Portanto, o nazismo era anti-liberal e anti-conservador. A esquerda também é anti-liberal e anti-conservadora. Já a direita foi em alguns casos anti-liberal (durane o Século XIX na Europa, por exemplo), em outros casos anti-conservadora (ou pelo menos não-conservadora, indiferente aos valores conservadores, como no caso do neoliberalismo recente), mas nunca foi anti-liberal e anti-conservadora ao mesmo tempo. Em tal sentido, o nazismo se sente muito mais confortável no campo da esquerda do que no da direita.
[O nazismo era “anti-liberal”, assim como era toda a direita da época. Vem daí essa confusão semântica insuportável que envolve o termo “liberal”, que durante muito tempo teve um significado muito próximo do que entendemos hoje por “esquerda”, e inclusive até hoje, nos Estados Unidos, é muitas vezes usado como sinônimo de esquerda.
Na tipologia política usada pelo instituto Pew, um dos principais centro de pesquisa nos EUA, usa-se a expressão “solid liberal” (liberal sólido) para designar o cidadão que rejeita Trump e acha que o governo deve ampliar a regulação dos negócios, aumentar o controle sobre armas, ajudar os mais pobres, etc. O “solid liberal” é o equivalente nosso para “esquerda”, ou “centro-esquerda”.
Depois de resumir num parágrafo curto, com o brilhantismo de uma gaivota, todas as complexidades e ambiguidades do século XX, Araújo conclui que o nazismo “se sente muito mais confortável no campo a esquerda do que no da direita”. Bem, todos os social-democratas, liberais, socialistas, comunistas, livre-pensadores, que foram perseguidos pelo nazismo justamente por sua posição de esquerda, não se sentiram tão confortáveis assim… Seria também interessante analisar a razão pela qual a extrema-direita alemã, e do mundo inteiro, tinha (e tem até hoje) tanta admiração pelo nazismo. ]
De maneira esquemática, podemos dizer que o nazismo constituiu um amálgama esquerdista-conservador, onde a ideologia revolucionária capturou e utilizou para seus fins um dos importantes elementos do campo conservador, o nacionalismo.
[Amálgama esquerdista-conservador… Araújo é positivamente um idiota. Mas a sua forma de pensar esconde (não acho que ele perceba, é burro demais para isso) um anseio totalitário de possuir o monopólio da verdade, mesmo que isso implique no “duplipensar”, para usar a expressão da terrível ditadura mostrada no romance 1984, de George Orwell. Com essa forma de pensar, pode-se afirmar virtualmente qualquer coisa: o governo Bolsonaro, por exemplo, é um amálgama nacionalista-entreguista…
Quanto ao nacionalismo, ele nunca pertenceu ao campo conservador, senão teríamos que chamar a União Soviética, a Cuba revolucionária, e o regime Maduro de “conservadores”.
Perón foi conservador? Vargas foi conservador? Jango foi conservador? Brizola foi conservador? Todos eles foram profundamente nacionalistas, ah, então eles devem ter sido um amálgama “esquerdista-conservador”…
A lógica do chanceler é de uma criança de seis anos que conseguiu ler Olavo de Carvalho. Tudo de mau é esquerda, tudo de bom, de direita. Lex Luthor, a Cuca, bicho papão, o Esqueleto, o Jason, são de esquerda, e o Superhomem, o Batman, Jesus e Angelina Jolie são de direita…]
Não podemos esquecer que o resultado final do conflito mundial desencadeado pelo nazismo foi excelente para a esquerda: um mundo em grande parte dominado pelo comunismo e uma cisão completa entre direita liberal e direita conservadora, com esta última humilhada e demonizada. O nazismo, tanto em sua ascensão quanto em sua derrocada, praticamente esfacelou as potências liberais da Europa Ocidental e seus impérios, abrindo caminho para o totalitarismo comandado pela URSS (aliada de primeira hora da Alemanha Nazista) e sua expansão mundial, que colocou em cheque e quase derrotou a única potência não-comunista restante, os Estados Unidos. Impossível saber se foi tudo planejado, possivelmente não, mas o impulso e a forma geral desse gigantesco movimento – o nazismo como ponta de lança do movimento revolucionário comunista – parece bastante visível, tal como apontava Hayek.(*)
[A nossa inteligência de gaivota entende que o nazismo foi “excelente” para a esquerda, o que significa que as centenas de intelectuais de esquerda cujas vidas foram destruídas pelo nazismo deveriam ter batido palmas e defendido Hitler. Os nazistas mataram 24 milhões de russos. A Rússia foi, de longe, o país mais devastado, em perdas materiais e humanas, pelo nazismo alemão. Se a União Soviética consegue se recuperar em seguida, isso se deu porque tinha uma economia planejada e realizou grandes investimentos públicos para se tornar uma potência industrial. Mencionar a “aliança” entre a URSS e a Alemanha nazista, sem explicar o que aconteceu depois, é uma desonestidade pueril. A insanidade de Araújo alcança os píncaros da glória quando sugere (“impossível saber se foi tudo planejado, possivelmente não”) que a ascensão nazista teria sido uma conspiração soviética para derrotar as potências liberais. Philip Dick, no romance o Homem do Castelo Alto, imagina um mundo onde a Alemanha venceu a II Guerra, e ocupa os Estados Unidos, toda Europa e o mundo inteiro. Se tivesse conhecido Araújo, este poderia ter lhe soprado essa outra história mirabolante.
