Ciro vem sendo atacado, sabotado, xingado, pelo PT desde o início de 2018. Quando eu comecei a escrever minhas primeiras análises sobre o ex-candidato, os petistas (não todos, evidentemente, porém muitos) começaram a atacar também o Cafezinho, e numa escala tal que mais parecia um linchamento.
Isso não parou um minuto desde então.
Durante todo o primeiro turno das eleições presidenciais, o PT voltou todas as suas forças, seus blogs, seus influencers, suas narrativas, contra o Ciro. Jogou sujo com o PCdoB e o PSB, e conseguiram isolar o PDT.
No segundo turno, os influencers e blogs mais vinculados ao PT continuaram atacando o Ciro, e o partido promovia a narrativa de que Ciro teria “fugido”, o que era uma maneira de chantageá-lo politicamente para dar um apoio mais explícito a Fernando Haddad. A narrativa era sempre de demonização de Ciro, mesmo precisando de seus votos.
Os eleitores de Ciro, no entanto, engoliram em seco os ataques e, seguindo sua própria consciência, transferiram em peso seus votos para o PT.
O Cafezinho, por sua vez, disponibilizou toda a sua estrutura para seus colunistas petistas mais militantes usarem-na para fazer campanha para Haddad.
Encerrada a eleição, porém, os ataques não pararam. Nenhum petista disse um “obrigado” ao Cafezinho; ao contrário, continuamos a ser atacados, assim como não foram interrompidos os ataques a Ciro e as tentativas de isolamento e aniquilação política.
Na disputa para a Câmara dos Deputados, ficou claro mais uma vez o jogo sujo. O PSB não se juntou ao “bloco de esquerda” por qualquer tipo de coesão programática. Houve apenas uma tramoia suspeita para repetir o feito do primeiro turno e isolar o PDT “de Ciro”, não importando as consequências.
Tanto não havia coesão que o bloco deu parte de seus votos, “por baixo do pano”, para Rodrigo Maia, ao mesmo tempo em que promoveu ataques políticos ao PDT e ao PCdoB, por serem transparentes e terem feito acordo às claras, à luz do dia, para a eleição do presidente da Câmara.
Paulo Pimenta, líder do PT, na Câmara, fez um ataque sórdido ao bloco do PDT e PCdoB, chamando-o de “fake” num artigo. Ninguém do bloco trabalhista rebateu. Engoliram as críticas em silêncio. A resposta seria dada mais tarde, por Ciro.
Dias após a eleição de Maia, o bloco de esquerda, que seria o único “bloco de oposição de verdade”, conforme diziam integrantes do PSOL e PT, em pronunciamentos agressivos, fez água.
Não era “bloco de oposição de verdade” coisa nenhuma, e sim uma tentativa do PT de manter a hegemonia da oposição. O líder do PSB, Tadeu Alencar, ao explicar a dissolução do bloco liderado pelo PT, disse ter esperança de se juntar ao bloco do PDT e PCdoB.
Na Bienal da UNE, o PT organizou mais um ataque rasteiro a Ciro, uma provocação barata, sabendo que o ponto-fraco do ex-ministro é seu temperamento sanguíneo. A Juventude Petista vaiou, xingou, fez coro Lula Livre, impediu Ciro de falar, o que foi um ataque profundamente antidemocrático. Mesmo se o palestrante fosse João Amoedo, seria importante demonstrar educação e ouvi-lo falar. Havia muita gente querendo ouvir Ciro, não apenas pessoas presentes, mas também nas redes, à distância. Mas não. A tática foi vaiar, agredir e depois se vitimizar. Assim que Ciro explodiu, e gritou a frase famosa de seu irmão, a máquina petista imediatamente começou a agir, tratando de emplacar a narrativa de que Ciro tinha “atacado” Lula, quando o que vimos tinha sido exatamente o oposto.
