Abundam, no governo Bolsonaro, símbolos do poço de atraso no qual o Brasil vai despencando – sem previsão de encontrar o fundo. Um dos mais emblemáticos é o fato de os filhos do presidente serem assunto permanente no debate público.
Um desavisado poderia muito bem pensar que a monarquia voltou e estamos sob o jugo da dinastia Bolsonaro.
Carlos é o relações públicas. Com seu português, digamos, peculiar, é capaz de causar terremotos nos centros de poder do país a golpes de twittadas.
Seu pai, o presidente, afirmou que seguirá ouvindo suas sugestões de atuação nas redes sociais. Diante disso, a previsão meteorológica para os próximos meses é de mais chuvas de dejetos.
Eduardo é o responsável pela área internacional da dinastia. Desde a vitória do pai nas eleições ele participa de articulações com governos estrangeiros – mais especificamente com o de Trump, ao qual nosso país agora bovinamente se reporta.
Apenas na semana passada a atuação de Bolsonaro ganhou algum verniz de legitimidade, por conta de sua eleição para a presidência da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. Mas é somente o verniz mesmo: suas movimentações remontam a meses e estavam fundadas apenas no parentesco com o dono do poder. Falando em linhagem real, uma piada pronta: o “príncipe” Luiz Philippe de Orleans e Bragança, deputado pelo PSL, é o vice-presidente da comissão presidida por Eduardo Bolsonaro.
Eduardo acaba de defender que os cidadãos dos EUA possam entrar no Brasil sem necessidade de visto e, ao contrário do que faz qualquer nação soberana, sem a exigência de que os EUA concedam a mesma prerrogativa aos cidadãos brasileiros. A justificativa é de tal modo bizarra que vou apenas transcrevê-la, deixando a leitora à vontade para tirar suas próprias conclusões:
A pergunta que eu faço é o seguinte (sic): quantos americanos vão aproveitar essa brecha e vir morar ilegalmente no Brasil? Agora vamos fazer a pergunta contrária: se os EUA permitirem que brasileiros entrem lá sem visto, quantos brasileiros vão para os Estados Unidos, sem visto se passando por turista, e vão passar a viver ilegalmente aqui?
O terceiro elemento do triunvirato familiar é Flávio, senador pelo Rio de Janeiro. Este é o encarregado pela área de movimentações financeiras suspeitas e relações institucionais – ou nem tanto – com milicianos.
A mais recente bomba que envolve Flávio é o resgate de uma desavença pública sua com Pedro Mara, professor e diretor de uma escola carioca, que ocorreu em 2017. Flávio acusou o educador de fazer apologia ao uso de maconha e Pedro o convidou para visitar a escola que dirigia, ironizando o fato de Flávio ter desmaiado em um debate.
Ronnie Lessa, que foi preso sob a acusação de ser o executor de Marielle Franco, pesquisou detalhes sobre o educador logo após o atrito entre os dois. Pedro Mara está deixando o Rio de Janeiro por motivos de segurança.
Ronnie Lessa é vizinho de condomínio de Jair Bolsonaro. Há fartas evidências das ligações de Ronnie com milícias e com o tráfico de armas. Um depósito de R$ 100 mil, feito na conta do acusado sete meses após o assassinato de Marielle, corrobora a forte hipótese de que ele foi contratado para cometer o crime. Flávio Bolsonaro empregava parentes de milicianos em seu gabinete. A família Bolsonaro apoia a atuação das milícias pública e entusiasticamente há anos.
George Orwell e Aldous Huxley ficariam espantados com o grau de surrealismo da distopia dinástica deste Brasil 2019.