A citação de Hayek, um dos monstros sagrados dessa amálgama de conservadorismo-idiotismo da turma do Araújo, é um caso interessante. Araújo a pega emprestada de um post delirante de um americano chamado Paul H Jossey, que tem 213 seguidores no Medium. Eu li o post. É tão idiota quanto o texto de Araújo. Foi publicado em 25 de setembro de 2018 e obteve, até hoje, 98 curtidas. Tem 4 comentários. O primeiro comentário apareceu em novembro, meses depois da publicação. O segundo comentário é do próprio autor, agradecendo o primeiro comentarista por ter lido o texto. O terceiro e o quarto são críticos. Jossey não é um intelectual. É um advogado especializado em arrecadação eleitoral que aparentemente trabalhou para o Tea Party, e que tem 2 mil seguidores no twitter. Hoje ele tem uma pequena consultoria para ensinar a fazer crowdfunding.
O mais curioso – quase divertido – é que a citação de Hayek mencionada por Jossey e usada por Araújo é apócrifa. Jossey afirma que Hayek a escreveu em 1933, mas não diz onde, em qual livro, artigo ou entrevista. Poderíamos pensar que é algo escrito em Estrada para Servidão, o clássico de Hayek contra o socialismo, mas este foi escrito entre 1940 e 1943, e publicado em 1944.
Mais bizarro ainda é que Jossey interpreta de maneira completamente enviesada o texto supostamente escrito por Hayek. A citação é essa:
[I]t is more than probable that the real meaning of the German revolution is that the long dreaded expansion of communism into the heart of Europe has taken place but is not recognized because the fundamental similarity of methods and ideas is hidden by the difference in phraseology and the privileged groups.
Do jeito que Jossey argumenta, parece ao leitor que Hayek usou a expressão German revolution (revolução alemã) para se referir à ascensão do nazismo. É assim que Araújo também irá interpretar.
Mas não é. German revolution é uma expressão consagrada pela historiografia (e isso desde a época de Hayek) para designar o movimento que derrubou a monarquia alemã e inaugurou a república, ao final da Primeira Guerra, em 1918. Ou seja, não tem nada a ver com o nazismo. Hayek, se é que essa frase é dele, se referia à ascensão da social-democracia alemã, da qual ele é crítico (pois era um conservador) e na qual ele via como uma primeira etapa para o comunismo. Isso faz muito mais sentido, porque reflete o pensamento de Hayek, muito focado em combater o socialismo pela raíz, desde os seus primórdios.]
O comunismo só pôde ser derrotado quando surgiu um poderoso amálgama liberal-conservador na figura de Ronald Reagan. Essa combinação entretanto foi efêmera e, logo após o fim da URSS, começou a dar lugar ao amálgama esquerdista-liberal, o globalismo, onde a ideologia revolucionária, por meio do marxismo cultural, sequestrou a globalização econômica e começou a pilotá-la.
[Esse trecho dá calafrios, porque se percebe claramente o viés realmente psicótico de Araújo. Achar que a “ideologia revolucionária” e o “marxismo cultural” sequestraram a globalização econômica é uma paranoia tão vulgar e idiota que beira o artístico. É como se Araújo fosse um personagem de um romance fantástico. Considerar que um mundo dominado por bancos e fundos, onde a concentração financeira nunca foi tão grande, tem alguma coisa a ver com “ideologia revolucionária” é a opinião de uma pessoa positivamente esquizofrênica.
E aí ele cita Ronald Reagan, o superheroi das bolsominions. Uma curiosidade: você sabia que Ronald Reagan, em 15 de junho de 1967, enquanto governador da California, assinou uma das primeiras leis de liberação do aborto dos Estados Unidos? Apenas em 1973, com o famoso caso Roe v. Wade, o aborto seria descriminalizado em todo os Estados Unidos. ]
Quebrar o amálgama esquerdista-liberal e substituí-lo por um novo amálgama liberal-conservador é talvez a grande tarefa de nosso tempo, pelo menos a tarefa dos amantes da liberdade e dos defensores da dignidade e da profundidade humana.
[Quebrar o amálgama esquerdista-liberal… Essa é a “grande tarefa do nosso tempo”, pelo menos para os defensores da “profundidade humana”.]