Todo o establishment petista, seus apoiadores, blogs, influencers, militância, continuam atacando Ciro dia e noite. E atacam a pessoa, não as ideias. Eles fazem questão de omitir que as ideias do trabalhismo, do qual Ciro se tornou o porta-voz, são sofisticadas, progressistas, e que poderiam ajudar o Brasil a derrotar Bolsonaro e a conter a onda de violência e autoritarismo que vem do judiciário.
O trabalhismo poderia ajudar a libertar Lula, mas o petismo prefere continuar apostando na estratégia fracassada da violência retórica, impotente, contra os tribunais. Fazem manifestações de rua para xingar juízes e depois fingem surpresa quando os juízes se irritam e aumentam as condenações.
O judiciário tem que ser atraído para o campo progressista e não ser empurrado para a direita, a golpes de xingamento e ataques retóricos chauvinistas e vazios.
Preferem torrar recursos partidários e sindicais num acampamento, para dar bom dia, boa tarde, boa noite para Lula, ao invés de produzir inteligência, seminários, livros, constrangendo o lawfare. Alguns juristas militantes organizam livros, mas de maneira espontânea, sem a severidade editorial necessária para ações desse tipo, e os seminários que se realizam para lançar os livros se tornam eventos partidários, o que é obviamente contraproducente.
Alguns youtubers lulistas insistem na tese de que todas as ações do PT, desde o primeiro turno, são obra da burocracia do PT, e que Lula teria sido engabelado. Atacam Paulo Pimenta, Gleisi, Haddad, e endeusam Lula. Não faz sentido. Lula ainda comanda o PT com mão de ferro, e todas as decisões do PT vem diretamente de Curitiba. Foi Lula que ordenou o isolamento de Ciro e foi Lula que insistiu em sua própria candidatura, uma decisão política desastrosa, responsável direta pela vitória da extrema-direita no país.
Tudo isso é, evidentemente, um erro estratégico de proporções bíblicas do PT.
Entretanto, ainda mais grave que esse erro é a tentativa de sufocar ideias alternativas, entre elas as que vem do campo trabalhista.
O trabalhismo jamais pensou em abandonar Lula, e sim substituir a liderança por alguém com liberdade. Numa guerra, se o general é preso pelo exército inimigo, imediatamente ele é substituído por outro. Não se trata de abandonar o general preso, mas sim de usar o bom senso. Sem uma liderança livre, capaz de articulação à luz do dia, não se conseguirá vencer nenhuma batalha, tampouco… libertar o general preso.
Mas agora parece que essa fase passou. O PT escolheu seu caminho, que é não fazer nenhuma autocrítica e não permitir que nenhuma liderança, que não seja Lula, possa emergir. Ontem, na festa de 39 anos do PT, o presidente da CUT, Wagner Freitas, e todos os que pegaram o microfone, deixaram bem claro: toda a estratégia política do PT será centralizada em torno do “Lula livre”, e o líder é… Lula. Me perdoem, mas não posso ser complacente com esse tipo de delírio autodestrutivo, que arrasta não apenas o PT, mas todo o campo progressista, e o país todo.
Todos os aliados de Lula e do PT durante todos esses anos que não pactuam com essa estratégia (que vem fracassando miseravelmente, e que continuará fracassando) são tratados como inimigos. Vide o caso do PCdoB, legenda que terá que perder sua timidez e defender sua sobrevivência com mais audácia e virilidade, pensando no bem maior do país e de seus militantes. Cortar o cordão umbilical com o lulismo é difícil, mas necessário. Lula tem de ser hoje defendido de si mesmo e do lulismo sebastianista que o cerca. O mesmo vale para o PSOL, cuja imagem tem ficado muito arranhada por sua leniência e submissão às narrativas mais delirantes do PT.
O PCO, novo “consigliere” do PT, com suas eternas vaquinhas, de centenas de milhares de reais, para financiar uma campanha retórica e vazia em defesa de Lula, é a prova disso. O partido teve microfone aberto no lançamento da candidatura do Lula. E agora, quinta-feira, em São Paulo, na manifestação em apoio a Lula, novamente teve espaço no microfone. Em seu site e em suas “análises semanais” ataca Marcelo Freixo, Boulos, Manuela, além, é claro, de atacar Ciro com extrema virulência; o PCO se dá ao trabalho, até mesmo, de fazer ataques violentos ao Cafezinho. O PCO, capanga do PT, se tornou uma das caras do petismo de hoje.