Mas é mesmo possível uma direita que seja ao mesmo tempo liberal e conservadora? O que está surgindo no Brasil e em outros países com outros formatos mas o mesmo espírito, como na Polônia, na Hungria e nos EUA de Trump, é justamente isso, o amálgama liberal-conservador, onde o anseio de uma economia aberta e a defesa das liberdades individuais se somam à promoção dos valores do patriotismo, da fé e da família.
[Trump está fechando a economia americana. Economia aberta é só para os trouxas de terceiro mundo.
O economista coreano Ha-Joon Chang Capa publicou um livro, com o título sugestivo de Chutando a Escada, com provas de que as economias desenvolvidas adotaram políticas de proteção às suas indústrias, e somente após consolidarem-se globalmente, começaram a desmontar essas proteções.
Quanto ao “patriotismo” mencionado pelo chanceler, eu queria saber onde isso se encaixa com a política de entrega de todas as nossas riquezas, ferro, petróleo, indústrias, aeroportos, para estrangeiros. Até mesmo o trigo nacional está sendo preterido pelo governo brasileiro, em prol do trigo norte-americano. Onde esse patriotismo se materializará?
Repare ainda como ele se refere aos EUA: os EUA de Trump. É muito louco um chanceler se alinhar dessa maneira a uma corrente partidária estrangeira. Uma relação com outro país deve ser construída para o longo prazo, e por isso a diplomacia brasileira precisa estabelecer relações com as diversas forças e correntes de opinião que compõem o sistema político norte-americano. Sem essa neutralidade, agradamos apenas a uma parte do país e mesmo assim, de uma maneira enviesada, subserviente, o que abaixa muito o nosso preço.]
A esquerda brasileira e mundial entra em pânico diante desse amálgama e por isso o ataca tão visceralmente, pois o reconhece como seu grande adversário: enquanto lutar somente contra o liberalismo ou somente contra o conservadorismo, a esquerda sempre levará vantagem, e portanto é isso que ela quer. A liga liberal-conservadora produz um aço firme, capaz de enfrentar a esquerda mesmo com o domínio que esta criou sobre a mídia e a academia.
[Esquerda brasileira e mundial… A maneira de pensar de Araújo é muito estranha para um diplomata. Um diplomata precisa aprender a conviver com governos, partidos e forças das mais diferentes correntes. Precisa saber conversar respeitosamente com a China, países árabes, relacionar-se com islâmicos, com regimes de esquerda e direita, com democracias e ditaduras. Esses comentários agressivos, essa visão schmittiana de transformar a “esquerda”, e ainda mais uma esquerda ampliada paranoicamente, uma esquerda que domina o mainstream… em inimigo político a ser abatido, são o contário do que se espera de um diplomata, e mais ainda do chanceler da, repito, terceira maior democracia do mundo!]
A força dessa liga provém, talvez, do fato de que ele corresponde à essência do ser humano, que quer ao mesmo tempo liberdade e segurança, prosperidade e orgulho de si mesmo, paz e aventura, alegria e transcendência.
[Todo mundo quer isso, Araújo, desbunda logo!]
Essa direita liberal-conservadora nada tem de “extrema”. Ela é extrema apenas no sentido de que se opõe à esquerda ao longo de todo o espectro do pensamento político, indo desde a defesa das virtudes da economia de mercado e do empreendedorismo até a defesa da vida a partir da concepção e de uma visão espiritualizada do ser humano.
No Brasil, hoje, tudo o que a esquerda quer é estrangular, ainda no berço, a aliança liberal-conservadora. A esquerda instiga a divisão e sonha em ver os liberais destruírem os conservadores, em nome da governabilidade ou da moderação, para em seguida poder ela própria derrotar os liberais com a habitual facilidade. Esse sonho da esquerda é o pesadelo do Brasil. Não podemos voltar ao pesadelo, depois de ter aberto os olhos, há tão pouco tempo, para a realidade da esperança.
[Esse último comentário é o único que mantém uma pálida relação com a realidade. De fato, é interessante para a esquerda manter conservadores e liberais divididos, assim como interessa à direita manter as diferentes correntes da esquerda igualmente separadas e desorganizadas. Mas essa separação entre liberais e conservadores não é feita pela “esquerda”. É que conservadores tem valores contrários aos liberais. A união é mantida artificialmente, pelo interesse econômico. Acontece que para isso dar certo, não basta ser útil apenas para os bolsos de meia dúzia de operadores da bolsa e bancos. O próprio populismo de direita apregoado por Steve Bannon, e adotado por Trump, nos EUA, e por Victor Orbán, na Hungria, pressupõe, como o nome diz, políticas públicas voltadas para elevação do nível de emprego e aumento dos salários. Sem emprego, o governo Bolsonaro vai naufragar. Mas é capaz de Araújo ir embora antes disso. O caso dele me parece que vai além da questão política. O cara tem problemas.]