Diante dessa conjuntura é que se deve entender o posicionamento de Ciro Gomes, expresso na entrevista abaixo, para Bernardo Mello Franco. Algumas verdades são duras, doídas, mas precisam ser ditas.
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Na Coluna de Bernardo Franco, no Globo
Ciro ataca PT e chama Lula de adversário | Bernardo Mello Franco – O Globo
10/02/2019 04:00
Ciro Gomes vai à guerra. Terceiro colocado na corrida presidencial, ele pretende liderar a oposição ao governo Bolsonaro. Não está disposto a dividir espaço com o PT, que agora descreve como adversário direto.
Na quinta-feira, o pedetista reapareceu em Salvador, onde bateu boca com militantes que defendiam o ex-presidente Lula. Foi um aviso. Daqui para a frente, ele quer distância dos ex-aliados, mesmo que isso signifique manter a esquerda fragmentada.
“Para a cúpula do PT, o inimigo não é o Bolsonaro. Sou eu”, justifica. “A disputa agora não é de projeto, é de hegemonia. Eles envelheceram. A tática do PT é me empurrar para a direita, como fizeram com o Brizola e com o Arraes. Só que eu não vou”, desafia.
Ciro se considera rompido com o ex-presidente, que foi condenado pela segunda vez nesta semana. “O Lula continua conspirando de dentro da cadeia, na politicagem mais rasteira. Nós temos que tratá-lo como ele é: como um adversário”, afirma.
Ele diz que “não comemora” a situação do petista, mas se recusa a endossar sua defesa incondicional. “Lula não é um preso político. É um político preso. Preso político é o Mujica, que nunca foi acusado de corrupção”, provoca. “Vamos olhar a realidade ou ficar navegando na maionese?”.
Para o ex-ministro, o PT se deixou aprisionar com seu líder em Curitiba. “A tese do ‘Lula Livre’ foi derrotada. Se continuarem insistindo nisso, vão ser derrotados de novo”, avisa.
Ciro diz que a estratégia dos petistas está errada. “Conhecendo o Judiciário, acho uma aberração pensar que vão ajudar o Lula com campanha de rua. Isso funciona pelo oposto”.
Ele não se arrepende de ter virado as costas para Fernando Haddad no segundo turno. O petista ficou esperando seu apoio, mas o ex-ministro escolheu viajar de férias para a Europa.
“O que é que eu devo para eles? O Haddad teve 71% dos votos no Ceará. Em São Paulo, o estado dele, teve 32%”, afirma. “Não sou obrigado a votar nessa gente de novo. Nunca mais”.
Ciro promete uma oposição “propositiva” a Bolsonaro. No próximo dia 20, vai apresentar um projeto alternativo de reforma da Previdência. Ele quer centrar fogo na agenda econômica e no que vê como um desmonte das políticas sociais. Prefere ignorar as pautas de comportamento, que têm dominado o debate nas redes.
“Não vou ficar comentando declaração de maluquete sobre cor de roupa de menino”, diz, referindo-se à ministra Damares Alves e sua polêmica do rosa e do azul. “Isso é irrelevante. A agenda identitária não pode substituir a luta da esquerda”, afirma.
Na disputa pelo comando da Câmara e do Senado, Ciro travou o primeiro embate do ano com o PT. Ele apoiou Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, enquanto os petistas ficaram com Marcelo Freixo e Renan Calheiros. Os candidatos do DEM venceram, e agora prometem facilitar a vida de Bolsonaro.
“Aquilo não era um terceiro turno da eleição”, diz Ciro, rejeitando a crítica por ter se juntado aos governistas. “Nós sofremos uma derrota fragorosa no ano passado. O lutador tem que entender sua posição no tablado, e o PT ainda não entendeu”, rebate.